A Argentina saiu de Moscovo a precisar de um divã
Depois de ter empatado Portugal no Euro 2016, a Islândia empatou outro favorito na estreia num Mundial. Messi falhou um penálti.
Até pode ser um bom prenúncio – há dois anos Portugal também começou o Europeu com um empate a um golo frente à Islândia -, mas a Argentina confirmou na estreia no Mundial 2018 que é uma equipa sob enorme pressão e que Jorge Sampaoli terá problemas graves para resolver nos próximos dias. Frente à fria Islândia, que voltou a deixar uma excelente imagem tal como tinha acontecido no Euro 2016, os argentinos foram sempre previsíveis a atacar e frágeis a defender, e no embate de frente com o iceberg nórdico, foi Lionel Messi quem saiu mais maltratado. Ao contrário do que tinha acontecido com Cristiano Ronaldo, na véspera, o capitão argentino não fez a diferença e esteve no momento do jogo: aos 64’, desperdiçou uma grande penalidade.
Para quem acompanha com atenção o que se vai passando no futebol europeu, a competência da Islândia não é surpresa. Com uma maleabilidade táctica equiparável à rigidez de um cubo de gelo, os islandeses raramente mudam. O 4x4x2 é sua imagem de marca; a solidez defensiva o principal trunfo; a rapidez do contra-ataque a sua grande arma. E no primeiro jogo deste pequeno país de 300 mil habitantes num Campeonato do Mundo, a Islândia foi fiel aos seus princípios. Na equipa inicial, os islandeses tinham nove jogadores que a 14 de Junho de 2016 tinham empatado Portugal em Saint-Étienne, e Heimir Hallgrímsson, que foi promovido a seleccionador após a saída do sueco Lars Lagerbäck, manteve-se fiel às ideias do seu antigo chefe. Mas a Argentina, e principalmente Sampaoli, pareceu ter a lição muito mal estudada.
Tal como Portugal, a Argentina é uma equipa moldada à volta de um jogador. Se Fernando Santos adaptou a sua selecção de forma a potenciar o melhor de Ronaldo, Jorge Sampaoli desenha a sua equipa em função de Messi. A diferença é que com a camisola “celeste” o génio de Messi não se equipara ao de Barcelona e a frustração do “10” arrasta consigo todos os seus companheiros.
Com Higuaín e Dybala no banco, Sampaoli deu a liberdade habitual a Messi, encostou Dí Maria à esquerda e ofereceu a Kun Agüero a responsabilidade de lutar contra os poderosos defesas islandeses. Se na frente Messi era o líder, atrás era Mascherano (tornou-se no jogador com mais internacionalizações pelos argentinos) que comandava, mas a importância que o veterano médio ainda tem na solidez defensiva “celeste” diz muito sobre quão permeável pode ser esta Argentina. Com Otamendi e Rojo como centrais, Salvio é o dono do lado direito da defesa, papel que no Benfica só assumiu em SOS e que dificilmente Rui Vitória equacionaria para jogos de grau de dificuldade elevado.
A Argentina começou melhor, mas logo aos 9’ uma brecha na defesa sul-americana ofereceu a Bjarnason a primeira grande oportunidade de golo, mas o médio do Aston Villa rematou ao lado.
Até aí escondido no jogo, Messi mostrou-se com um remate forte (17’) e dois minutos depois Aguero marcou: de costas para a baliza, o avançado do City rodou e rematou sem hipóteses para Halldorsson. O gelo, parecia quebrado.
Mas esta Islândia não se dilui facilmente. Com um futebol rápido e prático, os islandeses atacaram pela direita, a defesa argentina ajudou, e ao segundo assalto Finnbogason empatou. O estádio do Spartak, até aí em festa – cerca de dois terços dos espectadores tinham camisolas da Argentina vestidas –, emudeceu-se, e a equipa de Sampaoli ressentiu-se. Com mais de 70% de posse de bola, os argentinos procuravam Messi em excesso e os islandeses, que apostaram sempre numa marcação à zona, foram resolvendo os problemas.
Mesmo sem melhorar ofensivamente, os sul-americanos conseguiram impedir que na segunda-parte a Islândia continuasse a contra-atacar com perigo, e com o recuo nórdico, surgiu o erro: Aguero foi derrubado na área. Com a Argentina em suspenso, Messi rematou para a sua esquerda, mas Halldorsson adivinhou o lado.
Se a pressão até aí já era grande, a partir desse momento viu-se uma Argentina sôfrega e com demasiado coração. E quando Sampaoli finalmente arriscou (Higuaín por Meza, aos 84’), já era tarde. Num grupo onde ainda há Croácia e Nigéria, a Argentina saiu de Moscovo a precisar de um divã.