As versões do "capitão" e do presidente sobre a ruptura
O essencial da argumentação que sustenta o pedido de rescisão contratual do guarda-redes.
Atentados à “dignidade profissional e pessoal” e “segurança e integridade física” postas em causa e que o fizeram “temer pela vida”. Assim começa a carta de rescisão que Rui Patrício enviou ao Sporting, com a data de 31 de Maio. Depois de fazer o enquadramento legal da decisão da quebra do vínculo, o guarda-redes faz uma cronologia do que se passou desde Janeiro último, período em que entende que Bruno de Carvalho colocou uma “pressão inaceitável em todos os jogadores e na equipa”.
Empate com V. Setúbal
O que diz Rui Patrício
A 19 de Janeiro, o Sporting não consegue melhor que um empate na sua deslocação ao Bonfim. No dia seguinte, Patrício recebe uma mensagem escrita de Bruno de Carvalho, em que o presidente “leonino” diz que ficou “num estado de nervos” por causa do jogo e teve de ir ao hospital. “Esta época já não temos mais desculpas para dar. Este ano, cada objectivo que falharmos será imperdoável.”
O que diz Bruno de Carvalho
“Como adepto, estou a sofrer. Foi um ‘murro no estômago’ que me dá dores muito superiores à operação a que fui submetido há três dias. Estou a sofrer por mim, pela minha família... Como presidente estou a sofrer pela equipa que lidero e dá tudo pelo clube, estou a sofrer pelos mais de 3,5 milhões de adeptos que não mereciam este resultado.”
Os corações esquecidos
O que diz Rui Patrício
A 18 de Março, numa das fases mais complicadas da época, o Sporting vence em casa o Rio Ave (2-0), mas os capitães Rui Patrício e William recebem uma mensagem de Bruno de Carvalho que é uma mistura de elogios e críticas. Elogios pelo resultado e pela exibição “plena de atitude e compromisso”, críticas por os jogadores terem ignorado “o início de uma acção de solidariedade”. “Não posso assistir de forma impávida e irresponsável a estes actos de vedetismo”, prossegue o líder “leonino”. “Vocês são uns felizardos numa sociedade cada vez mais pobre e com carências… O que vocês fazem, provam o que é a pobreza de espírito. Que merda andar sempre a sentir isto de vocês”, escreve ainda o dirigente.
O que diz Bruno de Carvalho
“Era o início de uma acção de solidariedade que os jogadores decidiram ignorar. Aqui não existem toupeiras, emails estranhos, jogos pagos para perder, vouchers, frutas ou seja lá o que for. E não temos nada disso pois temos de ter sempre presentes o respeito pelos adeptos e pelo Clube.”
A derrota em Madrid
O que diz Rui Patrício
O Sporting perde a primeira mão dos quartos-de-final com o Atlético de Madrid e Bruno de Carvalho, que não esteve na capital espanhola, escreve uma longa mensagem no Facebook a criticar a equipa e alguns jogadores em particular. Segundo o guarda-redes, a equipa pediu uma reunião com o presidente. Quando a comitiva chega a Lisboa, os jogadores são informados de que Bruno de Carvalho não estava disponível e que a reunião só iria acontecer apóso jogo com o Paços.
Os jogadores foram a Alvalade e decidiram em conjunto publicar uma mensagem nas redes sociais como resposta ao presidente. Antes disso, Rui Patrício e William recebem a seguinte mensagem de Bruno de Carvalho: “Após o jogo do Paços vamos ter a conversa mais séria que vocês tiveram na vossa vida. Tenho quatro filhas e não tenho paciência para amuos ou falsos profetas. Vão perceber de vez o vosso lugar. Crianças amuadas não pertencem ao Sporting, a não ser o da Covilhã. Abr.”
Os jogadores divulgaram o comunicado, Bruno de Carvalho respondeu com nova mensagem no Facebook e, no final desse dia, o plantel recebeu por email “uma nota de culpa de procedimento disciplinar”. A suspensão seria levantada no dia seguinte.
Nesse dia, à tarde, houve uma reunião em Alvalade com os jogadores, a equipa técnica, André Geraldes e um Bruno de Carvalho “visivelmente exaltado, com ar de ditador, alucinado e visivelmente tresloucado”, acusando Patrício e William de serem “os organizadores do protesto”. Segundo Patrício, Bruno de Carvalho terá chegado a dizer coisas como: “Vocês são uns meninos mimados, eu sou o Presidente, eu faço o que quiser e escrevo o que quiser”.
O que diz Bruno de Carvalho
“Viver um jogo de longe custa muito mais, mas ver erros grosseiros de jogadores internacionais e experientes acrescenta mais ao sofrimento.”
Derby/Viagem ao Funchal
O que diz Rui Patrício
O Sporting jogava o acesso à Liga dos Campeões nas duas últimas jornadas e dependia só de si. Na recepção ao Benfica, ficou-se por um empate num jogo marcado pelo lançamento de tochas vindas da bancada onde estavam as claques do Sporting na direcção de Patrício, que “por pouco” não o atingiram.
Seguiu-se a viagem ao Funchal, em que o Sporting acaba por perder 2-1 com o Marítimo. Patrício diz que o presidente, com a entrevista que deu ao jornal Expresso, comprometeu “o estado anímico e a concentração da equipa” e despertou “a ira dos adeptos mais primários e acalorados”. Após a derrota, o guarda-redes descreve a reacção dos adeptos na partida da equipa, ainda no Funchal, e na chegada a Lisboa, falando de “grandes momentos de tensão e provocação” em que ouviu de um dos adeptos um “na próxima semana fazemo-vos uma visita”.
No dia seguinte, houve uma reunião em Alvalade em que os jogadores revelaram “o teor da conversa e a calma do presidente”. Bruno de Carvalho terá dito, inclusive, que recebeu muitos telefonemas de “gajos da claque” a pedir a morada de Acuña e que o “iriam apanhar”.
O que diz Bruno de Carvalho
O presidente do Sporting tinha suspendido a sua página do Facebook, mas convocou equipa técnica e jogadores para reuniões separadas em Alvalade após o jogo com o Benfica.
Invasão da Academia
O que diz Rui Patrício
Segundo Rui Patrício, o primeiro treino da semana para preparar a final da Taça estava previsto para quarta-feira, mas foi antecipado para terça. O treino no campo estava marcado para as 18h e, às 17h, os jogadores começaram a trabalhar no ginásio. Depois, foram equipar-se para o balneário e “foi nessa altura que começaram a entrar homens encapuçados […] agredindo os jogadores, elementos da equipa técnica, médica, funcionários e gritando expressões atemorizantes”. O grupo de 40, refere Patrício, tinha alvos definidos: ele próprio, mais William, Battaglia e Acuña. “Vivi momentos de puro terror”, refere, acusando o clube de “negligência grosseira”.
O que diz Bruno de Carvalho
“Não devemos entrar neste tipo de situações com os adeptos. Temos de saber medir aquilo que fazemos e aquilo que dizemos. Não é bonito, mas é daquelas coisas que temos de aceitar na vida [os insultos].” Marco Vaza com Paulo Curado