Terry Virts, o astronauta que traz a Lisboa uma fotografia de Portugal tirada do espaço
Esteve mais de 200 dias no espaço e tirou mais de 300 mil fotografias do nosso planeta. Hoje, na National Geographic Summit 2018, conta a sua aventura e traz um presente que tirou em órbita da Terra.
Quando chegou ao espaço pela primeira vez, em 2010, Terry Virts não se esquece do azul do nascer do Sol. O astronauta norte-americano pilotava o vaivém espacial Endeavour e seguia para a Estação Espacial Internacional (ISS). “Foi fantástico. Nunca tinha visto aquele tom de azul antes”, recordou ontem numa conversa com o PÚBLICO. Afinal, paralelamente à sua vida de astronauta e piloto é fotógrafo. Nos mais de 200 dias que passou no espaço, tirou mais de 300 mil fotos. E já publicou um livro com as suas fotografias, o View from Above, tem imagens no documentário A Beautiful Planet e não deixa de fazer os seus comentários quando é fotografado pelo PÚBLICO antes da Conferência National Geographic, que decorre esta quarta-feira no Coliseu dos Recreios (Lisboa) e onde vai falar às 10h15 sobre a sua aventura espacial. Para esse momento, promete-nos que vai mostrar uma fotografia de Portugal tirada por si no espaço.
Desde muito novo que queria ser astronauta. “O primeiro livro que li quando era criança foi sobre a [missão] Apolo. Estava no jardim-de-infância”, lembra agora com 50 anos. “E tinha imagens de galáxias, paisagens da Lua, jactos ou aviões na minha parede.” Pode-se dizer que nunca se afastou dessas imagens ao longo da vida. Começou por ser piloto da Força Aérea dos EUA. E, em 2000, tornou-se astronauta da NASA. “Foi muito difícil. A candidatura tinha imensos papéis, houve uma enorme quantidade de entrevistas e avaliações médicas.”
Como astronauta, iniciou o seu percurso com a missão STS-130 em 2010. Nessa missão de 15 dias, a sua equipa instalou na ISS o módulo Tranquility, que incluía uma cúpula usada para observação (e onde tirou muitas fotografias).
O seu grande desafio no espaço foi nas missões que realizou na ISS (a Expedição 42 e a Expedição 43) entre Novembro de 2014 e Junho de 2015. Na segunda missão, chegou mesmo a ser o comandante. E como era a vida a cerca de 400 quilómetros de altitude? “O dia nunca era igual”, responde. “Participávamos em experiências científicas, consertávamos coisas ou até fazíamos de médicos. O exercício fazia sempre parte do dia, além de comermos as refeições, fazermos a limpeza, desembalarmos ou carregarmos mercadoria, dávamos entrevistas ou fazíamos passeios espaciais.”
Ao todo, Terry Virts fez três passeios espaciais. E se à primeira vista este parece ser um desafio empolgante, o astronauta assume que não há tempo para a diversão. “A grande actividade são os cabos. Nos passeios são colocados cabos para futuras cápsulas [espaciais]”, conta, acrescentando que há sempre dois astronautas num passeio espacial, o “homem dos cabos” e o mecânico. “Estamos sempre ocupados num passeio espacial e há muita coisa para fazer. Além de ser muito perigoso. Até levei a máquina [fotográfica] e queria ter tirado milhares de fotos. Tenho dez fotografias de cada passeio espacial.”
Aliás, a vida de um astronauta no espaço pode até ser “dolorosa”. “No meu primeiro voo [para ir para o espaço, o que dura cerca de oito minutos], senti-me terrível nos dois dias a seguir. Tive muitas dores de cabeça. No meu segundo voo parecia que o corpo já sabia como reagir. Mas o maior impacto no corpo é mesmo o fluido que sobe e que vai para a cabeça”, diz, enchendo as bochechas para imitar a cara com que ficava na altura.
Quando vamos a Marte?
Ver a Terra da ISS mudou a sua perspectiva sobre ela. “É um planeta lindo. Acho que fiquei com uma mente mais aberta do que aquela que tinha antes.” Mas nem tudo o que viu está assim tão bonito e faz uma chamada de atenção quanto às alterações climáticas. “Não se conseguem ver as alterações climáticas, mas podemos ver a poluição. A China está acastanhada. E outro problema é a desflorestação. Madagáscar é uma linda ilha com duas partes diferentes”, alerta. “Podemos ver coisas muito bonitas e outras não tão bonitas. A maioria é bonita, mas já podemos ver grandes problemas.”
Em 2016, deixou a NASA. No livro View from Above diz que quer dar oportunidade aos astronautas mais jovens. Mas nem por isso deixa de ter uma visão sobre a exploração humana no espaço. E, para si, os humanos devem conseguir ir a Marte durante este século. E que data aponta? Cauteloso, começa por dizer que os políticos estão sempre a dar datas. “Mas a ciência política não é ciência aeroespacial. Poderei apontar que em 2030 isso poderá acontecer. Mas posso estar a enganar-me.”
Para que isso aconteça, Terry Virts diz que tem de haver um programa para Marte, tal como aconteceu como o Apolo ou outros programas. “Para irmos a Marte, precisamos de testar tecnologias e acho que precisamos da Lua para o fazer”, considera. Por isso, em termos gerais, concorda com a directiva lançada pelo Presidente Donald Trump no final de 2017, que tem o objectivo enviar humanos à Lua e criar aí bases para um dia se chegar a Marte.
Mas acrescenta que só conseguiremos ir a Marte com um programa internacional. E dá o exemplo do sistema político norte-americano: “Todas as vezes que os republicanos chegam ao poder cancelam o que os democratas fizeram e vice-versa. Uma visão internacional mantém-nos mais focados como acontece com a ISS. Um programa internacional junta as pessoas. E é mais eficiente: nós construímos isto e os russos constroem aquilo...”
Esta é a primeira vez que visita o país. Esta quarta-feira, juntamente com a oceanógrafa Sylvia Earle, o fotógrafo Charlie Hamilton James, a activista Hyeonseo Lee, a jornalista portuguesa Mariana van Zeller e exploradora angolana Adjany Costa, vai contar as suas aventuras em Lisboa. Mas, além das aventuras, vai falar sobre paisagens, o ambiente ou lançamentos espaciais. E destaca: “A verdadeira mensagem vai ser sobre o prazer de estarmos uns com os outros.”