A prisão não é o fim da candidatura à presidência e o PT aposta nisso
O novo quartel-general dos apoiantes de Lula da Silva passou a ser Curitiba, onde já está montado um acampamento. Ninguém quer sequer ouvir falar de um “plano B” para as eleições.
Às primeiras horas da primeira manhã que Lula da Silva passou preso já se viam as primeiras tendas e até casas-de-banho portáteis trazidas pelos apoiantes do ex-Presidente brasileiro para as imediações do edifício da Superintendência em Curitiba. Será ali montado o quartel-general do movimento de resistência contra aquilo que dizem ser a prisão ilegítima de Lula, com o objectivo único de impedir a esquerda de regressar ao poder.
A primeira noite de Lula na prisão foi “tranquila”, de acordo com um comunicado emitido pelo Partido dos Trabalhadores, em que foi também deixado o apelo para que os seus apoiantes inundem o local com cartas dirigidas ao ex-Presidente. São esperados cerca de 40 autocarros com pessoas para se concentrarem em Curitiba nos próximos dias, diz o jornal Folha de São Paulo.
Menos tranquila parece ser a discussão em curso no seio do partido que enfrenta agora a orfandade, ao ver o seu líder histórico na prisão e em sério risco de não poder apresentar-se como candidato às eleições presidenciais de Outubro. A imprensa brasileira dá conta de um debate interno entre os que defendem a continuidade de Lula na “chapa” eleitoral e os que pedem a contemplação de um “plano B”.
Oficialmente, a estratégia do PT continua a ser uma só – a de manter a candidatura Lula, independentemente do que venha a acontecer. A detenção deste sábado não mata, por si só, as hipóteses de Lula continuar como candidato, mas muito daquilo que será o futuro do homem que lidera as intenções de voto está dependente dos prazos dos tribunais.
O grande entrave à candidatura de Lula chama-se Lei da Ficha Limpa, ironicamente aprovada em 2010 durante a sua própria presidência, e que inviabiliza que políticos condenados em segunda instância possam candidatar-se a cargos públicos. Essa é precisamente a situação de Lula, depois da decisão do Tribunal Regional Federal de Porto Alegre, que em Janeiro confirmou a condenação por corrupção e lavagem de dinheiro e aumentou a pena para 12 anos e um mês de prisão.
No entanto, a aplicação da Lei da Ficha Limpa só será possível no momento em que o Supremo Tribunal Eleitoral apreciar as candidaturas às presidenciais, algo que deve acontecer até 17 de Setembro. Enquanto essa avaliação é feita, a candidatura pode organizar acções de campanha, mesmo com Lula preso. Cabe ao juiz que o condenou, Sergio Moro, ou ao responsável pela execução da pena, estabelecer de que forma poderá Lula exercer esse direito.
Meios para campanha
"Se a lei permite que a pessoa seja candidata enquanto seu caso está em análise, devem ser dados os meios para fazer a campanha", disse à BBC Brasil um procurador eleitoral sob anonimato. Seria então possível que Lula pudesse abandonar o local de detenção para gravar anúncios de campanha, por exemplo.
Mas mesmo que o STE decida vetar a candidatura de Lula, há sempre a possibilidade de serem apresentados recursos, adiando por mais tempo a sua inviabilização definitiva. Ao mesmo tempo, permanece em cima da mesa uma eventual reversão por parte do Supremo Tribunal Federal da decisão de permitir a prisão de condenados em segunda instância. Esta semana, o STF vai pronunciar-se sobre casos que envolvem outros condenados no âmbito da Operação Lava-Jato e a defesa de Lula vai tentar que a questão volte a estar na agenda.
O factor crucial é o tempo que todas estas decisões podem vir a tomar. Se forem lentas, Lula pode chegar ao dia da primeira volta ainda como candidato, e ver a candidatura invalidada antes da eleição final – abrindo caminho à passagem do terceiro mais votado a progredir para a segunda volta. Num caso extremo, é até possível que Lula possa vencer as presidenciais, mas a sua candidatura seja anulada por uma decisão judicial já como Presidente eleito, diz a BBC. Seriam então convocadas novas eleições.
A estratégia de manter a candidatura de Lula o máximo de tempo possível “faz sentido, pressupondo que os prazos da Justiça serão demorados”, diz ao site UOL o professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Malco Camargos. No entanto, avisa, “temos visto que, com Lula, o tempo da Justiça tem sido sempre diferente, mais rápido do que o normal”.