Viagens de finalistas: mais papistas que o Papa?

Se as escolas são obrigadas a ceder os seus espaços, por exemplo, para atividades partidárias e sindicais, não podem usar o mesmo critério com as associações de estudantes e pais?

A reboque da tradição, aproveitando a interrupção da Páscoa, milhares de alunos finalistas do ensino secundário rumam alguns dias ao estrangeiro, optando, a maioria, pelas praias e águas quentes do sul de Espanha, à semelhança do que sucedeu o ano passado. Ano esse de má memória, pois foi sobejamente destacada a pretensa expulsão de portugueses de um certo hotel, justificada pelo comportamento inqualificável dos estudantes portugueses, e o consequente locupletamento do dono, indivíduo finório, que meteu ao bolso o valor da totalidade das cauções (cerca de 50.000 euros).

Deseja-se que este ano, aprendendo com o passado, possamos ter notícias de diferente teor, dando conta da alegria dos nossos jovens a divertirem-se com respeito, dispensando os exageros nada apropriados, sobretudo em viagens de grandes grupos. Nestes eventos deve imperar a correção de atitudes e comportamentos, numa prática consciente de cidadania exemplar.

Os donos dos hotéis e de outros espaços colocados à disposição devem estar atentos a eventuais excessos, inadmissíveis em qualquer circunstância, todavia, potenciados por este género de comemorações, e atuar de imediato, sobretudo junto das agências organizadoras e promotoras destas viagens.

Por sua vez, estas devem proceder ao reforço do número de monitores e outros elementos do staff que acompanha os participantes, estando ainda mais alerta para prevenir, bem como identificar, eventuais desregramentos, o mais precocemente possível. É fundamental que os pais e encarregados de educação sejam e estejam envolvidos na preparação da viagem, transmitindo, deste modo, uma mensagem de maior confiança ao grupo (juntamente com noções de responsabilidade e decoro), tendo em conta a menoridade de muitos dos participantes.

Sublinho a importância que tem assumido a presença da GNR nas escolas secundárias, alertando para o perigo do consumo de drogas e de álcool, especialmente quando provocado em dinâmica de grupo, ao levar a cabo ações de sensibilização que têm reunido o apreço de todos os que a elas assistem. Quero congratular a sua realização.

Lamentavelmente, nos últimos dias, as notícias trazidas a público não se referiam à parte substantiva da viagem, valorizando apenas a vertente adjetiva, concretamente no que respeita à sua organização e promoção.

Cumpre informar que estes eventos não fazem parte do plano anual de atividades das escolas ou agrupamentos, não figurando, por conseguinte, na listagem dos que merecem análise e aprovação por parte dos conselhos pedagógicos respetivos, e, por inerência, a ratificação pelo conselho geral, ou seja, são acontecimentos extra escola, para os quais tem de ser efetuado seguro próprio, uma vez que o seguro escolar não cobre prejuízos decorrentes dos mesmos, ao contrário das visitas de estudo organizadas pelas instituições educativas.

No entanto, e mais uma vez, o dedo acusador recaiu sobre as escolas e os professores, em campos de atuação diferentes. Aquelas cederiam espaços para reunião de preparação do acontecimento, contrariando uma comunicação chegada às escolas na primeira quinzena de março (!) informando que “...as agências de viagens não devem operar, em qualquer circunstância, nos recintos escolares”. A substância desta ação do Ministério da Educação, que respeito, não só peca por tardia, como tem sido criticada por coartar a liberdade de reunião e ação do movimento associativo de estudantes e de pais e encarregados de educação, que colaboram na organização com as agências de viagens. Se as escolas são obrigadas a ceder os seus espaços, por exemplo, para atividades partidárias e sindicais, não podem, por analogia, usar o mesmo critério com as associações de estudantes e associações de pais e encarregados de educação? Não estarão a “ser mais papistas que o Papa”? Parece que, de futuro, a cedência de espaço na escola para reuniões preparatórias é plausível, ficando claro (e está claro) o afastamento da organização escolar, por não ser da sua esfera de competências.

Os professores foram acusados de assumirem funções similares aos dos promotores de viagens e acompanharem os alunos nessas atividades. Supondo que a ação da entidade averiguadora incidiu sobre o que se passou no ano anterior, seria fundamental, neste momento, saber quantos docentes estão envolvidos e a extensão da sua ação em concreto. Quando isto acontecer, desconfio que a montanha não parirá grande coisa, eventualmente, nenhuma! Naturalmente que os pais sentir-se-iam mais seguros e agradados com a participação de professores nestas viagens, mas, na minha opinião, tal não deve acontecer pelos motivos anteriormente expostos. E será da sua inteira responsabilidade se o fizerem enquanto cidadãos.

Em nota de conclusão, desejo a todos os nossos jovens uma excelente viagem e que usufruam em pleno do momento, também para recarregar o corpo e a mente com energias positivas, essenciais para que possam enfrentar a exigência habitual do final de ano letivo com a tranquilidade que merecem.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

Sugerir correcção
Comentar