Escolas da Portela estão “num estado deplorável”
Esta terça-feira, os alunos vão vestir-se de negro e juntar-se ao portão da escola como protesto contra as más condições em que estudam. Autarquia diz que vai fazer a obra no pavilhão desportivo da secundária Arco-Íris, mas que vai “apresentar a conta” ao Ministério da Educação.
No ginásio da Escola EB 2/3 Gaspar Correia há um cartaz por cima do balneário dos rapazes que tem a legenda “Que rica banhoca!” ao lado de um desenho que mostra um menino a ensaboar-se. Mas quem entra na sala dos chuveiros depara-se com um cenário menos risonho. A porta de madeira está toda esburacada, o tecto cheio de infiltrações e também com buracos, os chuveiros com ar velho, a precisar de substituição.
“Deve haver prisões com balneários melhores”, comenta André Julião, antigo aluno da escola, pai de um estudante e promotor de uma petição pública que pede “obras de fundo urgentes” na Gaspar Correia e na Escola Secundária Arco Íris, do outro lado da rua. Pais, alunos e professores destes dois equipamentos escolares da Portela, concelho de Loures, dizem que as condições dos edifícios são indignas e queixam-se de serem ignorados pelo Ministério da Educação. Como “ninguém fazia nada”, diz André Julião, decidiram lançar a petição, que em poucos dias ultrapassou as três mil assinaturas.
Uma das subscritoras é a directora do Agrupamento de Escolas da Portela e Moscavide. “Estou aqui desde 1985 e a obra dos balneários foi sempre sendo protelada”, diz Marina Simão, virando costas aos chuveiros e continuando a visita guiada.
No ginásio propriamente dito, o chão e o tecto foram reabilitados há uns anos, mas as janelas não foram substituídas e, em dias de chuva, a água inunda a zona onde se guardam os colchões e outros aparelhos, inviabilizando as aulas. No pavilhão central, a directora aponta para umas rachas na parede e diz, com ironia, que ali é “a fonte” da escola. “Quando chove é a desgraça, esta zona fica toda alagada.” É neste local que as crianças do 5º ao 9º ano de escolaridade fazem fila para o refeitório, que é dos sítios menos problemáticos da escola.
"Há um silêncio absoluto"
Além dos problemas de humidade e de falta de climatização, Marina Simão destaca ainda a degradação dos telhados de fibrocimento, que podem conter amianto, e que ainda existem em alguns pavilhões e nas galerias exteriores que ligam os edifícios.
“Esta escola é um caso complicado, porque há um silêncio absoluto”, critica a directora do agrupamento. Construída na década de 1970, a Gaspar Correia pouco mudou de aspecto desde então – e a degradação é tanta que a Câmara Municipal de Loures se recusou a assumir a gestão da escola quando, em 2008, fez um acordo com o Governo para passar a gerir outras escolas básicas do concelho. Como as obras nunca foram feitas, a manutenção da escola não chegou a passar para o município.
A escola secundária, mesmo em frente, é mais recente e não aparenta tanta deterioração, mas os problemas acumulam-se. “Até tive de chamar os bombeiros por causa da sala de ginástica. As placas estão a cair lá de cima e preciso de saber se aquilo tem segurança”, diz Marina Simão. Quando a responsável se aproxima, os bombeiros acabam de colocar uma fita a interditar o espaço. Caíram algumas placas de fibra de vidro e estruturas metálicas do tecto.
“Isto é uma miséria. Estas escolas estão num estado deplorável”, afirma André Julião, que quer ver a petição analisada na Assembleia da República. Pais, professores e alunos das escolas vão vestir-se de negro e juntar-se ao portão da escola esta terça-feira para dar visibilidade ao caso e exigir um compromisso do Governo.
No final de Fevereiro, a secretária de Estado adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, anunciou na TSF que a secundária da Portela teria um investimento de 100 mil euros em 2018. Questionado pelo PÚBLICO, o Ministério da Educação confirmou essa intenção, sem contudo avançar o tipo de trabalhos que vão ser feitos, nem prazos de execução. Quanto à EB 2/3 Gaspar Correia, a tutela acrescentou que foram investidos "cerca de 70 mil euros", no ano passado, "para responder a necessidades mais prementes". Ficou por saber quando foram feitas as últimas intervenções de fundo naquelas escolas.
Marina Simão diz que ainda não foi oficialmente informada desse investimento de 100 mil euros e que esse dinheiro não chega para as necessidades. Também André Julião critica: “Vemos que outras escolas com problemas similares tiveram obras orçadas em 4 ou 5 milhões de euros.”
A conta paga o ministério
A directora do agrupamento também aponta o dedo à autarquia de Loures, que acusa de não se interessar. “A câmara não tem respondido a nada, nem um telefonema.” O ginásio da secundária, que além de ser usado para aulas de Educação Física também recebe clubes e associações locais, devia ser intervencionado pelo município, segundo Marina Simão. “Há um acordo de 2001 que os obriga a fazer obras de infra-estruturas. A DGEstE (Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares) tem sido muito clara a dizer que a obra é da câmara”, afirma.
O presidente da câmara de Loures refuta, no entanto, essa acusação e diz-se mesmo “perplexo” por estarem a ser imputadas responsabilidades à autarquia que não lhe competem. De acordo com o Bernardino Soares, o pavilhão desportivo foi construído pelo Ministério da Educação que passou, em 2008, a gestão "corrente" daquele equipamento para o município. Que, por sua vez, em 2011, fez um protocolo com o agrupamento, delegando-lhe a manutenção "corrente" do pavilhão.
Ainda assim, a câmara de Loures vai avançar com a obra no pavilhão desportivo e “apresentar a conta” ao Ministério da Educação. A autarquia entende que a manutenção da infra-estrutura ficou sempre a cargo da tutela e que alguns dos problemas actuais terão a ver "com a falta de manutenção corrente por parte do agrupamento".
“Não somos insensíveis àquela situação desde que fique muito claro que aquela responsabilidade não é nossa e que a manutenção corrente cabia ao agrupamento e não foi feita devidamente nos últimos anos”, notou ao PÚBLICO o autarca de Loures, no final de uma reunião com Marina Simão.
“É impossível fazer a manutenção das infra-estruturas com o que recebo da câmara”, sublinha a directora. Segundo o protocolo de 2011, o município transfere 280 euros por mês para a escola para a gestão do pavilhão. Um pagamento que Marina Simão diz ser feito “com atraso”.
Bernardino Soares reconhece que a verba que é mensalmente transferida para aquele pavilhão é “exígua”, mas que foi a acordada entre a directora do agrupamento e o anterior autarca de Loures, Carlos Teixeira.
“O que me interessa é que o pavilhão tenha obras, agora quem as faz... Essa guerra não é minha”, declara Marina Simão, esperando que a obra “seja rápida”. Para já, não foram avançados prazos, sendo que a autarquia diz que pretende intervir no pavilhão “no mais curto espaço de tempo possível”.
"É evidente que há também uma responsabilidade do Ministério da Educação porque há documentação que aponta para defeitos construtivos do pavilhão na sua origem", que chegaram a ser assinalados pelo agrupamento e que “não terão sido resolvidos”, sublinha o autarca.