Liberdades e juramentos de “hipócrit(a)s”
O argumento é sempre o da dignidade, mas que dignidade existe na antecipação da morte?
O mundo atravessa uma convulsão generalizada a que ninguém pode ficar indiferente. As sociedades ajustam-se aos tempos novos, a luta pelas liberdades individuais atinge um apogeu inimaginável há um punhado de anos. Gritam-se palavras de ordem contra a tirania, o abuso económico, o abuso sexual e todas as formas de exercício ilegítimo de poder por coação.
Para os países onde os direitos estão já consagrados, passamos para uma defesa de direitos que impõe deveres em dimensões que começam a colidir com os direitos individuais. Portugal não é diferente, apesar de termos uma Constituição que defende os nossos direitos, liberdades e garantias individuais, parece que a necessidade de estarmos em sintonia com o padrão internacional, mesmo quando as realidades são tão distintas e quando o que está em causa é, no meu entender, próprio das nossas liberdades individuais.
São as batatas fritas, os doces, os salgados e as bebidas com gás. São as restrições alimentares, muito adequadas para as crianças e jovens que ainda estão em desenvolvimento, mas que não fazem sentido quando temos o direito à livre escolha do que queremos ou não comer. É a insistência na liberalização da cannabis travestida de medida de preocupação terapêutica, mas para a qual se abre uma caixa de pandora incontrolável. Mas o que me preocupa particularmente é a produção legislativa sobre a vida. A vida!
Sou assumidamente uma defensora do direito à vida, mesmo quando ela parece definitivamente comprometida. A forma como algumas forças políticas procuram sempre ‘obrigar’, ‘proibir’, ‘liberalizar’ ou ‘legalizar’ práticas do foro da consciência moral e que colidem com direitos individuais, como por exemplo dos médicos, numa agenda moral, de produção avulsa e ao sabor das agendas políticas de conveniência, abre brechas no equilíbrio do sistema social que provocam desequilíbrios insanáveis.
No seu juramento de Hipócrates os médicos afirmam sobre compromisso de honra que: “Mesmo instado, não darei droga mortífera nem a aconselharei.”
Não obstante, o poder político insiste em colocar o carro à frente dos bois e produzir legislação sem cuidar de garantir que os únicos profissionais que podem ser os fautores de tais aspirações podem, de facto, concretizá-las. E o que virá depois, quando é todo um código ético e deontológico que está colocado em causa? Que garantia tenho, como cidadã, que os meus valores morais, em perfeita sintonia com os valores que a Constituição me outorga e com os padrões sociais e culturais do país em que vivo, estarão imunes a esta sanha de ditadura moralista? O argumento é sempre o da dignidade, mas que dignidade existe na antecipação da morte? Por mim não! Não podemos ficar à mercê de juramentos de hipócritas.
Parabéns Portugal, outra vez! Na sequência do artigo de opinião anterior, no qual destaquei o período particularmente feliz e que nos dá esperanças redobradas no nosso futuro coletivo, Portugal viu pela primeira vez a sua seleção nacional de futsal sagrar-se campeã da Europa. Como podemos ler na Eneida de Virgílio, “a sorte protege os audazes”, mas a esta grande verdade devemos somar uma outra, de Séneca: “Não há bons ventos para quem não sabe para onde vai.”
A sorte dá realmente muito trabalho. Parabéns a todos quantos trabalharam, e muito, para trazer mais um título para Portugal.
A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico