A "geringonça" tem medo do bloco central? Parte dela, sim
Os partidos que suportam o Governo desvalorizam um eventual regresso do bloco central e preferem destacar os feitos do acordo à esquerda. João Galamba, do PS, diz mesmo que o acordo “é uma mais-valia” que “favorece todos os partidos”.
A eleição de Rui Rio como novo presidente do PSD trouxe de volta ao debate político o tema do bloco central. Foram várias as vezes que Rio afirmou, durnate a campanha interna, que viabilizaria um Governo minoritário do PS e que estaria disponível para negociar com António Costa, em caso de derrota do PSD. Do lado dos partidos que apoiam o actual executivo – PCP, BE e PEV -, surgiram alertas sobre um eventual regresso de um Governo PS/PSD. Estará a "geringonça" assustada com uma eventual coligação do PS com o centro-direita?
Em declarações ao PÚBLICO, Jorge Costa, deputado do Bloco de Esquerda, desvaloriza esse debate, dando a entender que ele não existiria se Rui Rio não tivesse dito o que disse. “Rio acaba por ser o porta-voz de um certo sector social que está profundamente irritado e desconfortável e que quer terminar muito rapidamente com esta maioria política”, maioria essa que, segundo o deputado, “tem vindo a introduzir recuperação de rendimentos e direitos, e, sobretudo, a impedir o programa histórico da privatização”.
O deputado do PS João Galamba não vê com bons olhos o regresso do bloco central. Ao PÚBLICO, o socialista declara que uma coligação entre os dois maiores partidos no Parlamento é “algo muito prejudicial para a democracia, que precisa de escolhas claras e de alternativas políticas.” E, por isso, conclui: “Ter 60% ou mais do eleitorado a apoiar um determinado Governo não me parece positivo”.
Já o deputado António Filipe, do PCP, fala em “pressões claras, de apelos ao regresso do bloco central enquanto solução governativa”. Em relação às declarações de Costa, que disse “estar bem acompanhado” com os actuais parceiros de Governo, António Filipe diz que o PCP “registou” aquelas palavras. O deputado refere que contrariamente ao que “muitos consideraram como palavras para tranquilizar a esquerda, o que se passou foram palavras para tranquilizar o PS relativamente à sua manutenção no Governo”. Isto, porque, assegura António Filipe, “o PCP está tranquilo, como sempre esteve”.
Já Heloísa Apolónia, do Partido Ecologista Os Verdes, diz que estas palavras não foram para tranquilizar, até porque os Verdes "não estão minimamente" preocupados. "Se há alguém que tenha ficado mais tranquilo com as palavras do primeiro-ministro foram os próprios portugueses”. A deputada regista que “a alteração de políticas nunca se conseguiu fazer com um Governo PS/PSD", mas foi possível "nesta legislatura com o actual acordo”.
No passado fim-de-semana, os líderes do PCP e do Bloco de Esquerda alertaram para o regresso do bloco central, depois de os socialistas terem dito que era mais fácil falar com o PSD de Rio. Jerónimo de Sousa afirmou que, “com um bloco central mais ou menos formal, com o PS sozinho ou acompanhado”, não haverá “esta perspectiva de evolução positiva no plano da reposição de rendimentos e direitos”. Já Catarina Martins, coordenadora do Bloco de Esquerda, acusou Rio de ser “a voz da direita conservadora” que “quer voltar ao bloco central” e ao “monopólio do negócio”.
Entretanto, Costa já deu sinais de que rejeita a ideia de PS e PSD irem juntos para o executivo. Durante as jornadas parlamentares do PS, o secretário-geral do partido mostrou-se satisfeito com a companhia que tem tido na Assembleia da República nos últimos dois anos. “Quando se está no bom caminho, o que há a fazer é não mudar de caminho. Quando se está bem acompanhado, não se muda de companhia”, disse, referindo-se aos partidos que sustentam o seu Governo.
Uma nova "geringonça" em 2019?
Sobre se o Bloco apoiaria um Governo do PS nas próximas legislativas, Jorge Costa afirma que “nunca foi por o BE não estar disponível que alguma solução política à esquerda deixou de se fazer em Portugal.” O deputado bloquista considera que as eleições de 2019 “vão ditar uma nova correlação de forças políticas e é dela que têm de resultar novas soluções”.
João Galamba defende que o partido deve continuar a cultivar a aproximação à esquerda, porque “independentemente do resultado que o PS tenha nas próximas eleições, é positivo para a esquerda portuguesa manter este clima de diálogo”. O socialista considera que o acordo já conhecido “é uma mais-valia” e que “favorece todos os partidos”. “O acordo conseguiu apresentar e concretizar soluções muito importantes para a vida das pessoas, e, por isso, obviamente eu desejo que ele continue”.
Uma pergunta que fica por responder é se, caso obtenha uma maioria absoluta em 2019, o PS vai querer virar as costas aos parceiros de esquerda e ficar sozinho com a oposição de todos os partidos, como no primeiro Governo de Sócrates, ou se, apesar de maioritário, o partido vai querer continuar a ter apoios à esquerda, deixando apenas a direita a fazer oposição. Dúvida tão grande como a própria posição dos parceiros de esquerda: aceitarão o Bloco de Esquerda, o PCP e os Verdes um novo acordo parlamentar? António Filipe, do PCP, diz que o partido “não funciona com base em futurologias”. Costa disse, no passado, que dialogaria com a esquerda mesmo numa cenário de maioria absoluta.
A nova liderança do PSD
Para João Galamba, as relações entre o PSD de Rio e o PS vão depender do novo líder social-democrata, mas “não podem ficar pior”. O socialista defende que “é positivo que não haja um partido amuado que se exclua de todo o tipo de diálogo”.
Jorge Costa entende que a chegada de Rio ao PSD não vai mudar em nada as relações que a esquerda no geral tem com os sociais-democratas. “Serão as relações políticas normais que existem no confronto entre o PSD e formações que têm ideias à esquerda”. O PCP, pela voz de António Filipe, diz que a nova liderança dos sociais-democratas “é um problema do PSD, que é completamente indiferente para o PCP”.