Tribunal Constitucional força Parlamento a debater impeachment de Zuma
Os juízes do principal tribunal sul-africano consideram que a Assembleia Nacional não cumpriu os seus deveres de escrutínio do Presidente num caso de utilização indevida de dinheiro público.
O Tribunal Constitucional da África do Sul emitiu esta sexta-feira uma sentença que pode ser decisiva para que o Presidente Jacob Zuma seja afastado antes do final do seu mandato, em 2019.
Os juízes concluíram que a Assembleia Nacional não cumpriu o seu dever de responsabilização de Zuma num caso que envolveu a utilização indevida de dinheiro público para a realização de obras na sua mansão particular. O tribunal citou um artigo da Constituição referente ao dever do Parlamento em abrir um processo de impeachment do Presidente em casos de “violação grave” da lei.
“A Assembleia deve pôr em curso o mecanismo que possa ser usado para o afastamento do Presidente”, afirmou o juiz Chris Jafta, durante uma declaração transmitida em directo pela televisão.
A sentença foi apoiada pela maioria dos onze juízes do Tribunal Constitucional, com apenas um voto contra do juiz Mogoeng Mogoeng, que a considerou um exemplo de “excesso judicial”.
O Tribunal Constitucional pronunciou-se a propósito de uma queixa apresentada no ano passado por um grupo de partidos da oposição, que queriam que o Parlamento abrisse um processo de destituição de Zuma. Em causa estão as obras feitas na mansão privada de Zuma, que custaram aos cofres públicos 12 milhões de euros. Em Março do ano passado, o Tribunal Constitucional determinou que o Presidente deveria pagar parte dessa quantia – Zuma concordou em reembolsar cerca de 500 mil euros.
A oposição apresentou uma moção de censura e o Parlamento debateu a questão, mas agora o Tribunal Constitucional defende que o escrutínio feito pela Assembleia foi insuficiente e pede que seja posto em marcha um procedimento para destituir o Presidente.
O tribunal não tem poder para interferir nas decisões do Parlamento, mas a decisão enfraquece ainda mais a posição de Zuma, que tem escapado a várias moções de censura por causa da fidelidade da maioria dos deputados do Congresso Nacional Africano (ANC).
A pressão sobre o Presidente sul-africano tem aumentado nos últimos tempos por causa dos inúmeros escândalos de corrupção em que o seu nome aparece envolvido. No ano passado, a defensora pública – uma figura semelhante ao provedor de justiça – publicou um relatório em que apresentava os pormenores acerca da relação entre Zuma e três irmãos empresários, os Gupta, que durante anos foram favorecidos em contratos públicos.
O ANC controla a maioria dos lugares na Assembleia Nacional e qualquer processo de destituição necessita do seu apoio. Este mês, o partido que liderou a luta anti-apartheid e tem dominado a política sul-africana desde 1994 escolheu Cyril Ramaphosa como novo líder – uma escolha vista como um golpe para a facção de Zuma. Ainda assim, Ramaphosa venceu por uma curta margem e o círculo próximo do Presidente continua a deter posições importantes nos órgãos dirigentes do partido.
“A pressão virá agora do interior do ANC para que seja encontrada uma saída digna para o Presidente Zuma”, disse à Reuters o analista Daniel Silke.
Através de um comunicado, o ANC disse estar a “estudar” a decisão do tribunal e que as suas “implicações” serão discutidas numa reunião do Comité Executivo Nacional marcada para 10 de Janeiro.