Já houve dez jantares no Corpo Central do Panteão Nacional

O evento final da Web Summit foi o terceiro evento organizado este ano no Panteão. A directora do monumento recusou que ali se realizasse uma festa de passagem de ano.

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A NAV foi uma das empresas que realizou um evento no Panteão no ano de 2017 Daniel Rocha

O jantar da Web Summit, que este fim-de-semana agitou as redes sociais e a política portuguesa, foi o décimo a realizar-se no Corpo Central do Panteão, de acordo com informações confirmadas ao PÚBLICO pela Direcção-Geral do Património Cultural. A contabilidade exclui outros eventos que tiveram lugar nas restantes zonas do monumento disponíveis para esse efeito, como o Coro Alto, a Sala Sul, o Terraço e o Adro.

A mesma entidade explicou que o primeiro jantar naquele espaço ocorreu em 2002 e que a prática se intensificou após a regulamentação legal de 2014. Só este ano já houve três. E Isabel Melo, a directora do Panteão, indeferiu sumariamente um pedido para a realização de uma festa de fim de ano, sem o colocar, sequer, à consideração da Direcção-Geral do Património Cultural.

Isabel Melo é a primeira responsável pelas autorizações. Este domingo, ao PÚBLICO, assumiu que não pretende demitir-se na sequência da polémica em torno da realização do jantar da Web Summit. "O que aconteceu na sexta-feira foi um jantar, entre outros que se realizam aqui, no Corpo Central do monumento de acordo com o regulamento que está em vigor", disse a responsável no Panteão Nacional, em Lisboa, à margem do encerramento da exposição Manuel de Arriaga e a construção da imagem da República.

Isabel Melo afirmou ainda que a realização do jantar foi autorizada por "quem tem que autorizar", referindo-se à "Direcção-Geral [do Património Cultural]". A directora remeteu mais informações para um comunicado, emitido pela Direcção-Geral do Património Cultural, que deverá ser divulgado esta segunda-feira.

Questionada sobre se considera o Panteão Nacional um espaço apropriado para a realização de iniciativas do género, Isabel Melo voltou a invocar a legislação em vigor: "Não tenho essa opinião, não posso ter. Há um regulamento feito por quem de direito e nós cumprimos esse regulamento". “Foi tudo cumprido”, assegura a directora do monumento.

A responsável esclareceu ainda que não existem restos mortais na sala onde decorreu o evento ligado à cimeira tecnológica. “Aqui não há corpos. Há sempre essa confusão. Sempre que há algum evento aqui no corpo central, as salas tumulares estão todas fechadas”, explicou. "Aqui neste sítio não há nenhum corpo. São apenas homenagens", sublinhou.

O administrador da Casa do Marquês, uma empresa de catering, disse ao PÚBLICO que já organizou vários jantares no Panteão Nacional (mas não este), sem conseguir precisar quantos. “Pessoalmente, não aprecio, mas é uma questão pessoal e é perfeitamente legal”, afirma, acrescentando que “o local é muito digno mas para outras funções”. José Eduardo afiança que em todos os eventos lá realizados nunca houve “desrespeito” e que, no fundo, se trata de uma questão de opinião.

“Agora espero que não se comece de forma demagógica a fechar todos os monumentos porque isso é um retrocesso enorme numa actividade que é muito importante”, admite ainda o administrador. Segundo José Eduardo, a Casa do Marquês tinha alguns eventos marcados no Panteão Nacional nos próximos meses, mas terá de se encontrar “outra solução”. 

Assunto fora do Parlamento

O jantar realizou-se na sexta-feira, dia 10, e logo no sábado gerou polémica nas redes sociais. No entanto, só se tornou num caso verdadeiramente político quando o primeiro-ministro, António Costa, referiu que a utilização do espaço era “absolutamente indigna”, acrescentando que o seu executivo procederá à alteração do despacho que foi redigido e aprovado pelo anterior governo e que permite a realização de eventos deste tipo em certos monumentos nacionais.

Esquerda e direita acabaram por comentar o jantar e o conceito que está associado ao aluguer de espaços culturais. Mas dificilmente o assunto levará o ministro ou qualquer outro governante ao Parlamento.

Hugo Soares, líder do PSD, confirmou ao PÚBLICO que o partido não pondera chamar Castro Mendes à Assembleia. “Para já, não. A responsabilidade está toda do lado do primeiro-ministro que afirmou que era uma indignidade a realização daquele jantar no Panteão. Ora, se foi o actual Governo que autorizou aquela ‘indignidade’, cabe ao primeiro-ministro acabar com ela ou assumir que o Governo é indigno”, disse o deputado do PSD. “A pouca vergonha de um governo que não assume qualquer responsabilidade e sempre procura apontar culpas tem de acabar”, acrescentou.

Do lado do CDS também Adolfo Mesquita Nunes recusou chamar Castro Mendes ao Parlamento. “Não estamos a pensar nisso”, assumiu. Antes, o centrista havia dito que “se o primeiro-ministro quer categorizar ou quer adjectivar a organização do jantar da forma que fez, essa é uma adjectivação que se aplica ao seu Governo. (…) Não quero adjectivar a realização do jantar, mas a adjectivação que foi feita pelo primeiro-ministro então aplica-se à sua administração pública e à tutela da Cultura”, afirmou Adolfo Mesquita Nunes.

O Bloco mostrou-se intrigado com a razão que leva a que "um espaço como o Panteão” possa ser aberto “a eventos sociais, de natureza privada?" José Manuel Pureza perguntou e respondeu: "A única razão é arrecadar receita." Para o Bloco, o Governo fez o que precisa de ser feito "ao decidir mudar" o regulamento. Agora, é preciso que isso não sirva para deixar de fazer o essencial: “que não se mercantilizem espaços que não podem ser mercantilizados", sublinhou.

"Lamentável e infeliz" foi a expressão usada por António Filipe, do PCP, sobre o jantar. "Foi lamentável, foi um acontecimento infeliz. Aquilo que importa é que situações como esta não se repitam", observou à Lusa. com Sónia Sapage

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