Financiamento nas criptomoedas, o tema que precisa de ser explicado

As moedas digitais têm causado entusiasmo de um lado e desconfiança do outro. Mas ninguém nega os riscos.

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Nuno Ferreira Santos

Não haverá muitos temas de tecnologia que tenham de ser explicados à audiência da Web Summit. Mas foi assim que começou o debate sobre as chamadas ICO (initial coin offering, ou oferta inicial de moedas ou criptomoedas). É uma forma de financiamento com base na mesma tecnologia da bitcoin e que tem causado, entusiasmo, desconfiança e muita confusão entre empreendedores, investidores, profissionais do mundo financeiro e reguladores. E, apesar do claro optimismo de todo o painel no palco principal do evento, não faltaram os alertas para os riscos deste género de operações.

As ICO funcionam de forma semelhante a uma oferta de acções. São feitas através da tecnologia de blockchain, uma base de dados que foi inventada com as bitcoins há nove anos, mas que pode ser usada para outros fins que não pagamentos digitais. Nas ICO é possível a qualquer pessoa comprar aquilo as chamadas "tokens", que podem representar uma parte do capital da empresa. Ao contrário das formas convencionais de financiamento, estas ICO acontecem essencialmente à margem das autoridades de regulação. Outra forma tecnicamente semelhante de angariar dinheiro é vender estas "tokens", não como um investimento na empresa, mas com a promessa de que funcionarão no futuro como uma moeda digital para comprar bens ou serviços na plataforma que a empresa esteja a montar. É o que a portuguesa Aptoide, que desenvolve uma loja de aplicações para Android, está a fazer nesta edição da Web Summit: quem comprar a moeda criada pela Aptoide poderá depois gastá-la na loja.

A blockchain “pode ser uma das grandes tecnologias a transformar a sociedade”, defendeu no palco o investidor de risco Tim Draper. No entanto, reconheceu que investir neste género de operações não é para todos. “Segurança não está no vocabulário das ICO”, disse, frisando ser importante compreender para que servirá a token e quem são as pessoas por trás do lançamento. Draper notou também que num mundo em que a blockchain se massifique, os bancos (que já estão a fazer experiências com a tecnologia) serão "uma parte pequena".

Muitas destas moedas são compradas de forma especulativa, na esperança de que subam de valor nas bolsas de transacções de moedas digitais. É nestas bolsas que o valor da bitcoin – a mais popular das moedas digitais – disparou ao longo deste ano, valendo agora mais de seis mil euros, cerca de seis vezes mais do que em Janeiro, muito embora não seja uma forma de pagamento massificada. Nos últimos meses surgiram dezenas de outras moedas menos conhecidas, muitas das quais apareceram na sequência de ICO.

Já Joseph Lubin, um dos fundadores da Ethereum (uma popular plataforma de blockchain que tem servido para diversas ICO) concedeu que apenas os “investidores muito conhecedores” podem entrar nestas operações. Mas argumentou que esta já é uma actividade regulada pelas regras actuais: “O espaço de criação de tokens é regulado pela SEC”, defendeu, referindo-se ao regulador financeiro dos EUA.

Da parte dos reguladores, porém, parecem existir mais dúvidas. Recentemente, a China e a Coreia do Sul proibiram as ICO, ao passo que o Japão decidiu adoptar regras específicas, com o objectivo de evitar crimes como lavagem de dinheiro. Nos EUA, disse Lubin, as autoridades estão numa fase de recolha de informação. “Estamos do mesmo lado”, garantiu, “do lado da protecção do consumidor”.

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