Crianças rohingya sujeitas ao “inferno na terra”

Relatório da Unicef expõe sofrimento das crianças da minoria muçulmana na Birmânia e em fuga para o Bangladesh.

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Maioria dos refugiados são crianças em desnutrição e a precisar de cuidados médicos Reuters/JORGE SILVA

Quase 340 mil crianças rohingya, refugiadas no Bangladesh, enfrentam desnutrição e estão expostas a doenças infecciosas e a perigos à sua integridade física e moral, com falta de comida, água potável e cuidados de saúde. Os dados são da Unicef e são apresentados nesta sexta-feira em Genebra, Suíça.

De acordo com o relatório Banidos e desesperados: crianças rohingya refugiadas perante um futuro perigoso, o número de crianças aumenta todas as semanas. Em média, semanalmente, cerca de 12 mil crianças fogem das forças de segurança da Birmânia, que avançam com uma “limpeza étnica”.

No total, cerca 600 mil refugiados desta minoria muçulmana saíram do Norte de Arracão desde Agosto, data em que a “operação militar de limpeza” do Exército birmanês começou em Maung Nu e em dezenas de outras aldeias povoadas pela minoria rohingya. Contas feitas, mais de metade desta minoria em fuga são crianças.

“Isto não vai ser uma coisa a curto prazo, nem vai acabar tão cedo”, afirma Simon Ingram, autor do relatório da Unicef, em conferência de imprensa, descrevendo um cenário de miséria e sofrimento. “É o inferno na Terra, é assim que o descreveria”, afirma, segundo a Reuters.

“Não entrevistei nenhuma criança que não me contasse relatos horrendos de violações, pessoas degoladas, bombardeamentos e casas queimadas antes de partirem, e de disparos de atiradores furtivos durante a fuga”, contou Ingram na mesma conferência.

Na terça-feira, a organização Human Rights Watch (HRW) denunciou que cerca de 300 aldeias rohingya foram incendiadas no Noroeste da Birmânia durante a última ofensiva do Exército.

A Birmânia, país de maioria budista, não reconhece os rohingya como uma minoria étnica, impondo uma série de restrições. Muitos rohingya vivem, por isso, sem que lhes seja reconhecida identidade e não possuem documentação. “Sem documentos, não têm qualquer hipótese de integrarem efectivamente qualquer sociedade”, ressalva o autor do relatório.

“É essencial que as fronteiras se mantenham abertas para que seja dada protecção às crianças e para que sejam igualmente registadas quando nascem no Bangladesh”, sublinhou.

A falta de água potável e o saneamento inexistente são fontes de infecção. “As crianças levam constantemente para casa água contaminada”, acrescentou, invocando ainda a sua própria experiência, após duas semanas instalado em Cox’s Baza, Bangladesh.

Existem ainda casos de abuso sexual ou casamentos forçados ou antecipados. O trabalho infantil, por exemplo, é frequente.

O relatório inclui desenhos de crianças com soldados de uniforme a matar pessoas e helicópteros a disparar do céu indiscriminadamente. Uma em cada cinco crianças com menos de cinco anos sofre de desnutrição e requer assistência médica urgente. A Unicef está a ajudar com água potável e instalações sanitárias. Ajuda também com a vacinação contra doenças como a cólera, que pode ser mortal. 

“Devemos continuar a denunciar, não podemos permanecer silenciosos”, insiste o autor do relatório da Unicef.

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