Violência sobre os rohingya é “limpeza étnica”, diz a ONU
Comissário para os direitos humanos da ONU pede ao Governo que ponha termo à operação militar no estado de Rakhine, que provocou a fuga de quase 300 mil pessoas em duas semanas.
A perseguição à minoria rohingya pelo Exército birmanês “é um exemplo perfeito de limpeza étnica”, afirmou esta segunda-feira o comissário para os direitos humanos da ONU, Zeid Raad al-Hussein, deixando um apelo ao Governo para travar a operação militar em curso no Noroeste do país.
“Recebemos vários relatos e imagens de satélite que mostram as forças de segurança e milícias locais a incendiar aldeias rohingya, e vários testemunhos sobre execuções extrajudiciais, incluindo disparos sobre civis em fuga”, disse o responsável perante o Conselho para os Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra.
Há mais de duas semanas que o Exército birmanês tem em curso uma ofensiva militar no estado de Rakhine – onde vivem cerca de um milhão de muçulmanos rohingyas. A ONU estima que cerca de 270 mil pessoas tenham fugido do território e tentado entrar no vizinho Bangladesh, onde os campos para refugiados estão já lotados.
As autoridades birmanesas dizem que estão a combater rebeldes que pertencem a uma “organização terrorista”, mas os relatos dos refugiados que diariamente chegam ao Bangladesh dão conta de violência indiscriminada sobre civis. A Human Rights Watch divulgou imagens de satélite em que se vêem aldeias inteiras destruídas por incêndios, após a passagem do Exército.
“A situação parece um exemplo perfeito de limpeza étnica”, afirmou Zeid, citado pela Reuters. “Peço ao Governo que ponha termo à sua operação militar cruel, que se responsabilize por todas as violações que ocorreram, e que reverta o padrão de discriminação generalizada e profunda contra a comunidade rohingya.”
Desde Outubro que a entrada em Rakhine é altamente limitada pelas autoridades, que vedaram o acesso a jornalistas e a organizações humanitárias. Em Agosto, vários ataques simultâneos a postos da polícia e da guarda fronteiriça birmanesa foram atribuídos ao Exército de Salvação de Arracão (ARSA), um grupo formado recentemente que diz defender os direitos da minoria rohingya e que tem geito algumas acções violentas. Foi em resposta aos ataques contra os postos das forças de segurança que o Exército birmanês lançou a operação.
Durante o fim-de-semana, a liderança do ARSA declarou um cessar-fogo temporário e pediu ao Governo que permita a entrada de ajuda humanitária no território. As autoridades birmanesas recusaram qualquer negociação com “terroristas”.
A violência sobre os rohingya em Rakhine não é de agora. A Birmânia, país de maioria budista, não os reconhece como uma minoria étnica, impondo aos membros da comunidade uma série de restrições – de liberdade de circulação e até quanto ao número de filhos que cada casal pode ter. A fuga à vida de pobreza e humilhação é frequentemente a emigração para países da região, com o Bangladesh a ser o destino mais procurado. Porém, também aí as dificuldades em obter cidadania e trabalho são elevadas.
A Índia anunciou recentemente a intenção de deportar 40 mil rohingya, incluindo 16 mil que tinham recebido o estatuto de refugiados. “Repudio as actuais decisões da Índia de deportar rohingyas numa altura de tão grande violência no seu país”, disse o responsável pelos direitos humanos na ONU.