Campanha Internacional para a Abolição de Armas Nucleares vence Nobel da Paz
O Comité Nobel norueguês decidiu distinguir uma campanha contra as armas nucleares, uma ameaça que nos últimos meses se agravou.
A Campanha Internacional para a Abolição de Armas Nucleares (em inglês ICAN — International Campaign to Abolish Nuclear Weapons) foi distinguida esta sexta-feira com o Nobel da Paz de 2017. A organização não-governamental, que reúne grupos de uma centena de países, pretende proibir e eliminar este tipo de armamento.
"A organização recebe esta distinção pelo seu trabalho na sensibilização para as consequências humanitárias catastróficas de qualquer uso de armas nucleares e pelos seus esforços revolucionários para promover uma proibição de tais armas por tratado”, declarou o Comité Nobel norueguês.
"Este não é um prémio controverso porque a luta [contra o armamento nuclear] é um objectivo comum", defendeu a líder do Comité Nobel norueguês, Berit Reiss-Andersen, que anunciou o prémio. "As pessoas não querem ser defendidas por armas nucleares", disse.
A escolha da ICAN acontece num momento em que a Coreia do Norte multiplica ensaios nucleares e lançamentos de mísseis balísticos. Um dos nomes que estava na corrida ao Nobel 2017 era a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, pelo seu papel na assinatura do acordo nuclear entre o Irão e seis grandes potências (Estados Unidos, Reino Unido, Rússia, China, França e Alemanha), que esteve 12 anos a ser negociado.
Este ano, o Comité Nobel norueguês recebeu 318 candidaturas.
A organização já reagiu na sua página de Facebook, onde agradeceu e dedicou o prémio “aos sobreviventes dos atentados atómicos de Hiroshima e Nagasaki e vítimas de explosões de testes nucleares em todo o mundo”.
“Este prémio é uma homenagem aos esforços incansáveis de muitos milhões de activistas e cidadãos preocupados em todo o mundo que, desde o início da era atómica, protestaram fortemente contra armas nucleares”, defendendo que estas armas “não servem um propósito legítimo e devem ser banidas para sempre”.
A organização recorda o primeiro tratado de sempre que proíbe armas nucleares, assinado por mais de uma centena de países a 7 de Julho deste ano. Na votação, 122 países votaram a favor, a Holanda votou contra e Singapura absteve-se.
Porém, nenhum dos nove países com armas nucleares – Estados Unidos, Rússia, Reino Unido, França, Israel, China, Índia, Paquistão e Coreia do Norte – participou nas negociações. Até o Japão, único país alvo de um ataque com um aarma nuclear, em 1945, boicotou as negociações, assim como a maioria dos países da NATO, incluindo Portugal.
“O tratado proíbe categoricamente as piores armas de destruição em massa e estabelece um caminho claro para sua eliminação total. É uma resposta à preocupação cada vez maior da comunidade internacional de que qualquer uso de armas nucleares causaria danos catastróficos, generalizados e duradouros às pessoas e ao nosso planeta”, lê-se no comunicado.
Prémio invoca acção
“Este é um momento de grande tensão global, quando uma retórica ardente poderia facilmente levar-nos, inexoravelmente, a um horror indizível. O espectro do conflito nuclear aparece mais uma vez. Se alguma vez houve um momento para que as nações declarassem a sua oposição inequívoca às armas nucleares, esse momento é agora”, sublinha a organização.
Esta não é a primeira vez que a Academia se preocupa com a questão do nuclear. Em 2005, o Nobel da Paz foi atribuído à Agência Internacional de Energia Atómica e ao seu director, Mohamed ElBaradei. Também em 1995, o Comité tinha atribuído a mesma distinção ao movimento anti-nuclear Pugwash (fundado no Canadá) e ao seu fundador, Joseph Rotblat.
No ano passado o Nobel da Paz foi entregue ao Presidente colombiano Juan Manuel Santos.
Entre as mensagens de felicitações, está a de António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas. O diplomata sublinhou que "mais do que nunca, precisamos de um mundo sem armas nucleares".
"Esta escolha para o Prémio Nobel da Paz é muito acertada no timing histórico porque dá uma força à velha e exemplar questão de banir as armas nucleares do mundo", disse Pedro Neto, diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal, em declarações à agência Lusa.
"Nesta altura em que vivemos uma certa tensão polarizada por dois líderes políticos, Donald Trump [Presidente dos Estados Unidos da América] e Kim Jong-Un, [Presidente] da Coreia do Norte, em que os dois trocam 'galhardetes', com ameaças e testes de mísseis balísticos, esta é uma oportunidade histórica para dar um revés a este tipo de narrativa que incita ao medo, ao ódio, que é desestabilizadora", acrescentou. "Se este Nobel da Paz for a oportunidade para elevar a pressão a estes líderes políticos que insistem no nuclear... esperemos que sim, que seja, e que mudem a sua direção face a esta questão, pelo menos."