Sobre o conflito internacional militar no Leste da Ucrânia
O desejo de um controlo total sobre a Ucrânia tem dominado os interesses neo-imperiais da Rússia há muitos anos.
Em resposta ao artigo de opinião do Prof. José Pacheco Pereira, intitulado “O que é que se passa na Europa e em Portugal face à Catalunha?”, consideramos que várias passagens do artigo não são mais do que a tentativa de manipulação de opinião pública portuguesa. Nomeadamente, como a tentativa dessa mesma manipulação consideramos as frases “a Europa [...] participou num processo ilegal de derrube do legítimo Governo ucraniano”, “as forças protofascistas que ocuparam a Praça Maidan em Kiev”, “a guerra civil nos Donets”, usadas pelo Prof. José Pacheco Pereira e que fazem parte da retórica habitual da poderosa máquina de propaganda do Kremlin. Embora o Sr. Professor tenha toda a razão, já que realmente “a Rússia interveio na Ucrânia ocupando a Crimeia”.
No final de fevereiro de 2014, quando os cidadãos ucranianos derrubaram o regime corrupto e cleptocrático, agarrado ao poder a qualquer custo, o Kremlin tinha-se apercebido da inevitabilidade da vocação europeia da Ucrânia, o que de uma certa maneira ameaçou o seu regime autoritário, uma vez que o desejo de um controlo total sobre a Ucrânia tem dominado os seus interesses neo-imperiais há muitos anos. Assim, em 20 de fevereiro de 2014, a Rússia invadiu a península da Crimeia, usando as unidades ditas híbridas, com uso de uniformes sem identificação, ocupando e, após o referendo ilegal de 16 de março do mesmo ano, anexando a península ucraniana, violando assim, em particular, o Memorando de Budapeste de 1994. Inicialmente negando-o de forma veemente, posteriormente o Presidente russo reconheceu a participação das forças armadas russas na ocupação da península ucraniana, afirmando ter dado ordens ao Ministério da Defesa da Rússia para deslocar as forças especiais, fuzileiros navais e tropas aerotransportadas para a Crimeia.
Em abril de 2014, a Rússia iniciou de forma ilegal e sem o declarar o conflito militar contra a Ucrânia, que continua até hoje. Diversas e mais que suficientes provas mostram que a guerra no Leste da Ucrânia não é de todo uma guerra civil. Face a essas provas, a Rússia continua a negar a sua participação direta no conflito. Apesar do profundo desejo da parte ucraniana de não ter a Rússia como parte do conflito, a realidade dos factos e a presença documentada de unidades militares russas em Donbas provam o contrário.
Em fevereiro de 2017, a comunidade internacional InformNapalm (uma iniciativa voluntária de Open Source Intelligence) publicou o relatório em que descreveu ao pormenor os 43 tipos de equipamentos militares russos usados no Leste da Ucrânia, efetivamente em poder das forças conjuntas russo-terroristas, embora oficialmente de uso exclusivo das forças armadas russas.
Importa perguntar como estes equipamentos militares russos foram parar ao Leste da Ucrânia. Podemos pressupor que entraram no território ocupado da Ucrânia através da fronteira que está fora do controlo do país e sob o controlo total da Rússia.
Mas a diplomacia russa lançou a sua versão destes factos, afirmando que o armamento e equipamentos foram “achados” nas minas de Donbas, em armazéns da época soviética. O que é uma piada de mau gosto. Mas a Rússia não fica por aqui.
A 23 de agosto de 2017, o Serviço de Segurança da Ucrânia apresentou as provas da política agressiva russa contra o meu país, revelando os planos do Serviço Federal de Segurança (FSB) da Rússia de organizar os atos terroristas no seu próprio território, usando cidadãos ucranianos e evocando o cenário semelhante de 1999, altura em que as explosões em prédios habitacionais de Moscovo e Volgodonsk abriram o caminho à 2.ª Guerra da Tchechénia. Hoje, as mesmas táticas são preparadas para criar o pretexto de uma incursão militar no território ucraniano, incitando nos cidadãos russos o ódio irracional contra a Ucrânia.
Espero que os factos acima referidos, de entre muitos outros que comprovam a participação russa na guerra no Leste da Ucrânia, sejam apreciados pelo Tribunal Internacional de Justiça como uma prova dos graves crimes da Rússia contra a Ucrânia e do ataque russo ao direito inalienável do povo ucraniano de viver no seu estado soberano.
A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico