Vai ser lançada uma iniciativa legislativa de cidadãos, na esperança de “incentivar as pessoas a agirem” e, desta vez, tentar uma mudança legislativa a propósito do financiamento público das touradas. A ANIMAL — uma organização não-governamental de defesa dos direitos dos animais — apresentou a nova fase da campanha “Enterrar Touradas”, que visa denunciar o dinheiro gasto pelas autarquias “numa actividade cruel” e mobilizar os cidadãos para agir.
Uma iniciativa legislativa de cidadãos é diferente de uma petição pública, já que os cidadãos participam activamente no procedimento legislativo que iniciaram. Mas, para isso, a ANIMAL tem que conseguir 20 mil signatários. A associação até já tinha reunido mais do que isso, através de uma petição pública para que o fim dos apoios públicos fosse discutido em parlamento, mas na altura não existiu consenso . Antes da intervenção de ontem, a associação, através da presidente Rita Silva, já tinha feito saber que a documentação reunida sobre a forma como é gasto o dinheiro nas touradas iria “chocar as pessoas”.
Com as autárquicas à porta, a ANIMAL apresentou o registo de dinheiros públicos encaminhados para eventos de tauromaquia - que também estão disponíveis aqui. Desde 2003 até a 2017, são 35 páginas onde são discriminados os gastos de vários municípios. São cerca de 80 registos só durante este ano. Os valores podem ir desde poucos milhares de euros até 200 mil euros, como é o caso do Seixal na requalificação da Praça de Touros de Paio Pires.
Tirar Portugal da lista
“Acreditamos que desta vez vamos ter sucesso”, conta Rita ao P3. O objectivo da campanha de apresentação de documentos e o anúncio da criação da iniciativa legislativa é, também, sensibilizar. A Associação já leva 22 anos às costas e as sucessivas campanhas têm permitido colher alguns frutos, mesmo que fora das estâncias democráticas. “A última década, principalmente os últimos cinco anos, tem sido gritante [a mudança da opinião pública] ”, conta. Na opinião da líder associativa, “as pessoas já não têm pudor” de manifestar uma opinião negativa acerca das touradas.
Aquando da “polémica de Barrancos”, em 2002 – quando foram legalizados os touros de morte naquela vila do distrito de Beja -, a Animal já levava oito anos de associação. Rita, desde muito cedo ligada à defesa dos animais, embarca no projecto dois anos depois de estalar a polémica. Este tempo acumulado na associação, já a levou para outras latitudes e a conhecer realidades diferentes.
Aponta para a vizinha Espanha, com uma avincada tradição de tauromaquia, como um exemplo de resistência. Em algumas regiões, conta Rita, “não há dinheiro público” injectado em eventos do género, “nem publicidade” associada. A plataforma lembra que “apenas nove países no mundo ainda não consideram que deveria ser proibido nacionalmente”, sendo Portugal um dos países onde a prática é legal.
O objectivo final deste projecto passa por retirar Portugal desta lista, já que embora a associação reforce que esta campanha não pede a proibição da tauromaquia, realça “que os apoios públicos são o pilar que ainda mantém esta actividade de pé”. Na opinião da associação, a actividade deveria ser mantida por quem compra bilhetes para assistir aos eventos.
Recorde-se que a transmissão da Corrida TV Norte, na Póvoa de Varzim, pela RTP, em Julho último, dividiu opiniões. A PróToiro, ouvida pelo Diário de Notícias altura, referiu que os números obtidos pela estação pública naquela noite “só provam que o público português tem interesse em ver corridas de touros televisionadas”.
A activista diz que, com o passar do tempo, “já se sabe mais” sobre os riscos que eventos deste tipo acarretam, lembrando que mesmo o espaço mediático está diferente: “Quando era mais nova, com dois ou três canais à disposição, era normal passar tourada durante a tarde, por exemplo”.