"Business as usual?"
Esperemos que, aquando do próximo atentado governos e políticos não se limitem mais uma vez a pedir que não tenhamos medo,
O terrorismo islâmico na Europa banalizou-se. A cada atentado, juramos que o Terror jamais nos vencerá: não cedemos ao medo, continuamos as nossas rotinas habituais; nada ou ninguém abalará os valores e tradições em que assenta “o nosso modo de vida”. Isto é falso. Primeiro, porque existe medo mais do que justificado: há centenas de ruas ou bairros pela Europa fora onde nem a Polícia se atreve a entrar. Viajar de avião é um inferno e também passear pelas ruas se tornou perigoso. A privacidade de cada um está cada vez mais exposta à intrusão das autoridades porque a segurança assim exige.
Segundo, porque o Terror irrompe numa Europa cansada de tanta História, assolada por migrações gigantescas para que não encontra remédio e a que não vê o fim – já o tremendo reboliço de povos que se seguiu à II Guerra era um drama transitório, com um fim à vista. À imparável intensificação da tradicional emigração económica, juntou-se a trágica crise dos refugiados de guerra. A continuação da primeira depende do desenvolvimento económico dos países de origem dos emigrantes; depende de uma grande incógnita. A continuação da segunda, depende da pacificação do Médio Oriente, que ninguém sabe quando se dará; depende de outra grande incógnita. Ambos os fenómenos prometem prolongar-se indefinidamente.
Terceiro e mais importante, porque o Terror irrompe numa Europa autofragilizada: descrente dos seus valores civilizacionais, envergonhada do seu passado histórico e sobretudo manietada, paralisada pela expiação de uma “culpa” que nunca se julga suficientemente espiada. Todas as civilizações exaltam as respectivas criações; só à Europa não se reconhece legitimidade para celebrar as aquisições civilizacionais que ofereceu ao Mundo. A Europa rendeu-se às investidas do pós-modernismo, à agressividade da indústria identitária, à ditadura do politicamente correcto, às realidades ou factos “alternativos”, e desliza obscenamente para a Novíssima Era da Pós-Verdade. O desporto favorito de muitas Universidades consiste em denunciar o teor peçonhento da cultura europeia. A Europa está de baixa por tempo indeterminado.
As migrações e o terrorismo são problemas distintos. Mas na prática e realidade, eles interligam-se. Confrontados com uma imigração que atingiu proporções ainda há dez anos inimagináveis, os governos e os políticos europeus, parecendo honrar o tradicional humanitarismo da Europa, mas na realidade movidos pelo medo de serem acusados de xenófobos ou racistas, autorizaram um total descontrole do fluxo migratório para os respectivos países. A aposta na integração dos alienígenas, maioritariamente muçulmanos, falhou estrondosamente, o que não espanta. Com efeito, como esperar de um islâmico que se transforme num europeu, se nós, europeus, não nos podemos transformar em muçulmanos, indianos ou chineses?
De envolta com os imigrantes chegaram também o fundamentalismo islâmico e um longo rastro de sangue deixado pelo cortejo de atentados terroristas na Europa em que muitas centenas de pessoas perderam (e continuam a perder) a vida. Todos esses ataques tinham (e têm) assinatura islâmica. Ao longo dos anos, apesar de os governos e os políticos lembrarem os Direitos Humanos e recomendarem bondosamente às populações que não confundissem um muçulmano com um terrorista, cada muçulmano tornou-se ipso facto um suspeito. Injusto, sem dúvida, mas compreensível. A coabitação de muçulmanos e europeus, que até finais do séc. XX não suscitava problemas insolúveis, começou a gripar. E foi-se desarranjando cada vez mais à medida que ocorriam dois fenómenos paralelos, interpretados, não sei se bem ou mal, como ligados por uma relação de causalidade: o aumento da imigração muçulmana e a multiplicação dos ataques terroristas.
O mais extraordinário é que os governos e os políticos tenham ao longo dos anos ignorado em absoluto o manifesto mal-estar dos nativos – retratado em múltiplas sondagens e reflectido nos resultados eleitorais de vários países. Os nossos governantes continuaram, com esmerada correcção política, a recitar os Direitos Humanos e a persistir em que ninguém se deixasse tomar pelo medo, pois isso daria a vitória ao Mal.
Foi preciso o discurso de Merkel em Potsdam, em Outubro de 2010, no qual a chanceler reconheceu enfaticamente o fracasso do multiculturalismo, para que o tema das relações interétnicas e da inevitável limitação do influxo de muçulmanos deixasse de ser tabú. A percentagem de imigrantes em vários países europeus é notoriamente excessiva (Douglas Murray, 2017), não só em virtude da impossibilidade de uma aculturação – que aliás seria indesejável -, como porque o terrorismo islâmico, mal ou bem, é associado ao descomunal número de muçulmanos em solo europeu. A luta contra o Terror islamita englobará necessariamente a reconsideração das políticas de emigração. Dois problemas na prática geminados e que não se resolvem com os eufemismos, a farsa e a hipocrisia a que recorrem governos e políticos amedrontados pelas sentinelas do politicamente correcto. Face ao rosário dos ataques recentes, expirou o prazo para políticas de avestruz.
Esperemos que, aquando do próximo atentado – o último foi a 18 de Agosto, dois dias antes de escrever este texto, na Finlândia – governos e políticos não se limitem mais uma vez a pedir que não tenhamos medo, que tudo continue “business as usual”, e que em nome dos Direitos Humanos ofereçamos a outra face: a Europa é cristã, mas os europeus não são santos.