O lixo salvou Fabiana da Cracolândia

“Temos de limpar o nosso planeta. Para os nossos netos, os nossos filhos, os nossos bisnetos. Eu vejo como a cidade está a ficar cada vez mais suja." Reuters/NACHO DOCE
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“Temos de limpar o nosso planeta. Para os nossos netos, os nossos filhos, os nossos bisnetos. Eu vejo como a cidade está a ficar cada vez mais suja." Reuters/NACHO DOCE

Todos os dias, Fabiana Silva percorre as ruas de São Paulo em busca de lixo: “é a rua que põe comida na minha mesa”, explica. Não o faz com vergonha, mas com orgulho. Diz que é preciso "limpar o planeta" e usa com vaidade uma t-shirt colorida com a frase "Pimp my carroça" (Embeleza a minha carroça). Durante 16 anos, Fabiana, hoje com 38, viveu nas ruas da Cracolândia, o supermercado de droga a céu aberto que é casa para quase 2000 toxicodependentes. Fabiana fugiu de casa nos arredores de São Paulo com apenas sete anos, escapando a um padrasto violento. Acabou mergulhada no tráfico e consumo de drogas, um período da sua vida que descreve como sendo um “inferno”.

Nos últimos anos, a Cracolândia foi alvo de várias tentativas de desalojar os consumidores que ocuparam o local. Em Maio deste ano, o presidente da Câmara pôs em marcha a operação “Redenção” para desmantelar o supermercado de droga, com demolições de prédios e internamentos forçados de toxicodependentes. A acção acabaria por ser travada pelos tribunais devido à violência usada na operação. Para Fabiana, forçar o internamento não é a solução. A busca por ajuda tem de ser voluntária: “Para quebrar o vício temos de querer muito.” A força de Fabiana veio dos filhos, hoje com 8 e 14 anos. “Foi preciso muita força para deixar aquela vida. Mas os meus filhos vieram e eu tinha de sair”.

Sobreviver, para Fabiana, continua a passar pelas ruas da gigante São Paulo, mas agora carrega às costas uma enorme carroça que pode levar até 400 kg de bens recicláveis que lhe permitem ganhar 100 reais por dia, cerca de 27 euros. Um rendimento que abriu uma nova vida para Fabiana: uma pequena casa para si e os filhos na favela do Moinho e um investimento na sua formação. Acaba de obter o diploma do ensino preparatório e sonha com a universidade e uma carreira como veterinária. “Eu era uma miúda da rua. Deixei a escola na terceira classe. Agora, como adulta, voltei  à escola. É uma grande conquista para mim”.

A formação dos filhos é hoje uma prioridade para Fabiana: "Quero que os meus filhos sigam o meu caminho de trabalhadores, mas não a puxar a carroça, eles estão a estudar.”
A formação dos filhos é hoje uma prioridade para Fabiana: "Quero que os meus filhos sigam o meu caminho de trabalhadores, mas não a puxar a carroça, eles estão a estudar.” Reuters/NACHO DOCE
Fabiana vende o cartão que recolheu nas ruas na favela do Moinho
Fabiana vende o cartão que recolheu nas ruas na favela do Moinho Reuters/NACHO DOCE
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Fabiana tem orgulho no trabalho que faz: "Já salvei milhares de árvores porque uma tonelada de papelão reciclado salva 22 árvores."
Fabiana tem orgulho no trabalho que faz: "Já salvei milhares de árvores porque uma tonelada de papelão reciclado salva 22 árvores." Reuters/NACHO DOCE
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Fabiana em casa, na favela do Moinho
Fabiana em casa, na favela do Moinho Reuters/NACHO DOCE
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Os filhos e os sobrinhos acompanham-na muitas vezes nas recolhas nocturnas
Os filhos e os sobrinhos acompanham-na muitas vezes nas recolhas nocturnas Reuters/NACHO DOCE
Os filhos Brian, de 8 anos, e Breno, de 14
Os filhos Brian, de 8 anos, e Breno, de 14 Reuters/NACHO DOCE
Preparação para a cerimónia na escola, depois de ter concluído o ensino preparatório
Preparação para a cerimónia na escola, depois de ter concluído o ensino preparatório Reuters/NACHO DOCE
Fabiana no dia da entrega dos diplomas na escola Coração de Jesus, São Paulo
Fabiana no dia da entrega dos diplomas na escola Coração de Jesus, São Paulo Reuters/NACHO DOCE
"A minha mãe teve 12 filhos, só oito estão vivos, e desses oito ninguém se formou em nada."
"A minha mãe teve 12 filhos, só oito estão vivos, e desses oito ninguém se formou em nada." Reuters/NACHO DOCE
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