Ozark problematiza a extinção da classe média norte-americana

A série que chega esta sexta-feira ao Netflix é encabeçada por Jason Bateman e centra-se num consultor financeiro que é forçado a pagar uma dívida a um barão da droga mexicano.

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Jason Bateman é o protagonista do thriller psicológico Jackson Davis/Netflix
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Marty (Jason Bateman) e Wendy (Laura Linney) Jackson Davis/Netflix

Os três minutos de monólogo que servem de abertura da série permitem conduzir imediatamente o espectador pela psique de Marty Byrde (Jason Bateman). “O dinheiro. É o que separa os ricos dos pobres. O que é o dinheiro? É tudo se não o tens, certo?”, questiona o protagonista de Ozark, o novo thriller psicológico do Netflix que se estreia esta sexta-feira. O consultor financeiro parte do geral para o particular para falar da economia norte-americana, notando que “há mais americanos com débitos de cartão de crédito que poupanças, 25% não têm qualquer poupança e apenas 15% podem gozar da reforma”. “Será que a classe média está a desaparecer? Ou que o sonho americano está morto?”, deixa no ar, interpelando ficção e realidade no mesmo plano.

A vida de Marty começa e acaba no dinheiro, que considera ser “a medida das escolhas de um homem”. É, de facto, uma das suas escolhas que está na origem do enredo da série de dez episódios. Marty é um dos sócios da Lidell & Byrde, uma empresa de consultadoria financeira que tem vindo a fazer branqueamento de capitais para um famoso cartel de droga mexicano liderado por Del (Esai Morales). O esquema dá para o torto quando o barão da droga descobre que alguém do topo desviou milhões de dólares e, furioso, desata a matar toda a gente.

Só que Marty não despe a faceta de homem de negócios nem nas circunstâncias mais extremas e consegue poupar a sua vida e a sua família com a promessa de que se mudarão para o Lago de Ozarks, um grande centro turístico do Missouri, onde argumenta que “haverá menos regulamentação” e “maior disponibilidade de dinheiro para movimentar”. A decisão não vai cair bem numa família que já se encontra fragmentada e que é integralmente afectada pelas acções do seu patriarca. "Pensamos: por que não levá-los numa jornada em que a ligação familiar, e as capacidades destas crianças, são beneficiadas e não dizimadas pela situação por que passaram?”, explica o argumentista Bill Dubuque ao New York Times. Os créditos de Bill Dubuque incluem The Accountant - Acerto de Contas (2016), filme protagonizado por Ben Affleck que conta a história de um génio da matemática que trabalha para uma perigosa organização criminosa.

Deslocar uma família privilegiada dos subúrbios de Chicago para o meio rural tem muito que se lhe diga, até porque o casamento de Marty e Wendy (Laura Linney) já viu melhores dias. “Uma família é como um pequeno negócio e às vezes os pequenos negócios têm que passar por transições”, justifica o protagonista aos filhos, Charlotte (Sofia Hublitz) e Jonah (Skylar Gaertner). Marty mantém uma frieza e uma racionalidade inquietantes mesmo quando descobre a traição da mulher e é raro vê-lo passar para o lado emocional. Afinal, há muito que fazer nas 48h que se seguem ao encontro com Del. É preciso pôr tudo em caixas, comprar uma casa no Missouri e esconder uma gigantesca quantidade de dinheiro. “Já não somos marido e mulher. Somos parceiros de negócio e o nosso trabalho é educar os nossos filhos”, sublinha.

Um drama familiar que fala da crise económica americana

O Lago de Ozarks é um lugar de grandes contrastes, quer pelas grandes mansões com vista para o mar que se alinham na reserva natural do Missouri quer pelas caravanas e tendas que ali se fixam todos os Verões, e a família Byrde vai ser mais um. “Estas pessoas não estão numa sociedade cosmopolita, metropolitana e progressiva e têm alguma influência”, descreveu Jason Bateman ao NYT. “Eles têm um conjunto diferente de ideias e regras relativamente à forma como as coisas são feitas."

Mal põe em marcha o plano de mudar-se para Ozarks, o consultor financeiro vai contactando os empresários locais e oferece-se para actualizar os seus modelos de negócio para começar a reaver a quantia devida a Del. Só que vai ter à perna um agente do FBI, Roy Petty (Jason Butler Harner), o pastor local (Michael Mosley), o "manda-chuva" da região (Peter Mullan) e uma família criminosa encabeçada por Ruth (Julia Garner, de The Americans), uma jovem de 19 anos que vê Byrde e as suas malas de dinheiro como uma oportunidade de subir na vida.

Ozark, que tem realização de quatro episódios e produção executiva de Jason Bateman, anda entre o thriller psicológico e o drama familiar para mostrar um mundo noir em que a ambição e a ganância se misturam – sem deixar de abordar as dificuldades da classe média norte-americana no contexto sócio-económico actual. “Eu vou arranjar um trabalho”, diz Wendy a certa altura ao marido. “Sete dólares à hora não vão resolver o nosso problema”, retorque Marty. Ao que Wendy insiste “Mas eu tenho um mestrado”, numa alusão à incerteza que acompanha as grandes qualificações.

Algumas cenas da série foram rodadas no local que lhe dá nome, mas as gravações decorreram maioritariamente em Atlanta. A Variety classifica-a como o melhor trabalho de Jason Bateman desde Arrested Development – De Mal a Pior, série que o catapultou para o estrelato. “Ozark guia cuidadosamente a audiência por uma história que é uma das estreias mais compulsivamente "assistíveis" deste ano – uma história criminal que é parte thriller, parte gracejo e uma surpresa interminável”.

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