Rocha Andrade: a máquina, o perdão e os paraísos
O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais sentou-se na sala de máquinas do Fisco e desde então assumiu vários dossiês polémicos, para além das sempre delicadas mudanças no IRS, no âmbito de uma ambiciosa reforma do IRS.
Há, no mandato de Fernando Rocha Andrade, um antes e um depois da revelação sobre as viagens com a Galp ao Euro 2016. Aconteceu no Verão do ano passado e, desde então, o responsável pela máquina do Fisco viveu uma sucessão de episódios que o colocaram debaixo dos holofotes políticos, entre os quais se destacam o perdão fiscal, as alterações a conta gotas no IRS e o caso dos offshores.
Antes, porém, a sua chegada ao Governo tinha sido marcada por grande expectativa acerca de um eventual imposto sucessório, defendido pelos parceiros de esquerda do executivo socialista. Com a medida a ficar na gaveta, rapidamente o tema mudou para possíves alterações no Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP), ao ritmo das variações dos preços do petróleo, a que se juntou o desconto no gasóleo profissional para tentar contrabalançar o efeito da ausência de uma descida global.
Já depois de ultrapassada a crise dos reembolsos do ano passado - com a lentidão da máquina a voltar a colocar pressão sobre a sua secretaria de Estado - Rocha Andrade chocou de frente com as alterações no Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) e em especial com os critérios de localização e exposição solar a criarem uma onda de contestação. Quando se preparava para defender a legitimidade desta medida, surge a crise das “viagens do Euro”, que acabariam por envolvê-lo não só numa polémica nacional sem precedentes em torno do seu nome, mas - mais relevante para o seu percurso profissional - colocaram-no na mira das autoridades.
Depois deste Verão quente, Rocha Andrade avançou para o “perdão fiscal”, o Peres, o Programa Especial de Redução de Endividamento ao Estado, que o próprio secretário de Estado estimou que pudesse render aos cofres públicos 1434 milhões de euros ao longo de mais de uma década. Ainda assim, Rocha Andrade reconheceu "alguma perversidade" ao regime cuja criação e implementação liderou, contribuindo assim de forma decisiva para o cumprimento das metas orçamentais do Governo.
No campo dos impostos sobre o rendimento, o secretário de Estado procurou capitalizar as pequenas alterações que foram sendo feitas nos escalões e em relação à sobretaxa, enquanto se aguardava por medidas mais vincadas nesta frente. E acabou mesmo por chamar a si a defesa das medidas do Governo neste tema. Mas continua a faltar a ambiciosa reforma fiscal, cujos contornos estavam neste momento a ser cozinhados na secretaria de Estado a tempo do próximo Orçamento do Estado.
Entretanto, na frente do imposto sobre o património acabou por ser forçado a recuar na afinação final de uma iniciativa da sua responsabilidade política, mas que ficaria colada a uma parceira da coligação de apoio governamental, nomeadamente com a transformação do Adicional ao IMI no “imposto Mortágua”.
A mais recente oportunidade para assumir protagonismo foi o caso do apagão das transferências para paraísos fiscais (offshores). Neste caso, Rocha Andrade colocou o ónus na actuação do seu antecessor, Paulo Núncio, e aumentou a pressão interna para apurar as razões para o fisco ter ficado sem informação sobre os dez mil milhões de euros que saíram de Portugal para destinos de branda fiscalidade. A auditoria ao processo, encomendada à IGF, foi pretexto para intensas críticas do próprio Rocha Andrade em relação ao que continua por se apurar em torno do caso.
Em plena preparação do Orçamento do Estado para 2018, onde a área que tutela terá um papel decisivo na implementação das políticas do Governo de António Costa, Rocha Andrade acaba por sair, quase um ano depois da polémica provocada pela revelação da viagem para ver a selecção portuguesa de futebol jogar no Europeu.