A geopolítica não é para meninos
Trump está a começar a perceber que o mundo real não se compadece com a superficialidade de uma política feita de slogans sem substância.
Não há ainda certezas sobre o tipo de míssil lançado pela Coreia do Norte: se for um intercontinental, os Estados Unidos ficam na mira de uma arma potencialmente nuclear. Mesmo que não seja, e que a comunicação de Pyongyang esteja a potenciar a ameaça, o essencial mantém-se. As negociações serão tão mais difíceis quanto mais forte for o trunfo empenhado pelo líder coreano – e hoje esse trunfo parece muito ameaçador.
A Coreia do Norte é um risco acrescido e o mundo está outra vez à beira de uma Guerra Fria de contornos nucleares. A situação é muito anterior a Donald Trump, mas desde que tomou posse o novo Presidente fez muito para piorar as coisas. Agora conseguiu receber de presente pelo 4 de Julho uma ameaça nuclear continental que o obriga a ter uma política geoestratégica estruturada. Isso hoje não existe na Casa Branca: não se conhece pensamento que vá para lá dos tweets bem e mal humorados do Presidente Trump, não há teóricos respeitados que hoje sejam ouvidos na Sala Oval e mesmo o Pentágono parece perdido na deriva diária. Pior, a abordagem à China e à Rússia está a ser muito mal conduzida e as consequências negativas recaem sobre os Estados Unidos. Trump está a começar a perceber que o mundo real não se compadece com a superficialidade de uma política feita de slogans sem substância. Não se pode ameaçar abrir guerras comerciais com a China quando se precisa do apoio de Pequim para resolver problemas como a Coreia do Norte. E não se pode esperar que o amigo Putin vá resolver um problema que não é o dele, quando é mais do que útil a Moscovo manter os americanos ocupados com ameaças coreanas.
O modelo autocrático do Presidente americano até pode ir funcionando para consumo interno, apesar de acumular derrotas na gestão política; mas a nível geoestratégico é mais do que óbvio que a falta de solidez está a colocar em causa o papel americano no mundo. Mesmo quando os ocupantes da Casa Branca tinham menos capacidades diplomática e aparentavam fraquezas no plano global, os Estados Unidos mantiveram-se fortes e poderosos porque a administração sempre contou com o apoio de uma elite de funcionários públicos de exceção, educada nas melhores universidades do planeta. Hoje, a clique que acompanha Trump está ligada aos negócios mas não à intelectualidade – e as fragilidades e as suas consequências estão à mostra. Esta presidência de Trump vai sair cara à nação americana.