A Educação rosa
Na equação política do PS, a Educação não conta.
O PS é um partido político que foi perdendo a sua matriz ideológica. Sob a liderança de António Costa, a aliança à esquerda é meramente circunstancial e ditada por ser a única forma de ganhar o Governo, depois de perder as eleições. Para os que legitimamente discordem deste ponto de vista, recomendo a análise fina das votações da legislatura e a interpretação grossa dos sinais dos últimos dias (bloco central na TAP, flop na chefia das secretas, imprudente acolhimento de familiares de amigos e de interesses de amigos, prudente respeito pelos contratos firmados com os chineses da EDP mas oportuno desprezo pelos contratos firmados com os professores portugueses).
Para os que concluem o ensino secundário, é hora de exames, onde se joga a entrada nas universidades e politécnicos. Para alguns dos outros é hora de brincar às provas de aferição, onde se queima credibilidade, tempo e dinheiro, porque se trata de provas que foram largamente usadas e abandonadas por inúteis e porque, ao persistir na asneira, ao menos que fossem aplicadas no fim dos ciclos de estudo ou feitas por amostragem.
Na equação política do PS a Educação não conta. O ministro é um bibelot que acompanha os senhores nas festas e que se mistura com a malta nos recreios, quando há fotógrafo por perto.
A análise do discurso do secretário de Estado João Costa expõe uma mistura de postulados gastos, por óbvios, com teorias pedagógicas velhas e ultrapassadas, que foram abandonadas porque falharam, depois de terem lançado a confusão no sistema de ensino. É certo que este arauto-mor do “eduquês” recuperado teve os ímpetos travados e passou das “alterações profundas” e da sua generalização para a experimentação circunscrita da “flexibilidade pedagógica”. Mas a verdade é que está destruindo, com o apoio de prosélitos e oportunistas, o que, apesar de tantas vicissitudes e sacrifícios, os professores sérios e maduros conseguiram acrescentar aos resultados do sistema de ensino. E poupem-me os prosélitos à ligeireza do “parece que no tempo de Crato é que era bom”, porquanto basta ler o que sobre ele escrevi. A questão é termos passado de uma pedagogia ferozmente utilitarista, que encarava a Educação como mercadoria ao serviço da economia de mercado, sem sensibilidade humanista nem consideração pelas diferenças individuais das crianças em formação, para uma pedagogia do paraíso, assente na retórica provinciana do “aluno do século XXI”, do “trabalho de projecto”, da “flexibilidade pedagógica”, do “trabalho em rede” e dos “nados digitais”, sem considerar o estádio intermédio que resulta da arbitragem prudente entre o valor intrínseco do conhecimento e a especulação pedagógica.
Quando se junta a melodia das “aprendizagens essenciais” ao estribilho da “flexibilidade pedagógica”, os que já assistiram a tantos coros de outros tempos sabem o que a música vai dar: um desconcerto nacional em que o ascensor social, que a Escola pode ser, pára uma vez mais. Explicitando a metáfora: Crato mandava os que chumbavam aprender uma profissão aos dez anos; Costa nivela por baixo e reserva “as aprendizagens essenciais”, que ninguém sabe o que são nem como se definem, para os que já chegam à Escola oprimidos pela sorte madrasta de terem nascido em meios desfavorecidos. Definitivamente, só há um caminho, que não importou a Crato e menos importa a João Costa: encontrar um currículo e programas correspondentes equilibrados e adequados à maturidade e desenvolvimento dos alunos e acompanhá-los, sem diminuições de exigência e rigor, com reforço de meios e recursos logo que evidenciem as primeiras dificuldades. A inovação pedagógica do aprender menos não remove o insucesso. Mascara-o. Os experimentalismos que partem do abaixamento da fasquia não puxam pelos que ficam para trás. Afundam-nos. O escrutínio sério das políticas educativas das últimas décadas, que só um pensamento crítico livre de contaminações ideológicas permite, demonstra-o.
É importante que cada professor saiba bem de que lado quer estar nesta dialéctica.