Gestão do Montepio pressionada a divulgar correcção às contas
O Conselho Geral e de Supervisão da Caixa Económica quer que a gestão do banco informe o mercado da correcção que foi obrigada a fazer às suas contas devido ao negócio que envolve as minas de Aljustrel. Banco de Portugal já sabe desta recomendação.
O Conselho Geral e de Supervisão da Caixa Económica Montepio Geral deu instruções à comissão executiva liderada por José Félix Morgado para rectificar os números do terceiro trimestre de 2016, em que divulgou lucros de 144 mil euros, mas deveria ter registado prejuízos de 23,856 milhões de euros. E pediu também, a bem da transparência, que o banco informasse o mercado dessa correcção, mesmo se as contas do ano passado, entretanto divulgadas, já reflictam a realidade.
Na sequência do parecer do auditor KPMG e da análise feita pela Comissão para as Matérias Financeiras que acompanha os procedimentos internos, o Conselho Geral e de Supervisão (CGS) do banco Montepio decidiu solicitar à gestão que revisse as contas do terceiro trimestre de 2016, de modo a ficarem conforme à “materialidade” dos factos. E, por factos, o órgão de fiscalização interno referia-se à anulação do movimento financeiro que em Setembro de 2016 gerou lucros artificiais de 24,1 milhões de euros e envolveu a venda de 19% na I’m Mining [minas de Aljustrel] à Vogais Dinâmicas, sociedade constituída pelo banco, a 29 de Setembro de 2016, ou seja, dois dias antes do fecho do balanço do terceiro trimestre (31 de Setembro). O pedido de correcção das contas consta da acta da reunião do CGS de 1 de Março de 2017, remetida, como sempre acontece, para o Banco de Portugal, e do relatório de actividade anual.
O processo de emenda dos números do terceiro trimestre do ano passado foi desencadeado a 29 de Novembro quando, ao tomar conhecimento do negócio, o CGS veio a pedir a sua anulação, o que levou a uma troca de informações devidamente documentada entre a gestão da instituição financeira, os órgãos de fiscalização internos e o Banco de Portugal. E que culminou, já em 2017, com outra reunião importante. Em Fevereiro, o CGS deliberou que, uma vez que as contas do terceiro trimestre tinham sido divulgadas ao mercado [a 7 de Novembro de 2016] com lucros de 144 mil euros, e que afinal não se verificaram, então a gestão deveria tornar públicos os valores finais, pós correcção. É que, sem a mais-valia de 24,1 milhões, a CEMG, entre Julho e Setembro, apurou prejuízos de 23,856 milhões de euros. Até ao fecho da edição desta quarta-feira, o esclarecimento ainda não se verificara.
Um pedido que o CGS decidiu tomar a bem da transparência, mas que é apenas uma formalidade, pois as contas de 2016 do banco Montepio reflectem toda a realidade. O que foi aliás garantido ao PÚBLICO por Luís Guimarães, que está à frente da Comissão para as Matérias Financeiras e integra o CGS, que é presidido por Álvaro Pinto Correia, e onde estão mais sete elementos: Eugénio Rosa, António Meneses Rodrigues, José Arez Romão, Francisco Fonseca da Silva, Vítor Carmo Martins, Acácio Mota Piloto e Rui Matos Heitor
Este mês, a CEMG apresentou as suas contas de 2016 com um prejuízo de 86,5 milhões de euros, ainda assim uma melhoria face aos 243 milhões negativos apurados em 2015. O presidente José Félix Morgado já veio dizer que esperava regressar, em 2017, aos lucros.
Os números finais vão ser submetidos à Assembleia-Geral do banco, de 25 Maio, que será chamada a pronunciar-se sobre mais um ponto: “Proceder à apreciação geral da Administração e Fiscalização da Caixa Económica Montepio Geral.” O que se traduz num pedido de apoio à equipa de Félix Morgado, a conceder pelo accionista, a Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG), chefiada por Tomás Correia.
A iniciativa surge num contexto de crispação interna, que ganhou força depois de o Expresso divulgar o negócio entre a empresa das minas de Aljustrel e a Vogais Dinâmicas e que, segundo o semanário, visou permitir ao banco “‘maquilhar’ de forma criativa as contas e apresentar resultados trimestrais positivos [144 mil euros]”, beneficiando da mais valia “fabricada” de 24,1 milhões de euros.
De acordo com o Expresso o contrato que o CGS acabaria por anular pretendia que a Vogais Dinâmicas assumisse 59% da I’m Mining, ficando os restantes 41% nas mãos de Humberto Costa Leite, o antigo presidente do Finibanco (instituição adquirida em 2010 pela CEMG por 341 milhões de euros). E previa ainda que a CEMG financiasse a Vogais Dinâmicas para adquirir aos irmãos Martins 40% das minas, e para estes liquidarem os seus empréstimos caucionados por acções do Santander e do Novo Banco. As minas estavam valorizadas em 492 milhões de euros.
Inquirido sobre esta transacção, Luís Guimarães considerou-a um simples “erro técnico” que a gestão de Félix Morgado corrigiu “imediatamente ao ser alertada”. Disse ainda que o CGS procedeu a “uma reavaliação das minas que apontou para 480 milhões, um valor inferior ao que serviu de base ao negócio”. E avançou que dessa análise resultou “uma reavaliação da Situação Líquida do banco em menos cinco milhões de euros”. O Banco de Portugal não fez quaisquer comentários sobre este assunto.