Catarina e Jerónimo não vão desistir da renegociação da dívida
Em Almada, Catarina Martins disse que o Bloco continuará a lutar pela reestruturação da dívida. Já Jerónimo de Sousa, em Coimbra, reiterou que a proposta do PS e do BE “fica aquém do necessário”.
A coordenadora do Bloco do Esquerda (BE) afirmou hoje que o relatório sobre a sustentabilidade da dívida, apesar de não ser o proposto pelos bloquistas, apresenta soluções que permitem libertar recursos para o Orçamento do Estado de 2018.
“Este documento é muito importante, porque apresenta soluções que, não sendo a reestruturação da dívida que o Bloco quer fazer e pela qual continuará a lutar, são soluções que, no imediato, permitem libertar já recursos para que o próximo Orçamento do Estado possa cumprir as posições conjuntas para acabar com o empobrecimento do nosso país. Não é coisa pouca”, disse Catarina Martins na apresentação da candidatura de Joana Mortágua à Câmara de Almada.
O relatório, apresentado na sexta-feira e elaborado por um grupo de trabalho formado pelo PS, BE, Governo e economistas, propõe a reestruturação da dívida pública portuguesa em 31%, para 91,7% do Produto Interno Bruto (PIB), e pede ao Governo "cenários concretos" de reestruturação para serem utilizados em discussões europeias.
Catarina Martins assume que “não é, seguramente, a proposta” do BE, que continuará a ser “a da reestruturação da dívida que permita libertar recursos para o investimento e para o emprego”, mas sublinha tratar-se de um relatório que foi possível concluir “com forças [políticas] e pensamentos diferentes”, destacando “três pontos extraordinariamente importantes”.
“O primeiro é que, pela primeira vez, há um documento oficial no nosso país de consenso, de convergência, trabalhado, detalhado. Pela primeira vez, temos um estudo feito ao mais alto nível que aponta as causas da dívida pública e que diz preto no branco que não foi o país que andou a viver acima das possibilidades, foi a finança que nos andou a roubar possibilidades”, vincou a líder do BE.
Para Catarina Martins, o relatório sustenta a posição já defendida pelo seu partido de que “o problema é o Tratado Orçamental” e que as metas inscritas “não são impossíveis porque os Governos não o querem, são impossíveis porque são economicamente absurdas e socialmente impossíveis”. O facto de este relatório apontar soluções que permitem libertar recursos, foi o segundo ponto destacado pela bloquista durante o discurso, e que pôs a "direita nervosa".
“A direita ficou logo muito nervosa quando viu que o relatório tinha soluções para que houvesse mais recursos no próximo Orçamento do Estado. Passos Coelho veio logo dizer que estávamos a atacar o Banco de Portugal. Esqueceu-se de dizer que o Banco de Portugal faz uma gestão dos seus recursos diferente da maior parte dos bancos centrais do resto da Europa, e que é um dos poucos bancos centrais da Europa que faz uma gestão de recursos contra as contas públicas do seu próprio país, em vez de ser para as ajudar”, respondeu Catarina Martins.
O presidente do PSD, Pedro Passos Coelho, acusou o Governo de querer "deitar a mão" às reservas de dinheiro do Banco de Portugal (BdP) como "medida extraordinária" para "ajudar a compor os números do défice".
A coordenadora do BE diz que “não tem nada contra” o BdP, mas sim “contra as suas políticas erradas”, reiterando que é possível, com as medidas deste grupo de trabalho, libertar recursos para o Orçamento do Estado de 2018.
“E o enorme desafio agora é que o Governo leia o relatório, em que também trabalhou, mas sobretudo que retire as consequências, que aplique as medidas para podermos ter um Orçamento do Estado em 2018 que possa responder à posição conjunta que assinamos”, desafiou Catarina Martins.
A terceira ideia enunciada pela coordenadora do BE é que Portugal possa propor à Europa uma alteração de como pagar a dívida, reconhecendo, contudo, que “não têm vindo da Comissão Europeia” nem do Governo alemão “qualquer abertura para este tipo de caminhos”.
“No Bloco de Esquerda não ficaremos sentados à espera do que venha decidir a União Europeia. Mas a proposta está feita, está estudada e é um teste significativo, tanto à vontade do Governo português de colocar os problemas que contam em cima da mesa na Europa, como de qual é a natureza da União Europeia em que estamos”, avisou Catarina Martins
Aquém do necessário
Do lado do PCP, Jerónimo de Sousa defendeu “uma efectiva renegociação” da dívida pública, reiterando que a proposta do PS e do BE “fica aquém do necessário”. Da parte de Portugal, segundo Jerónimo de Sousa, importa que o Governo assuma o “enfrentamento dos interesses e objetivos da União Europeia e de todos quantos especulam” com a dívida pública nacional.
“Sem prejuízo da concretização de micro soluções como aquelas que PS e BE avançam – manifestamente insuficientes e limitadas – o que se impõe é uma efetiva renegociação que assegure a redução do montante da dívida e do volume do serviço da dívida”, disse, em Coimbra, num almoço de militantes e simpatizantes em que foram apresentados os primeiros candidatos da CDU à Câmara e Assembleia Municipal locais.
O serviço da dívida “consome hoje 8.000 milhões de euros”, que são “retirados à resposta aos problemas nacionais, designadamente ao investimento”, sendo preciso baixar o montante da dívida “em termos sustentáveis e compatíveis com o desenvolvimento e as necessidades do país”, preconizou o líder comunista.
Importa, na sua opinião, promover “uma política em rutura com as receitas e caminhos que afundaram o país” e que afirme, também, a sua soberania “e o liberte dos constrangimentos internos e externos que sufocam e bloqueiam o seu desenvolvimento, desde logo a renegociação da dívida, mas também das imposições” da UE e do euro.
Por isso, o PCP tem vindo a propor “uma renegociação da dívida nos seus montantes, prazos e juros como condição indispensável ao desenvolvimento soberano” de Portugal.
“Não é o caso da proposta avançada por PS e BE. Ela corresponde no fundamental às posições conhecidas do PS: uma resposta circunscrita a medidas de gestão corrente da dívida direta do Estado e outras dependentes na sua concretização das decisões da União Europeia”, afirmou o secretário-geral do PCP, reafirmando a necessidade de “outra política ao serviço do povo” e do país.
Criticando o Programa de Estabilidade e o Programa Nacional de Reformas “que o Governo minoritário do PS agora aprovou”, disse ser importante não omitir “os avanços conseguidos e valorizá-los”.
“Mas não se pode deixar de constatar a existência de contradições e limitações decorrentes das opções políticas do Governo PS”, as quais “têm reflexos cada vez mais evidentes nas decisões que se impunham para dar novos e mais decididos passos na reposição de direitos e rendimentos dos trabalhadores e das populações e para a concretização de novos avanços na solução dos problemas nacionais”, sublinhou Jerónimo de Sousa.
Os primeiros candidatos da CDU aos órgãos municipais de Coimbra, nas autárquicas de 1 de Outubro, são o atual vereador e professor Francisco Queirós e o deputado municipal Manuel Rocha, diretor do Conservatório de Música de Coimbra, respetivamente, que também intervieram na sessão.