O maior comentador português falou e disse
Porque é que Pedro Marques Lopes mente, então? Sejamos generosos: talvez não tenha mentido. Ele às vezes simplesmente não sabe.
Houve duas pessoas inteligentes que responderam aos meus textos da semana passada sobre a justiça, a comunicação social e Dias Loureiro. Ainda que fazendo algum esforço para fingirem que não perceberam aquilo que escrevi, Miguel Sousa Tavares e Pedro Adão e Silva levantaram objecções que merecem ser desmontadas, ainda que no essencial a minha argumentação já tenha sido exposta por Nuno Garoupa em dois bons artigos no DN sobre o tema da corrupção. Fica prometido que voltarei ao assunto em breve. Por hoje, não resisto — fraqueza minha — a comentar o texto que Pedro Marques Lopes me dedicou no DN de domingo, e que resolveu intitular de “O tavarismo”, o que tendo em conta a profusão de Tavares na imprensa portuguesa é capaz de ser pouco rigoroso. Mas o rigor, como se verá, não é coisa que se costume intrometer entre ele e os seus comentários.
Marques Lopes é colunista de A Bola às sextas de manhã, comentador do “Bloco Central” às sextas à tarde, comentador do “Eixo do Mal” aos sábados, colunista do DN aos domingos, comentador desportivo na Bola TV às segundas-feiras, cronista da Epicur de vez em quando e comentador político da SIC e da TSF a tempo inteiro. É possível que me tenha falhado alguma coisa. Como é fisicamente impossível estar informado acerca de todos os assuntos sobre os quais debita opinião, ele desenvolveu uma técnica notável (sem ironias) que consiste em proferir as maiores banalidades com a alegria de quem acabou de descobrir a fissão do átomo, e em discorrer sobre o que quer que seja, do sistema táctico do FC Porto às imparidades da banca nacional, sempre com a mesma entoação, a mesma convicção, as mesmas bengalas discursivas, os mesmos apartes e a mesma empáfia. Como se pode ver pela sua extraordinária carreira de vendedor de opiniões em segunda mão, a estratégia resulta.
Mas só a maior parte das vezes. Peguemos em “O tavarismo”. A certa altura, para provar que o meu atrevimento é muito selectivo e que sou incapaz de criticar quem me alimenta, Pedro Marques Lopes resolveu acusar-me de nunca na vida me ter pronunciado sobre a “qualidade das perguntas que os jornalistas da TVI fizeram a Sócrates nas várias entrevistas que este deu ao canal”. “Estranhamente”, escreve ele, “nunca se ouviu a JMT um comentário sobre o assunto, nem em crónicas nem naquele programa da TSF em que participa e que por acaso passa na mesma TVI”. Nada estranhamente, escrevo eu, Pedro Marques Lopes não faz a menor ideia do que está a falar. Nem “um comentário”? A sério? Bastar-lhe-ia googlar durante 20 segundos: abordei o tema tanto no PÚBLICO (“Sócrates e os jornalistas”, 28 de Abril de 2016) como na TVI (há até um clip no YouTube chamado “João Miguel Tavares critica José Alberto Carvalho”, de Dezembro de 2015).
Porque é que Pedro Marques Lopes mente, então? Sejamos generosos: talvez não tenha mentido. Ele às vezes simplesmente não sabe. Outras vez não percebe. Por exemplo, Marques Lopes também me acusou de eu ter insinuado que foi Daniel Proença de Carvalho quem lhe mandou escrever o texto sobre Dias Loureiro. Mais uma vez, está errado. Eu não insinuei que Proença de Carvalho mandou — o que eu insinuei é que Proença de Carvalho nem sequer precisa mandar. Marques Lopes é naturalmente deferente para com os amigos e naturalmente desagradável para com os ex-amigos. Foi assim que se transformou no mais prolífico e prolixo comentador da república portuguesa, e em estratégia que ganha não se mexe.