Os "parasitas sociais" estão a pôr Lukashenko em xeque
Há mais de um mês que os bielorrussos enchem o centro de várias cidades em protesto contra a queda das condições de vida. O que começou como a oposição a uma lei está a transformar-se num perigo para o regime.
A Bielorrússia tem sido palco nas últimas semanas de manifestações em várias cidades contra um impopular imposto destinado à população desempregada. Perante a subida da tensão, o Governo do Presidente Aleksander Lukashenko ordenou a detenção de centenas de pessoas durante o fim-de-semana.
Conhecida como “a última ditadura na Europa”, a Bielorrússia é um dos países mais improváveis para se assistir a uma acção contra o regime liderado de forma autoritária por Lukashenko há 23 anos. Mas desde Fevereiro que tem havido invulgares níveis de contestação no centro de várias cidades.
No sábado, a polícia fez centenas de detenções, incluindo o dirigente da oposição e ex-candidato presidencial, Uladzimir Niakliaeu, e pelo menos dez jornalistas, segundo a Reuters. Os activistas e manifestantes estavam a assinalar o Dia da Liberdade, que marca o aniversário da fundação da República Popular da Bielorrússia, a 25 de Março de 1918 – uma festividade não reconhecida pelo Governo. A sede do Vesna-96, um grupo da oposição, foi também alvo de uma rusga policial, durante a qual foram detidas 60 pessoas, acrescenta a Reuters.
Em causa está a introdução de um imposto, apelidado pela imprensa de “lei contra os parasitas sociais”, aplicado aos cidadãos que trabalhem menos de 180 horas anuais. Os opositores da medida encaram-na como uma penalização dirigida aos desempregados e às pessoas sem trabalho a tempo inteiro. A taxa de desemprego oficial é inferior a 1%, mas a generalidade dos observadores nota que os níveis reais são bastante superiores – variando entre os 5% e os 7%. Os próprios números do Governo apontam para a existência de cerca de 400 mil pessoas sem registo de emprego.
Perante a pressão das ruas, no início do mês, Lukashenko recuou na aplicação da medida, suspendendo-a durante um ano, mas a contestação não se apagou. Milhares de pessoas continuaram a encher o centro de cidades como Brest ou Homel, para além de Minsk. Ao contrário de manifestações anteriores contra o regime, desta vez os protestos não se cingiram à capital – um sinal claro de que o descontentamento dos bielorrussos é generalizado.
Há dois anos que o país vive mergulhado numa recessão económica que tem feito cair as condições de vida da população. A Bielorrússia é altamente dependente do apoio financeiro da Rússia, materializado sobretudo através de grandes descontos na compra de petróleo e gás natural. É também para o mercado russo que vai o grosso das exportações bielorrussas, especialmente produtos agrícolas.
A crise económica da Rússia nos últimos anos – originada pela queda acentuada do preço do petróleo – reflectiu-se na capacidade de Moscovo em apoiar o país vizinho. Além disso, as relações entre os dois países atravessam um momento tenso. Há vários anos que Moscovo tem pressionado as autoridades bielorrussas para autorizarem a construção de uma base aérea no seu território, algo que Minsk se tem recusado repetidamente a fazer. Os dois países – que pertencem à mesma união aduaneira, conhecida como União Euroasiática – também se têm envolvido em pequenas guerras comerciais.
Lukashenko tem apostado num equilíbrio diplomático entre Moscovo e Bruxelas. No ano passado, as autoridades bielorrussas libertaram vários presos políticos, permitindo que a União Europeia removesse parte das sanções que tinha aplicado ao país. Para já, é incerto que impacto é que a mais recente onda de protestos e repressão terá sobre as relações entre Minsk e Bruxelas.