Deputados com dúvidas sobre pertinência de nova lei do tabaco
Sem regulação, "qualquer criança pode andar a fumar tabaco aquecido nas escolas", avisa Emília Nunes, da Direcção-Geral da Saúde
A proposta de lei do Governo para alterar a lei do tabaco arrisca-se a ser chumbada pelo Parlamento, a avaliar pelas dúvidas sobre a sua pertinência levantadas pelos deputados das várias bancadas no grupo de trabalho.
O grupo terminou nesta quinta-feira a fase de audições e deverá concluir os trabalhos até 19 de Abril, após o que o projecto de lei pode voltar ao plenário para ser votado, podendo nem ser discutido. A principal questão que tem suscitado dúvidas aos deputados prende-se com os novos produtos de tabaco e a possibilidade de minimizarem riscos, como a indústria apregoa.
Os deputados alertam para o que chamaram "o princípio da precaução", que consiste em não estar a eliminar já produtos que podem ser menos nocivos para a saúde e que podem ter um papel importante para as pessoas que não querem ou não conseguem deixar de fumar.
A Direcção-Geral da Saúde (DGS) contrapõe que é preciso regular esses novos produtos e que agora, por falta dessa regulação, "qualquer criança pode andar a fumar tabaco aquecido nas escolas", disse Emília Martins Nunes, directora do Programa Nacional para a Prevenção e Controlo do Tabagismo.
Em Outubro passado, o Governo submeteu à Assembleia da República uma proposta de uma nova lei do tabaco, que está a ser analisada num grupo de trabalho criado na Comissão Parlamentar de Saúde. No essencial a proposta proíbe que se fume a menos de cinco metros de hospitais, escolas e outros estabelecimentos, e equipara os dispositivos electrónicos (como cigarros electrónicos ou tabaco aquecido) aos cigarros tradicionais.
É esta última questão que levanta mais dúvidas aos diversos grupos parlamentares, ainda que Emília Nunes tenha dito que a proposta de lei "está razoável e tem base científica".
Desconhecimento dos efeitos a longo prazo
Está a ser promovido pela indústria um novo produto de tabaco como sendo menos danoso mas há, "inclusivamente por parte do fabricante, grande desconhecimento dos efeitos a longo prazo", disse a responsável da DGS, salientando a falta de "comprovação científica consolidada" sobre o risco reduzido dos novos cigarros.
A responsável salientou que a indústria do tabaco vem desde 1950 desenvolvendo a argumentação de redução de danos mas o que se provou foi que não diminuíram os malefícios dos cigarros, e disse aos deputados que a "composição química " dos novos produtos não é muito clara e estes podem levar "à percepção da população de que o produto não tem risco nenhum".
A estas questões de Emília Martins responderam os deputados com dúvidas sobre se não seria preferível então não mexer na lei para já, como disse a deputada social-democrata Fátima Ramos. E Alexandre Quintanilha, do PS, questionou mesmo até que ponto se está a construir uma sociedade em que o prazer (álcool ou tabaco) é controlado.
Pelo CDS/PP a deputada Teresa Caeiro questionou também se não será extemporânea uma nova lei do tabaco e o PCP (João Ramos) deixou dúvidas sobre os estudos (para todos os gostos) e sobre a equiparação entre produtos electrónicos e cigarros tradicionais.
"Há necessidade absoluta de a lei [do tabaco] ser alterada? Se não há ainda argumentos científicos [sobre novos produtos] suficientes porque é que vamos desde já alterar e proibir?", questionou a também socialista Maria Antónia Almeida Santos.
Respondeu a responsável da DGS que sem legislação qualquer criança pode fumar tabaco aquecido e que se for provado que esses cigarros são menos nocivos a própria DGS os aconselhará aos fumadores. "Penso que é oportuno legislar agora", disse Emília Nunes.