O homem que foi presidente
Desconexo mesmo que honesto, Zeus é um daqueles trabalhos de amor que esbarra na ausência de uma mão segura para o levar a bom porto.
Supostamente, Zeus é uma biografia de Manuel Teixeira Gomes (1860-1941), o escritor e diplomata que foi presidente de Portugal entre 1923 e 1925 antes de abdicar do cargo e partir para um exílio auto-imposto na Argélia, onde viria a morrer. Dizemos “supostamente”, porque é isso que o filme que Paulo Filipe Monteiro lhe dedica quer ser; mas tem todas as marcas de um labour of love, e quer ser tanta coisa ao mesmo tempo que acaba por nunca ser nenhuma. É um filme escrito, mais do que filmado; uma tentativa de ilustrar um guião claramente trabalhado, onde se sente a sofreguidão de alguém que tem finalmente a oportunidade de fazer o filme que quis, mas que não teve mão segura o suficiente para o levar a bom porto.
Concentrado no período entre 1923, quando Teixeira Gomes sobe à presidência, e a sua morte no exílio em 1941, recusa a cronologia linear dos factos para procurar traçar um retrato de uma figura que se sentia espartilhada na pequenez do seu país e optou pela liberdade do viajante. É uma ambição intrigante, mas no final de contas falhada; Monteiro nunca consegue estabelecer um “centro de gravidade” para a sua estreia na longa-metragem, após longos anos como argumentista (para João Mário Grilo ou Fernando Lopes).
O melhor exemplo dessa incapacidade de encontrar um centro, é a inclusão como trama paralela de Maria Adelaide, uma novela proibida que Teixeira Gomes escreveu na Argélia, suposta ser uma ilustração da obra do escritor mas que rapidamente se revela simples excrescência. O pitoresco rural desta trama paralela nunca encaixa no resto do filme, nunca justifica o porquê da sua inclusão, tomba na banalidade de audiovisual televisivo turístico a que Zeus se procura desesperadamente esquivar (sem o conseguir por inteiro), e torna-se no símbolo de um filme fragmentado, desperdiçado.