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Uma visita da Europa ao teatro português

Até domingo, o Teatro Nacional São João, no Porto, continua a mostrar a uma comitiva internacional o que se anda a fazer no teatro contemporâneo português, à boleia da assembleia geral da União de Teatros da Europa.

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O Teatro Nacional de São João é o único parceiro português da União de Teatros da Europa Nelson Garrido
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paulo pimenta

O Teatro Nacional São João (TNSJ) está com amigos estrangeiros em casa até domingo. Acolhe, pela terceira vez, a assembleia geral da União de Teatros da Europa (UTE), com um programa que integra mesas-redondas e um showcase de teatro nacional.

O TNSJ é o único parceiro português da UTE, associação em que entrou em 2003 e que foi criada em 1990 por Giorgio Strehler, co-fundador do Teatro Piccolo, de Milão, e Jack Lang, à época o ministro da Cultura francês. Actualmente reúne mais de 40 membros – como o Teatro di Roma, Teatro Nacional da Grécia, Teatro Nacional de Praga ou o Teatro Sfumato, da Bulgária, entre artistas e estruturas associadas –, numa aliança que já ultrapassou as arestas do continente europeu, com representação em Israel e na Palestina.

Para Francisca Carneiro Fernandes, presidente do conselho de administração do TNSJ e membro do conselho de administração da UTE, “o associativismo traz sempre vantagens”, sobretudo “o saber estar com pessoas que pensam e fazem diferente”. A UTE funciona “não só mas também” como uma rede de circulação e de conhecimento de espectáculos e formas de trabalhar — e este encontro no Porto é uma ocasião para trazer uma comitiva internacional a “uma ponta da Europa” que faz sucesso nos tops de turismo, mas que ainda está na periferia do mapa teatral europeu.

“Há duas assembleias gerais por ano e cada uma é numa cidade diferente. Os membros vêm agora conhecer o TNSJ e o teatro português — não quisemos mostrar só o que nós fazemos”, explica Francisca Carneiro Fernandes. Além da produção do TNSJ, Os Últimos Dias da Humanidade, o director artístico Nuno Carinhas recrutou para este showcase as companhias Teatro da Rainha, com Pensa, logo Sangra; O Lince Viaja, com Neva; Ao Cabo Teatro, com Subterrâneo; e o Teatro Experimental do Porto, com What a Rogue Am I! no Rivoli.

Um conjunto de espectáculos com pertinência política, indo ao encontro da própria postura da UTE, que no seu calendário de actividades procura reflectir sobre as turbulências sociais na Europa e no Mediterrâneo e os seus pontos de tensão. Tem em curso o projecto Zonas de Conflito, em que se olha para as crises do presente e do passado através da I Guerra e no qual está inserido Os Últimos Dias da Humanidade. Contudo, este espectáculo não teve financiamento externo da UTE. Não há apoios directos: a UTE — que “vive essencialmente” das quotas dos seus associados — funciona “por projectos” que beneficiam de fundos europeus para ajudar a erguer diferentes programas, esclarece a presidente do conselho de administração do TNSJ. No âmbito do Zonas de Conflito, o TNSJ recebeu em Maio uma residência artística da ISO, companhia de jovens autores nascida no berço da União, e a mesa-redonda desta sexta-feira, que contou com o economista checo Tomáš Sedlácek, autor do best-seller A Economia do Bem e do Mal.

Apesar de estar nesta rede europeia, actualmente a programação internacional do TNSJ é residual. Para o São João, a UTE não é sinónimo de mais espectáculos internacionais nem mais circulação lá fora, nota Francisca Carneiro Fernandes. Isso depende do orçamento do próprio teatro, assegurado pelo Estado português. “Para isso é preciso ter capacidade financeira. [O TNSJ] deve ser dos teatros-membros com menos financiamento, mas isso é a realidade do nosso país.” Inicialmente, a adesão à UTE ajudou a intensificar a internacionalização do TNSJ, com iniciativas como o Portogofone e a apresentação em palcos europeus de produções próprias, mas os cortes orçamentais vieram refrear esse processo.

“Em 2012 tivemos um corte de um milhão e 200 mil euros, e já estávamos com o mesmo financiamento que o TNSJ tinha sozinho, apesar de termos abarcado a gestão do Teatro Carlos Alberto e do Mosteiro S. Bento da Vitória”, diz a dirigente. Ainda assim, há coisas a acontecer: Neva, co-produção do TNSJ e de O Lince Viaja, chega no final deste mês ao Teatro Nacional do Luxemburgo, membro da União.

A UTE é também uma forma de ver e de se ser visto, mas Francisca Carneiro Fernandes não se revê “na visão mais oportunista do associativismo”, na lógica do compra e vende. “É uma combinação de factores”, diz, que no terreno da UTE podem incluir o intercâmbio na formação de jovens artistas através da academia descentralizada (daqui a uns dias, Luís Araújo e Tiago Pinhal Costa embarcam para uma masterclass num teatro em Rostov-On-Don, na Rússia) ou o contacto com “outras realidades”, como ver teatro underground romeno em garagens e bares. “Há sempre algo a aprender.”

Oito horas de guerra

Este sábado é dia de maratona no Teatro Nacional São João. Mais precisamente da corrida de fundo de oito horas que é a apresentação integral da encenação de Nuno Carinhas e Nuno M Cardoso para Os Últimos Dias da Humanidade (1915-1922), obra monumental e brutalmente actual do austríaco Karl Kraus sobre a I Guerra Mundial e consequentes hemorragias. Esta sessão especial reúne os três capítulos do espectáculo, com um elenco de 21 actores que se desmultiplicam em quase 200 personagens. Das 15h às 23h45, com dois intervalos.

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