"A prioridade deve ser a prevenção da infertilidade"
Teresa Almeida Santos, presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina de Reprodução, acredita que cada vez mais mulheres vão recorrer à congelação de óvulos para adiar a maternidade, mas defende que a prioridade do Estado deve ser prevenir e tratar a infertilidade
O cenário em Portugal quanto à congelação de ovócitos por “motivos sociais” é diferente do que se verifica noutros países?
Portugal tem uma realidade próxima da de outros países europeus no que concerne à criopreservação de ovócitos em doentes oncológicas, mas a congelação destas células por motivos pessoais ou sociais, isto é, para adiar voluntariamente a maternidade, não assume ainda as proporções de outros países, nomeadamente de Espanha. De realçar que as práticas são muito diferentes. Por exemplo, a Bélgica e o Reino Unido autorizam esta prática, mas em França tal ainda não foi legalizado.
A procura tende a aumentar?
Creio que sim, estando a técnica disponível e correspondendo ao desejo de adiar a maternidade que se tem vindo a verificar de forma consistente, acredito que mais mulheres vão recorrer a esta possibilidade para acautelarem a possibilidade de uma gravidez numa idade mais tardia. Deve realçar-se que esta prática tem riscos, nomeadamente o de poder dar uma falsa ideia de segurança de uma gravidez tardia.
Exceptuadas as razões de saúde, que mulheres recorrem à congelação de ovócitos e por que motivos?
Ao que tenho conhecimento, recorrem a esta prática as mulheres sem parceiro que desejam ter filhos mas que receiam não encontrar o companheiro ideal em tempo útil, isto é enquanto a sua fertilidade não sofre o declínio inexorável associado à progressão da idade. Também parece ser uma técnica procurada por aquelas mulheres que, por razões profissionais, se vêm impelidas a escolher entre a carreira e a gravidez, adiando esta última.
As mulheres, que tendem a ter os filhos em idades cada vez mais tardias, deviam ser incentivadas a congelar os seus óvulos?
Não, de forma nenhuma. Antes pelo contrário, deve esclarecer-se que não é desejável adiar a gravidez para depois dos 38 anos pelo acréscimo de risco da gravidez em idades avançadas. As gestações que ocorrem em mulheres mais velhas têm um risco acrescido de hipertensão, diabetes, atraso de crescimento fetal, prematuridade…
O Estado devia financiar esta prática, à semelhança do que acontece no congelamento por motivos de saúde?
Não creio, a prioridade deve ser a prevenção da infertilidade e o esclarecimento dos jovens sobre comportamentos de risco para a fertilidade futura. Devemos esclarecer as mulheres e promover o aconselhamento individual em termos de fertilidade àquelas que o desejarem. Não podemos dizer a uma mulher que vai poder esperar mais x anos, mas é possível detectar algumas situações em que a fertilidade poderá estar acentuadamente reduzida, mesmo em idades em que tal não seria de esperar, por exemplo por envelhecimento ovárico prematuro (de causa genética, associado ao consumo de tabaco, a patologia ovárica…).