Importações chinesas de burros causam mal-estar em África
Enorme procura chinesa por peles de burro para fabricar suplemento alimentar já levou o Níger e o Burkina Faso a proibir as exportações destes animais
É um dos “três tesouros” da medicina tradicional chinesa, ao lado do ginseng e do chifre de veado, mas é também uma ameaça a pairar sobre as populações de burros de muitos países, em particular dos africanos. Chama-se ejiao e consiste numa espécie de gelatina feita a partir da pele dos asnos. Das constipações à insónia, da anemia às tonturas, há pouca coisa que o ejiao não cure. É um produto caro, mas com procura crescente, num país onde cada vez mais pessoas têm maior poder de compra e onde, como escreve a BBC, “a saúde e a longevidade são uma obsessão nacional”. Assim se compreende que os burros chineses não cheguem para as encomendas.
Na década de 1990, a população asinina chinesa andava próxima dos 11 milhões, mas actualmente ronda os seis milhões, com um ritmo de queda de 300 mil animais por ano, segundo dados oficiais citados pelo jornal chinês National Business Daily. Enquanto isso, e de acordo com a agência noticiosa chinesa Xinhua, que cita números da associação de produtores de ejiao da província de Shandong, o país fabrica anualmente cinco mil toneladas deste produto, necessitando de quatro milhões de peles para satisfazer o ritmo de produção, quando a oferta chinesa não vai além de 1,8 milhões de peles.
Embora seja dado como adquirido que muito do ejiao no mercado é falsificado (feito a partir da pele de outros animais), a verdade é que as importações têm crescido nos últimos anos, com particular incidência junto dos países africanos, onde o preço do burro disparou em flecha, em consequência da procura chinesa.
Enquanto países como o Quénia estão a adaptar as suas infra-estruturas para fazer face à procura chinesa (em Abril foi inaugurado um matadouro em Baringo County com capacidade para abater 100 animais por dia, segundo a imprensa local), outros estão a tomar medidas para prevenir o que dizem poder resultar no extermínio dos burros. É o caso do Burkina Faso e do Níger que baniram as exportações para o mercado chinês.
De acordo com a CNN, o Burkina Faso proibiu as exportações em Agosto, depois de 45 mil animais, de uma população total de 1,4 milhões, terem sido abatidos em seis meses. Já a BBC escreve que, no Níger, os números oficiais apontam para 80 mil burros vendidos até Agosto, em comparação com os 27 mil de 2015. “Se a exportação continuar, os animais serão dizimados”, disse este mês à BBC fonte governamental do Níger, que não só proibiu a exportação como o abate. Segundo a emissora britânica, um burro custa perto de 145 dólares neste país africano, quando antes o preço rondava os 34 dólares.
Este comércio tornou-se tão rentável que muitos produtores de gado abandonaram as outras espécies para se focar apenas nos burros. Em paralelo, o negócio de abate de animais também floresceu nestes países, muitas vezes à margem da lei.
Ainda assim, de acordo com o El País, que cita dados da Alfândega do Porto de Qingdao (um dos principais na China), as importações chinesas não se resumem a África. As entradas de pele de burro no país quase triplicaram entre 2013 e 2015, de 9,32 toneladas para 22,44 toneladas, tendo o México, o Perú e o Egipto como principais países de proveniência.