A reforma do Conselho de Segurança está no centro do debate
A ONU está a escolher um novo secretário-geral. Uma das suas grandes missões será a promoção de reformas no Conselho de Segurança.
O tema é quase tão antigo como a própria Organização das Nações Unidas (ONU). Aos 70 anos, o organismo que representa “os povos do mundo”, como estabelece o documento fundador, parece ter andado sempre à procura de novas formas de actuar e de se fazer eficaz, mas pouco mudou. O Conselho de Segurança, órgão máximo por ter a capacidade de fazer aprovar resoluções com carácter vinculativo, está no centro do debate. Por um lado, a sua composição reflecte uma ordem mundial desactualizada e, por outro, o poder de veto dos membros com assento permanente tem paralisado a sua acção.
“Quando o Conselho de Segurança falha, as Nações Unidas falham.” Esta foi a mensagem divulgada pelo grupo de “sábios”, que junta vários ex-líderes mundiais que tentam encontrar soluções para questões globais, a propósito da reforma do Conselho de Segurança. Neste grupo, a que chegou a pertencer Nelson Mandela, está o ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, um dos mais acérrimos defensores de mudanças na organização que liderou.
A guerra na Síria fez regressar o tema ao debate público e, numa altura em que a ONU se prepara para mudar de liderança, regressam as esperanças de que o Conselho de Segurança opere as alterações que muitos consideram indispensáveis.
É a própria composição do conselho que começa por gerar as primeiras críticas. Desde a sua fundação, em 1945, que apenas cinco países – EUA, Rússia (até 1991 União Soviética), França, Reino Unido e China – têm lugar permanente neste poderoso órgão e gozam do poder de veto de derrubar unilateralmente qualquer resolução. Estes lugares foram ocupados pelas potências vitoriosas da II Guerra Mundial, escolhidas por serem vistas como os garantes da estabilidade geopolítica mundial.
Mais de sete décadas depois, este arranjo é hoje considerado anacrónico. De fora do grupo restrito com maior poder no planeta estão países que assumem actualmente grande influência, como a Alemanha, o Brasil, a Índia ou o Japão, e que têm exigido uma voz coincidente com a sua importância.
“Acredito firmemente que o conselho deve ser reformado – não pode continuar como está”, dizia há mais de um ano Kofi Annan, numa entrevista ao The Guardian. Os secretários-gerais têm sido porta-vozes frequentes da necessidade de reformas, mas até os membros permanentes a reconhecem. O Presidente norte-americano, Barack Obama, chegou a defender publicamente a entrada da Índia como membro permanente.
Os entendimentos resumem-se, porém, à consciência de que é preciso uma reformulação do conselho. Que países devem entrar e que tipo de poderes podem exercer (veto ou não) são as incógnitas. A entrada do Brasil, por exemplo, é encarada com bons olhos por membros permanentes como a Rússia ou a França, mas encontra entraves entre outras nações do grupo latino-americano, como a Argentina ou o México, que disputam a liderança regional. Qualquer reforma do Conselho de Segurança requer o apoio dos cinco membros permanentes e de pelo menos dois terços dos 193 países da ONU.
A guerra na Síria que nos últimos seis anos fez mais de 500 mil mortos tem posto a nu outra das debilidades do Conselho de Segurança – o sistema de veto. Desde que o conflito começou, em Março de 2011, que a Rússia e a China vetaram quatro resoluções, com o objectivo de travar iniciativas que pudessem vir a responsabilizar o Presidente sírio, Bashar al-Assad, aliado de Moscovo. No Verão de 2012, Kofi Annan abandonou o cargo de mediador da ONU para a Síria, deixando fortes críticas ao ambiente de “apontar de dedos e de ofensas no Conselho de Segurança”.
O recurso ao poder de veto tornou-se durante a Guerra Fria uma das armas mais poderosas entre os dois blocos em confronto – e tornou praticamente impossível resolver de forma diplomática muitas das crises que surgiram. Ao todo, a União Soviética exerceu o poder de veto em 68 ocasiões – incluindo condenações às invasões da Hungria (1956) e da Checoslováquia (1968) – e os EUA usaram-no 61 vezes – com destaque para resoluções sobre a invasão a Granada de 1983 e ao apoio aos rebeldes da Nicarágua (1986). Com o fim da Guerra Fria, o padrão manteve-se, com Washington a recorrer a vetos sobre resoluções que envolvem o conflito israelo-palestiniano e a Rússia a actuar cada vez mais em aliança com a China.