Ramos-Horta avisa que escolha de secretário-geral pode tornar-se “uma farsa”

Antigo presidente de Timor diz que eleição na ONU está a ser desfeita por "acções de bastidores" e elogia António Guterres.

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O Nobel da Paz de 1996 diz que os países mais pequenos não querem limitar-se a "carimbar" as escolhas dos "grandes poderes" ENRIC VIVES-RUBIO

O antigo Presidente timorense José Ramos-Horta acredita que a eleição do próximo secretário-geral da ONU pode tornar-se "uma farsa" se a búlgara Kristalina Georgieva for escolhida.

"Um processo que começou com uma transparência muito bem-vinda corre agora o risco de se tornar uma farsa", disse Ramos-Horta num artigo publicado no Huffington Post.

O nome de Kristalina Georgieva, candidata que terá o apoio da chanceler alemã, Angela Merkel, foi anunciado na semana passada pelo primeiro-ministro búlgaro, depois de o Conselho de Segurança ter realizado cinco votações, todas ganhas por António Guterres.

A candidata apresentou esta segunda-feira a sua candidatura numa audição informal na sede da ONU em Nova Iorque.

No artigo em inglês, o timorense lembra as audiências públicas, entrevistas e debates em que os 12 candidatos iniciais participaram, respondendo a questões dos Estados-membros e de organizações da sociedade civil.

Este processo "está agora a ser desfeito por acções de bastidores que apenas pretendem servir os interesses de um ou dois membros do Conselho de Segurança acima dos interesses e opiniões de quase 200 Estados-membros", defende.

O responsável diz que "a entrada tardia" da vice-presidente da Comissão Europeia faz "chacota da transparência conseguida a muito custo" ao longo dos últimos meses.

Ramos Horta diz ainda que os membros permanentes "não devem ter a ilusão de que as práticas de uma era passada, em que decidiam e impunham soluções, ainda podem ser mantida nos dias de hoje."

Depois de recomendado pelo Conselho de Segurança, o nome do novo secretário-geral terá ainda de ser aprovado pela Assembleia Geral, em que todos os Estados-membros têm assento, e Ramos-Horta acredita que o organismo não será passivo.

"Os países membros estão a exigir ter palavra nesta eleição, e não vão mais carimbar apenas a decisão dos cinco membros" com direito de veto, diz. "Dois terços da comunidade mundial são países pequenos e de média dimensão que ressentem as táticas de bullying dos grandes poderes, que frequentemente impõem a sua agenda e visões ao resto do mundo", acrescentou.

O Nobel da Paz de 1996 fala também de António Guterres, que descreve como "um líder político brilhante e honesto, além de um eloquente comunicador."

Guterres "impressionou todos com o seu domínio sem paralelo dos complexos desafios sociais e de segurança internacionais que enfrentamos. Também nos impressionou com o seu conhecimento excepcional da sufocante máquina burocrática da ONU", acrescentou.

Ramos Horta lembrou ainda as anteriores votações, em que Guterres conseguiu "apoio decisivo", e diz que "até os mais fortes defensores de que uma mulher seja a próxima secretária-geral se renderam".

"Não é um conservador, um centrista ou um socialista. É uma pessoa altamente espiritual e, acima de tudo, um humanista. É claro para todos, com base nos seus méritos profissionais e qualidades humanas, que é o melhor candidato para substituir Ban Ki-moon", conclui.

A próxima votação, em que pela primeira vez serão destacados os vetos dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, está agendada para 5 de Outubro.