Conselho de Finanças Públicas critica Governo mas prevê défice próximo do exigido pela Europa
Entidade liderada por Teodora Cardoso prevê crescimento de 1% e défice de 2,6% este ano, sentenciando que “estratégia orçamental não funcionou”. Mas metas estão próximas do que é pedido por Bruxelas.
A economia portuguesa não deverá conseguir crescer mais do que 1% durante este ano, com o défice a ficar acima do previsto pelo Governo, mas abaixo dos 3% e próximo dos valores exigidos pelas autoridades europeias, prevê o Conselho das Finanças Públicas (CFP), num documento em que repete as críticas anteriormente feitas à estratégia económica seguida pelo Governo, defendendo que “a despesa pública não pode ser um motor do crescimento”.
No relatório publicado esta quinta-feira e em que analisa a situação económica e orçamental do país no período de 2016 a 2020, a entidade responsável pela fiscalização da política orçamental em Portugal reviu de forma acentuada as suas previsões de crescimento económico para o presente ano, mostrando-se agora bastante mais pessimista do que em Março, quando apresentou as suas últimas projecções. O CFP afirma que a evolução da economia portuguesa em 2016 tem vindo a confirmar os riscos por si assinalados e passou a estimativa de variação do PIB de 1,7% para 1%. No Orçamento do Estado (OE), a previsão de crescimento para 2016 estava situada em 1,8%, embora o Governo já tenha assumido que este é um valor que terá de ser revisto.
Em relação às metas orçamentais, o CFP também revela mais pessimismo nas suas previsões, mas neste caso de forma bastante mais ligeira. No relatório – em que realiza as suas estimativas com base num cenário de políticas inalteradas e apenas considerando as medidas que sejam vistas como suficientemente especificadas - é agora projectado um défice de 2,6% em 2016. Este valor fica acima dos 2,2% que são a meta definida pelo Governo, mas está bastante próximo dos 2,5% que são agora exigidos pelas autoridades europeias a Portugal.
O mesmo acontece no que diz respeito ao défice estrutural – que não inclui medidas extraordinárias e efeito da conjuntura económica – e que o CFP prevê que se venha a agravar em 0,1 pontos percentuais. É um resultado pior do que a melhoria de 0,3 pontos prevista pelo Governo, mas que mais uma vez fica próxima da estabilização deste indicador que é pedida pela Comissão Europeia e pelo Eurogrupo.
Esta proximidade entre as previsões do CFP e as exigências europeias é ainda mais relevante se se levar em conta que, nas suas contas, o conselho não considera para 2016, as medidas inscritas no OE como “poupanças sectoriais decorrentes da simplificação administrativa de processos”, com as quais o Governo esperava ganhar 316 milhões de euros, e como a “redução de gastos associados ao Programa Aproximar”, estimada em 70 milhões de euros, por estarem “ainda insuficientemente especificadas e não legisladas”. Estas duas medidas correspondem a um valor próximo de 0,2% do PIB.
Na conferência de imprensa de apresentação do relatório, a presidente do CFP desvalorizou esta proximidade entre as previsões agora feitas e os valores exigidos a nível europeu. “Esse não é o principal problema. O problema tem a ver com o crescimento da economia, e a falta de sustentabilidade disto”, disse Teodora Cardoso, assinalando que “o saldo estrutural não se deveria agravar, deveria melhorar”.
Os responsáveis do CFP não quiseram ainda deixar dúvidas em relação ao que pensam da estratégia seguida pelo Governo, voltando a criticar a ideia de que a economia possa voltar a crescer e o equilíbrio orçamental restabelecido com base num estímulo da procura interna. “A despesa pública não pode ser um motor do crescimento e pode mesmo tornar-se um factor de desconfiança”, disse Teodora Cardoso, deixando uma sentença: “Está bastante claro que a estratégia orçamental não funcionou. E a estratégia era que a procura interna iria fazer crescer a economia”.
A sustentar estas afirmações estão ainda as previsões económicas e orçamentais que o CFP faz para o período de 2017 a 2020 com base num cenário em que não seriam tomadas mais quaisquer medidas. A taxa de crescimento económico, apesar de poder acelerar ligeiramente, nunca passa dos 1,5%, projecta o CFP, que fala da manutenção de “um crescimento claramente insuficiente”, nomeadamente se se levar em conta a que se vive num cenário em que a política monetária é fortemente expansionista.
No que diz respeito ao défice, o CFP aponta não só para a ausência de melhorias no défice estrutural (que Portugal deveria colocar a zero de acordo com os compromissos europeus), como para a manutenção do défice nominal em valores próximos de 2,7%. “Embora estejamos abaixo dos 3%, continuamos muito perto dos 3%”, afirma Teodora Cardoso.
Deve notar-se contudo que, nestas projecções, a grande maioria das medidas de redução da despesa e aumento da receita projectadas pelo Governo para os próximos anos no Programa de Estabilidade e Crescimento não são consideradas, por não estarem definidas ainda em detalhe. Por exemplo, o aumento de 210 milhões de euros, estimado pelo executivo para a receita com impostos indirectos em 2017 não é levada em conta.