A velocidade dos carros é um problema para quem anda de bicicleta em Braga
Atropelamento mortal relança debate sobre segurança dos ciclistas. Autarquia diz que radares são a solução.
Domingo, 21 de Agosto. Um grupo de mais de uma dezena de ciclistas em passeio circula na avenida António de Macedo, junto à saída para o Hospital de Braga, quando um automóvel a alta velocidade atinge vários dos seus elementos. Há três feridos ligeiros e um grave que, minutos depois, a caminho do hospital, morre. A vítima tinha 63 anos. Este acidente mortal voltou a pôr Braga a discutir as condições de segurança para o número crescente de utilizadores de bicicleta na cidade. O diagnóstico é unânime: o principal problema é a velocidade a que circulam os carros.
Durante anos, Braga fez gala da sua rodovia que, além da avenida António de Macedo, onde aconteceu o acidente, é constituída pelas avenidas Júlio Fragata e Frei Bartolomeu dos Mártires (eixo Norte-Sul) e Imaculada Conceição e João XXI (eixo Este-Oeste). Estas estão classificadas como vias urbanas, com velocidades máximas fixadas nos 50 quilómetros por hora na generalidade dos percursos e, pontualmente, 70 quilómetros por hora. “Mas as velocidades concretas estão muito acima desses valores”, denuncia Mário Meireles do Braga Ciclável, um grupo de utilizadores da bicicleta que, a partir de um blog, tem discutido as condições da cidade se tornar mais amiga dos ciclistas. “São atingidas velocidades verdadeiramente escandalosas”, confirma o vereador do Urbanismo da Câmara de Braga, o geógrafo Miguel Bandeira.
Este não é um problema exclusivo bracarense, analisa o professor da Universidade de Aveiro e um dos autores do Compromisso pela Bicicleta, José Carlos Mota. “As cidades foram sendo construídas para facilitar a vida ao automóvel, privilegiando sempre o aumento da carga e da velocidade”, afirma. As avenidas que compõem os principais eixos viários da cidade têm quatro vias de trânsito e são continuadas por variantes de entrada e saída na cidade, onde são permitidas velocidades superiores a 70 quilómetros por hora.
Apesar destas avenidas atravessarem zonas habitacionais e de serviços, durante as últimas três décadas todas as intervenções foram no sentido de reforçar a velocidade dos carros, com a criação de passagens desniveladas para peões, por exemplo. Este primado do automóvel prolonga-se para o miolo da cidade de Braga, onde há uma mão cheia de parques de estacionamento subterrâneo, por exemplo.
Se isto pode ter feito sentido no final do século XX, hoje torna-se vez mais um problema numa cidade onde o número de utilizadores de bicicleta não tem parado de crescer. Entre 2011 e 2014, subiu quatro vezes (de 196 para 724) o número de ciclistas regulares. Como Braga é relativamente plana, com a maioria das inclinações inferior a 3%, a população percebeu o potencial da ciclável da cidade, para movimentos quotidianos, mas também para desporto e lazer.
O acidente do dia 21 de Agosto não foi o primeiro envolvendo automóveis e ciclistas que terminou com vítimas mortais. Os dados do boletim estatístico de acidentes de viação mostram que, entre 1999 e 2015 houve 227 acidentes (dá mais de um acidente por mês, em média, ao longo de 17 anos) entre carros e bicicletas. Destes, resultaram 19 feridos graves e duas mortes. No mesmo período, houve 49 mortes por atropelamento de peões em Braga e 2026 acidentes envolvendo automóveis e pessoas que circulavam a pé.
“Há sempre outras questões, mas o fundamental é sempre a velocidade”, sintetiza Mário Meireles, do Braga Ciclável. “Em todos os exemplos europeus de uso da bicicleta, a primeira medida é sempre a acalmia da velocidade”, acrescenta, dando o exemplo de Pontevedra, na Galiza, que generalizou a limitação de velocidade a 30 quilómetros por hora na cidade. O modelo a que recorrer José Carlos Mota também é ibérico, mas vem de uma cidade de maior dimensão: Barcelona. Na metrópole catalã há “várias vias estruturantes com velocidade máxima limitada a 30 km/hora. Se numa cidade daquela dimensão é possível, nas cidades portuguesas também, desse que haja vontade política”.
Há dois anos, a autarquia tinha prometido criar uma rede ciclável com 76 quilómetros e pôr ciclovias à porta de casa de 100 mil pessoas. O projecto ainda não saiu, porém, do papel o que, segundo o vereador Miguel Bandeira, deve-se ao atraso na execução dos fundos comunitários. O investimento foi incluído no Plano Estratégico de Desenvolvimento Ubbano, assinado recentemente pela autarquia com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, mas essas transferências ainda não foram concretizadas.
O autarca reconhece, porém, que o problema de segurança para os ciclistas está para lá da criação de ciclovias, até porque a estratégia de promoção da bicicleta em Braga passa “cada vez mais pela coexistência dos tráfegos”. A autarquia está a trabalhar em duas soluções que acredita vão ajudar a reduzir a velocidade nas principais avenidas da cidade e, nos próximos meses, serão colocados semáforos no atravessamento da Avenida Júlio Fragata – o eixo que permite o atravessamento entre a zona da Universidade do Minho e o centro da cidade. Por outro lado, já estão instalados quatro radares de velocidade, nas avenidas Frei Bartolomeu dos Mártires e Carrilho da Silva Pinto (junto à universidade), que esperam autorização da tutela para entrarem em funcionamento. “São dispositivos que terão um efeito dissuasor do excesso de velocidade”, espera Miguel Bandeira.