Apelos antiproteccionismo dominam, mas conflitos permanecem
Presidente chinês tenta que questões económicas dominem a cimeira do G20, pedindo aos países mais ricos para não fecharem as portas às exportações e investimento dos emergentes.
Numa cimeira realizada depois de o Reino Unido ter decidido abandonar a UE, no meio de sérios impasses nos acordos comerciais bilaterais e nas vésperas de eleições presidenciais nos Estados Unidos, foi sem surpresa que os apelos a uma recusa de políticas proteccionistas dominaram este domingo os primeiros discursos dos líderes políticos mundiais do G20. Mas os sinais de que da cimeira possam sair medidas concretas para evitar conflitos entre as economias são ainda muito reduzidos.
Logo a abrir a cimeira que decorre até esta segunda-feira em Hangzhou, o anfitrião Xi Jinping – que tem feito um esforço para evitar que questões políticas e militares dominem a cimeira - deixou claro qual o tema que quer ver debatido entre os 20 países participantes (que incluem as maiores economias mundiais e as principais potências emergentes). O presidente chinês defendeu que a economia mundial se encontra numa “encruzilhada crucial” e que está a ser ameaçada pelo aumento do proteccionismo.
Para os responsáveis políticos chineses, a preocupação está na possibilidade de os países mais ricos do planeta fecharem as portas às suas exportações e à entrada de investimento, o que criaria um problema sério a uma economia que ainda não conseguiu completar a transição para um modelo económico mais baseado na procura interna.
Olhando apenas para aquilo que foi dito publicamente no primeiro dia da cimeira, Xi Jinping não teria qualquer motivo para estar preocupado. A generalidade dos líderes mundiais declarou-se opositor de políticas de carácter proteccionista. Barack Obama disse que os acordos comerciais que está a tentar estabelecer com a Europa e a Ásia têm precisamente o objectivo de abrir mais as fronteiras entre as economias, os países emergentes emitiram um comunicado conjunto a apelar à redução do proteccionismo no mundo industrializado, e a primeira-ministra britânica Theresa May disse que o Reino Unido pode tornar-se, com o “Brexit”, um “campeão do comércio livre” à escala mundial.
Mas, para além das palavras, continuam também a ser muito evidentes os obstáculos de ordem política que existem à aplicação de políticas de abertura das economias, quando estas apresentam perspectivas tão fracas de crescimento.
Logo no primeiro dia da cimeira alguns dos conflitos vieram à tona, curiosamente envolvendo a China. Nos encontros bilaterais realizados com a Austrália, Pequim voltou a queixar-se dos obstáculos que têm sido colocados às empresas chinesas quando estas tentam adquirir grandes grupos económicos australianos. Do lado da Austrália, contudo, não houve qualquer sinal de recuo.
Depois, foi a vez da União Europeia, pela voz de Jean-Claude Juncker ter passado para a China as culpas da crise que atravessa a indústria do aço na Europa. O presidente da Comissão diz que o problema está no excesso de capacidade produtiva dos chineses, que fez com que os preços nos mercados internacionais baixassem tanto. “O excesso de capacidade é um problema global mas existe um elemento particular na China”, disse.
Estes dois casos, mostram como, apesar dos apelos gerais contra o proteccionismo, os mesmos conflitos entre as potências económicas tradicionais e emergentes se mantém, com os primeiros a queixarem-se de concorrência a baixos preços e os segundos a queixarem-se da dificuldade de acesso a outros mercados.
Ainda assim, alguns sinais de entendimento surgiram das conversas entre a maior economia mundial, os Estado Unidos, e a grande potência emergente, a China. Em contraponto com a ausência de qualquer progresso em questões como a do controlo territorial no Mar do Sul da China, Barack Obama e Xi Jinping registaram avanços em matérias económicas complexas entre os dois países, como as relativas à desvalorização das divisas e ao investimento no sector tecnológico.
Esses sinais de entendimento acabaram por minimizar a importância dos incidentes diplomáticos ocorridos no momento da atribulada chegada de Barack Obama à cimeira. O presidente norte-americano saiu do avião por uma porta traseira, não usando as habituais escadas com passadeira vermelha, e os jornalistas presentes na comitiva viram o acesso a esse momento dificultado pelas autoridades chinesas, tendo-se assistido na pista a discussões acesas entre membros das duas delegações.
"Não temos que abandonar os nossos valores quando fazemos estas viagens, mas é possível que haja algumas fricções", afirmou Obama, tentando não dar destaque ao acontecimento.