Morreu a actriz Madalena Sotto, a protagonista de A vizinha do lado
O encenador Jorge Silva Melo recordou-a como uma das figuras maiores do teatro em Portugal. No filme A vizinha do lado (1945), desempenhou o papel de Isabel Moreira, artista de variedades. Tinha 100 anos.
A actriz Madalena Sotto, que desempenhou o papel de Isabel Moreira no filme A Vizinha do Lado, morreu esta quinta-feira, no Porto, aos 100 anos, completados em Julho último, avança a agência Lusa.
Madalena Sotto era o nome artístico de Maria Madalena Pereira Othão, nascida a 21 de Julho de 1916, em Carvalhais de Lavos, nos arredores da Figueira da Foz, filha do pintor Othão Luís e da mestra de costura, bordados e tapeçaria Aida Augusta Pereira.
O velório da actriz realiza-se esta quinta-feira, na igreja Nossa Senhora da Boavista, no Porto, onde esta sexta-feira, às 15, é celebrada missa de corpo presente, seguindo-se o funeral para o cemitério de Agramonte, naquela cidade.
Madalena Sotto foi um nome cimeiro da cena teatral portuguesa, tendo feito parte, entre outras, da companhia de Rey-Colaço/Robles Monteiro, e da de Vasco Morgado. Em 2011, a morte da actriz foi erradamente noticiada e o encenador Jorge Silva Melo chegou a fazer um depoimento para o PÚBLICO a propósito da sua carreira. Recordava-a como "uma senhora elegante, com um sorriso de desdém que a tornava distante, um pouco fria".
Madalena Sotto concluiu o curso de tapeçaria, na Escola de Artes e Ofícios de Oliveira de Azeméis, onde o seu pai era director, e onde chegou a leccionar como auxiliar de oficina. Nesta cidade do distrito de Aveiro uma rua a uma biblioteca ostentam o nome de Madalena Sotto.
Como actriz, estreou-se em 1939, no filme A Varanda dos Rouxinóis, de Leitão de Barros, a quem fora apresentada pelo jornalista Arthur Inês, que a vira numa curta-metragem de promoção turística da Figueira da Foz, Dois Corações... Um Destino, de J. Oliveira Santos.
Em 1940 começou no teatro, ao lado de Alves da Cunha, na peça Os Velhos, de D. João da Câmara, no Teatro Sá da Bandeira, no Porto.
No cinema, área em que foi distinguida em 1945, com o Prémio de Melhor Actriz, pelo Secretariado Nacional de Informação, participou ainda em Feitiço do Império (1940) e A Vizinha do Lado (1945), ambos de António Lopes Ribeiro. Neste último contracenou, entre outros, com Carmen Dolores, Ribeirinho e António Silva, desempenhando o principal papel, o da actriz Isabel.
Em 1947 fez parte do elenco do filme Três Espelhos, de Ladislao Vajda, em 1956 participou em Vidas sem Rumo, de Manuel Guimarães, e, em 1972, em Sinal Vermelho, de Rafael Romero Marchent. Escreve Jorge Silva Melo: “'Ninguém como ela sabe fazer papéis irónicos’, dizia-me tantas vezes o Augusto de Figueiredo, seu amigo – e acho que, com isso, insinuava que a deveríamos convidar para a Cornucópia, naqueles anos de renovação em que tanto foi deixado para trás, salas que não ocupámos e agora estão em ruínas, actores que deixaram de ter lugar porque o seu mundo ruíra, mundo de pó-de-arroz e tafetás, mundo semi-francês das toilettes e cigarrilhas, sedas dos Souzas e o Ramiro Leão do célebre elevador com groom.”
No teatro fez parte das companhias Rey-Colaço/Robles Monteiro, e do Teatro Ginasio, na década de 1950.
Entre 1955 e 1960, fez parte da companhia de Vasco Morgado, na qual, entre outras peças, participou em A Severa, de Júlio Dantas, ao lado de Amália Rodrigues, Assis Pacheco e Paulo Renato.
Em 1960, esteve no núcleo fundador do Teatro da Estufa Fria, onde contracenou, entre outros, com Augusto Figueiredo, Assis Pacheco, Alberto Ghira, Vasco de Lima Couto e Alina Vaz.
No mesmo depoimento de 2011, o encenador recordava o empenhamento de Madalena Sotto: “Sempre lhe ouvi elogiar a dedicação, aquela coisa a que agora chamam o profissionalismo, e eu chamaria o empenho em fazer bem, o silêncio cuidadoso, o recato com que encarava uma profissão onde envelhecer não é fácil – e a maneira delicada como passara de primeira figura sedutora (picante, aventureira) para secundária, algumas vezes lhe ouvi elogiar o carinho pelos mais novos, a solidariedade para com pessoas que, no seu tempo, passaram tantos e tão injustos maus bocados”.
A actriz, que pôs fim à carreira em 1978, foi figura regular dos elencos de teatro televisivo, tendo participado em várias peças, nomeadamente Casa de Pais (1959), de Herlander Peyroteo e Francisco Ventura, na qual contracenou com Manuel Lereno, Raul de Carvalho e Anna Paula.
Em 1993, Madalena Sotto participou no telefilme Oito Mulheres, de Helder Duarte, exibido na RTP, ao lado, entre outras, de Clara Joana, Cucha Carvalheiro e Cristina Carvalhal.