Quando William Tyler começou a editar a solo, não era um desconhecido: os fãs de Lambchop e dos Silver Jews recordavam-se do seu meticuloso trabalho à guitarra nos discos e concertos dessas bandas, mas nem isso os preparou para o que puderam ouvir. Tyler parecia ter-nos concedido a chance de ouvir – em directo, em vida – como que uma emanação de antigos guitarristas conotados com a mais ancestral pureza, gente como John Fahey. Para toda uma geração nascida depois da década de 60, o enigmático Fahey quase que representa o sul dos EUA; cada uma das múltiplas notas das suas composições ecoa terra, rios, gado, tiros, questões raciais. A nossa dívida para com Tyler consistia nisto: era como se ele nos colocasse nesse território mítico, anos depois de ter sido apagado do mapa.
Note-se que Tyler, cujos complexos dedilhados resgatam a misteriosa tradição folk do sul dos EUA, não é um imitador: em Impossible Truth (de 2013) punha, para o citarmos, a guitarra a “soar como uma catedral”, enquanto Modern Country, o mais recente disco, une a country à motorika do rock alemão da década de 70. Em termos mais prosaicos: agora há uma banda por trás, as guitarras são muitas vezes eléctricas e ouvem-se teclados. O princípio, contudo, continua a ser o mesmo: múltiplas harmonias por trás de uma bela linha melódica, uma espécie de indução hipnótica (cortesia das repetições), o ocasional surto de psicadelismo.
Em Kingdom of Jones ele regressa, por instantes, ao mais despido uso da guitarra acústica; no resto do tempo, como se pode notar na extraordinária The great unwind, as camadas adicionais de instrumentos concedem mais vias para ascender à beleza, como um rio que se divide em vários braços, cada um deles rebrilhando ao sol. Modern Country nasceu quando Tyler teve um ataque de pânico em plena auto-estrada; para se acalmar, tomou uma estrada secundária e vazia e escreveu Highway anxiety, o tema que abre o disco e um belíssimo exemplar da arte de entrançar fios de ouro, que ele tão bem domina. As melhoras ao senhor Tyler, mas se não for pedir demais, que dentro de um par de anos tenha outro ataque de pânico.