Bloco e CDS sugerem alterações a relatório Banif

Os dois partidos apresentaram esta quarta-feira uma pequena lista de propostas (12, no caso do CDS; 14, no caso do BE) de alteração ao documento apresentado pelo socialista Eurico Brilhante Dias. Pequena, mas difícil...

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O Banif encerrou 17 agências no ano passado Foto: Catarina Oliveira Alves

São, aparentemente, boas notícias para o deputado-relator do PS: o seu documento, de 471 páginas, merece poucos reparos, e sugestões de correcção, quer da parte do CDS, quer da parte do BE. Os dois partidos apresentaram hoje, às 11 horas, as suas propostas – cuja inclusão deve garantir um voto favorável quando o relatório for a votos na Comissão Parlamentar de Inquérito ao Banif. Mas sendo cirúrgicas, e contidas no tamanho, as alterações propostas vão obrigar o relator a uma difícil gestão política.

Enquanto as alterações do CDS se dedicam, sobretudo, à parte “factual” das conclusões do inquérito – e como se verá apresentam maiores dificuldades para o relator na distribuição de responsabilidades políticas… - as do BE visam sobretudo dar maior dimensão ao capítulo das recomendações, onde os deputados sugerem alterações legislativas para evitar que se repita o mesmo problema que levou à elevada factura para os contribuintes do fecho do Banif. Colocam, portanto, um outro problema: quão longe pode ir o relator em matérias como o "controlo público" do sector financeiro, e que críticas quer dirigir a Bruxelas.

O CDS pede, logo no início, para que seja alterada uma das conclusões que mais defendem o actual Governo. A que garante que o processo de resolução ou venda teria de ser concluído até final de 2015, sob o risco de ser considerada “ilegal” a ajuda do Estado ao Banif, decidida em 2012. Pior: o CDS quer incluir uma referência “a que tanto a solução CGD, preferida pelo Governo, como a hipótese do “banco de transição”, defendida pelo BdP, foram recusadas pelas instituições europeias, de forma informal e não fundamentada mas, apesar disso, aceites pelo Governo”.

Nesse capítulo, sobre as “responsabilidades do actual Governo”, o deputado João Almeida inclui ainda uma referência ao episódio em que o Governo contestou uma decisão de Bruxelas, acabando por acatá-la “quatro minutos depois”. Por fim, no capítulo das críticas a Mário Centeno, o CDS propõe uma responsabilização específica: “Consideramos grave, e de referência necessária no Relatório, a não nomeação – porque já estão a ser vendidos activos - , por parte do Governo Português, da entidade de acompanhamento (“monitoring trustee”) da Oitante, passados mais de sete meses da resolução.”

Mais pacífica pode ser a inclusão de duas novas alíneas sobre a “responsabilidade do Banco de Portugal”. Nomeadamente: “O BdP não apresentou fundamentação técnica, nem na altura nem durante os trabalhos desta CPI, para estas imposições que agravaram a situação do Banif”, e “ficou claro que o BdP fez vários contactos e teve várias reuniões – a que decidiu posteriormente chamar de “preparatórias” – para a resolução do Banif e venda ao Santander, ainda antes do fim do prazo da venda voluntária. “

Ainda mais duras são as conclusões que o CDS quer tirar sobre “as responsabilidades das instituições europeias”. “A orientação das instituições europeias foi errática e contraditória.”

Pelo contrário, o CDS quer inclui uma referência à “resistência” do anterior governo “perante a vontade da DGCOM de reduzir o Banif a um ‘Banco das Ilhas’”. E considera não estar “fundamentado” no relatório “que o anterior governo tenha responsabilidades sobre mais imparidades”.

Ao contrário do que Eurico Brilhante Dias escreveu no relatório, para o CDS a notícia da TVI sobre o possível fecho do Banif foi mesmo determinante: “Consideramos que a crise de liquidez, que foi factor para a decisão de  suspensão do estatuto de contraparte pelo BCE, foi também provocada pela notícia da TVI.”

O pacote de alterações do CDS termina com uma recomendação “sobre a insuficiente informação e colaboração prestada pelo actual Governo, Banco de Portugal e instituições europeias”: “Tendo em consideração o custo, para os contribuintes portugueses, envolvido neste processo e o bom decorrer dos trabalhos desta Comissão de Inquérito, é de lamentar a insuficiente colaboração, por parte de várias entidades, nacionais e comunitárias, com as diligências e requerimentos elaborados. É particularmente censurável o envio tardio de respostas - após o final das audições - por parte de instituições europeias, assim como a inaceitável fundamentação, pelo Ministério das Finanças, baseada em interpretações comunitárias restritivas, para a recusa do em enviar documentação pedida – em contradição com prática anterior dos mesmos responsáveis do Governo.”

As recomendações do BE

Como já tinha anunciado na reunião da comissão, Mariana Mortágua quer incluir no relatório a proposta de criar “mecanismos que travem a venda de produtos de dívida arriscados ao balcão, sobretudo quando se trata de financiar a própria instituição vendedora”.

O BE sugere ainda que se esclareçam as vantagens da abortada tentativa de integração do Banif na Caixa-Geral de Depósitos, sugerida pelo actual Governo em Dezembro e liminarmente chumbada por Bruxelas. “Apesar desta possibilidade não ter chegado a ser estudada a fundo, os dados disponíveis sugerem que teria tido um custo associado equivalente ou mesmo inferior ao da solução encontrada de venda ao Santander. Esta possibilidade teria ainda a vantagem de ter contribuído para a capitalização de Caixa Geral de Depósitos, impedido que a mais valia da operação fosse apropriada por um agente privado. Os factos sugerem assim que, não fosse a intransigência e discricionariedade da DGCOM, teria sido possível encontrar uma solução que penalizasse menos os interesses dos contribuintes e cidadãos portugueses.”

Para o BE, o relatório deve ser claro ainda noutro ponto: “O elevado retorno líquido da compra do Banif pelo Santander resulta directamente, por um lado, da pressão das instituições europeias para que a operação estivesse concluída ainda em 2015 e, por outro, da imposição dos haircuts dos activos transferidos para a Oitante. Acresce a este ganho a possibilidade de o Santander pode vir a utilizar de DTAs transferidos do Banif, o que representa despesa fiscal futura do Estado Português. Em todos os aspectos, a actuação da DGCOMP e da restantes autoridades europeias contribuiu para aumentar o custo associado à resolução e venda do Banif ao Santander.”

Para frisar de uma maneira ainda mais clara a sua oposição ao desfecho que acabou por ser escolhido para o Banif, o BE quer que o relatório lembre como foi tomada a decisão: “O financiamento deste processo de resolução, e daí o seu impacto nas contas públicas, foi assegurado pelo Tesouro, tendo sido aprovado um orçamento rectificativo em 2015 - com os votos a favor do PS, a abstenção do PSD e votos contra das restantes bancadas - para que fosse considerada a autorização dessa despesa.”

Em linha com uma das sugestões do CDS, o BE também quer reforçar a falha do Estado no acompanhamento do veículo especial Oitante. “O Governo deve por isso, não só nomear uma comissão de acompanhamento da actividade deste veículo, como garantir que o Parlamento é chamado para participar nesse escrutínio.”

Mas o ponto principal, para o BE, é garantir “mais transparência na decisão das Instituições Europeias da Concorrência e da Supervisão e Resolução Bancária”. Para acabar com a “discricionariedade”. O que vale para a DGComp, defende Mortágua, vale também para o BCE. E compete ao Governo “ garantir que são tomadas diligências para obter das instituições europeias os esclarecimentos necessários acerca da forma como este processo foi conduzido”.

Uma das concussões do BE sobre este caso Banif é mais estrutural e sugere um elogio, difícil de aceitar pelo PS, de um “controlo público” da banca: “Os casos sistemáticos de falências no sistema bancário demonstram que o problema não está apenas, nem tão pouco, nas práticas de má gestão, mas sim na natureza intrinsecamente instável do sistema bancário e financeiro. A compreensão das fragilidades estruturais do sistema deve conduzir a uma reflexão profunda sobre as formas de controlo efectivo do funcionamento dos bancos, que devem estar ao serviço das economias e não, como hoje acontece, constituir um fardo sobre as mesmas. A supervisão, mais ou menos intrusiva, não se tem mostrado eficaz na antecipação e prevenção de práticas que, inevitavelmente, acabam por gerar dinâmicas especulativas e destrutivas da estabilidade dos bancos. Isto acontece, em larga medida, o sistema tem a capacidade para criar novas práticas que, de forma sistemática, antecipam e evitam a regulação e supervisão bancárias. (…) O controlo público é uma condição necessária, mas não suficiente para esse fim. Os produtos e práticas financeiras devem ser revistos e restringidos de forma a evitar a especulação e o descontrolo. “

De resto, o BE quer uma revisão da “disfuncionalidade actualmente existente ao nível das regras e instituições europeias no que diz respeito ao sector financeiro” e uma “reflexão sobre as regras e instituições hoje existentes que caminhe no sentido de impedir qualquer novo passo na cedência de poderes nacionais a instituições europeias, e até de encontrar os mecanismos para reverter os poderes já perdidos”.

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