O Decameron dos irmãos Taviani

Os Taviani não têm nem a ferocidade de Pasolini nem a sofisticação de Rohmer – e Maravilhoso Boccaccio fica aí, nesse meio termo, “nem nem”.

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Depois do sucesso de César tem de Morrer, Urso de Ouro em Berlim 2012, que era Shakespeare filmado com os presos de uma cadeia de segurança máxima em Itália, os Taviani deixam a prisão mas insistem nos clássicos. Maravilhoso Boccaccio é um regresso ao Decameron do autor florentino, conservando a época e a estrutura (o racconto, as histórias que um grupo de amigos em isolamento contam uns aos outros) mas variando depois no teor das narrativas. É claro que há um antecedente que os Taviani conhecem: o Decameron de Pasolini, selvagem e libertário, carnal e mortífero. Seria absurdo tentar repetir a aproximação, e os Taviani seguem por outro caminho, um bucolismo onde a carga erótica de Boccaccio surge como que filtrada por uma mise en scène consciente do efeito de distância que quer criar entre “representação” e “representado”.

A reconstituição minimal, dada num “verismo” que tem mais a ver com a notação teatral do que com o “realismo” mais comum no cinema, conduzem as histórias para um certo idealismo, bem vincado pelas alusões pictóricas que dominam a composição de vários enquadramentos, uma evocação da pintura da Renascença. Se o filme é tudo menos desagradável, forçoso é reconhecer que estamos longe da “praia” dos Taviani, bem mais rodados a filmar a Itália contemporânea ou a sua história recente. E depois se fogem a Pasolini vão chocar de frente com Rohmer, cujo derradeiro filme (Os Amores de Astreia e Celadon) propunha uma representação semelhante (mas infinitamente mais complexa e graciosa) da Idade Média e dos jogos amorosos dos rapazes e raparigas do campo. Os Taviani não têm nem a ferocidade de Pasolini nem a sofisticação de Rohmer – e Maravilhoso Boccaccio fica no meio termo.

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