Refundemos a Europa; estamos a tempo
A UE não pode continuar a ser a Europa dos burocratas e dos banqueiros.
Toda a separação é dolorosa, mesmo que seja necessária. E neste caso estamos a perceber que era necessário, mesmo quando estivemos em silêncio e cedemos para construir um projecto mais emocionante no imaterial do que no real. Porque neste tipo de projectos, os que carecem de generosidade e se juntam exclusivamente para condicionar os outros em prol da sua própria vontade e ao grande conceito que têm de si mesmos, e dos seus interesses nem sempre legítimos, não costumam trazer nada de bom para o projecto. Ou seja, apesar de o lamentar pelos Ingleses, não serei eu quem derramará uma lágrima pela City sair da UE. E nem uma palavra mais dedicarei ao passado, que é o que é o “Brexit” desde já. Interessa-me mais o futuro. A primeira consequência provavelmente será a decomposição territorial do Reino Unido, ao terem quebrado o vínculo que os unia à Escócia. A alteração das regras do jogo funcionará como um volte-face para o Ulster e possivelmente para Gales. Mas outro elemento entrará em jogo: o posicionamento das grandes multinacionais, que usavam a Inglaterra como ponta-de-lança e para as quais está fora de questão permanecer num território extracomunitário. Para estas será mais económico mudarem-se para uns centos de quilómetros para continuarem na UE. Essa criação de emprego e riqueza também será um forte aliciante para se separarem da Inglaterra.
Mas tudo isso não nos deve impedir de ver o grande perigo que nos espreita. “Vem aí o lobo!”, advertiu-se nos anos 30. E ninguém quis escutar. E agora voltamos a repetir: “Vem aí o lobo!“; ainda estamos a tempo de travar os novos fascismos que emergem sem pudor em povos desmemoriados que sofreram na pele o nazismo. Ou que o combateram, como os Estados Unidos. Essa besta que se disfarça de comunismo na Coreia, de populismo na Venezuela, ou de democracia na Europa, onde – não o esquecemos – Hitler chegou ao poder disputando eleições. Não podemos esquecer que estamos perante circunstâncias similares às que provocaram as guerras do século XX. E que um falso encerramento da primeira guerra, que travámos durante 7 anos, levaria a uma segunda muito mais sangrenta. Só a sociedade da internet e a União Europeia nos livraram de sermos lançados nas mãos de caudilhos que nos colocaram uns contra os outros para tapar a sua incapacidade de governar e de nos tirar da crise. Não faz assim tantos anos que ocorreu o que ocorreu na antiga Jugoslávia, território europeu a menos de uma hora de Roma.
Mas essa União Europeia não pode continuar a construir-se como se tem feito nos últimos anos. Não pode continuar a ser a Europa dos burocratas e dos banqueiros. Não pode continuar a ser uma Europa distante dos cidadãos, incapaz de falar com uma só voz e de recordar a sua filosofia fundacional. Uma Europa de emigrantes e de exilados que agora fecha as portas aos que se vêem empurrados pela guerra. Porque esses erros são utilizados demagogicamente por líderes populistas e protofascistas para manipular as massas mais crédulas e iletradas. Toda a grande mentira se cimenta sobre a manipulação e desfiguração de uma verdade incómoda. Mas toda a crise é também uma grande oportunidade. E desta temos de tirar uma transformação da UE; de uma Europa dos cidadãos e da liberdade. Uma terra multicultural de acolhimento e integração. Uma Europa onde nós, cidadãos, elegemos o presidente da União Europeia por votação directa e universal. Com um serviço diplomático único (que evite o colossal desperdício que temos em embaixadas desnecessárias dentro e fora da UE), com um exército e polícia comum, e com um Parlamento mais reduzido e económico, mas com autênticas competências, ao serviço dos cidadãos. Assim sendo… bye bye England, welcome Europa. Refundemos a Europa. Mais Europa.
Secretário Geral do Eixo Atlântico