Cameron cede esta quarta-feira o poder e o "Brexit" a Theresa May
Carrinhas de mudanças à porta de Downing Street. Nova líder dos conservadores torna-se esta quarta-feira à noite a segunda primeira-ministra do Reino Unido.
Depois de seis anos em Downing Street, o primeiro-ministro demissionário, David Cameron, entrega esta quarta-feira o Governo do Reino Unido à que foi sua ministra e é a nova líder do Partido Conservador, Theresa May – e com ele a responsabilidade pela condução do processo negocial para a saída do país da União Europeia, decidido num referendo que ficará para sempre como o seu principal legado político, e provavelmente como o seu epitáfio político.
Ainda é impossível saber como o Governo de Cameron será recordado nos compêndios da História, mas os balanços feitos no seu último dia no cargo não foram simpáticos para o pragmático ex-líder conservador, que chegou ao poder com a promessa de transformar e modernizar o partido e de resolver de uma vez por todas a “questão” europeia que alimentava uma guerra surda entre as suas fileiras.
“A triste realidade é que o primeiro-ministro demissionário será recordado como o homem que levou o país para fora da EU”, resumia o Financial Times. A BBC lembrava que o “Brexit” deitou por terra as ambições de Cameron de governar o Reino Unido, com uma maioria conservadora, durante os próximos quatro anos – com o processo de escolha do seu sucessor fechado na segunda-feira, e não apenas depois do Verão, como se antecipava, nem sequer teve tempo para preparar a sua saída. “Quando a política britânica mexe, mexe muito depressa”, notava Alex Massie, editor da revista Spectator.
Embora só aconteça oficialmente esta quarta-feira ao início da noite, depois de David Cameron apresentar a sua demissão à rainha Isabel e de esta incumbir Theresa May de formar um novo Governo, o processo de transição de poder e formação de um novo Governo já começou. As carrinhas de mudanças foram vistas à porta do número 10 de Downing Street logo pela manhã, e nos vários ministérios e gabinetes governamentais, começaram os discursos de despedida.
David Cameron dirigiu o seu 215.º e último Conselho de Ministros: May, que fez parte do seu executivo desde o primeiro minuto, confirmou que as políticas sociais destinadas a “dar oportunidades a todos”, que o primeiro-ministro demissionário quer ver associadas ao seu nome, continuarão a ser “uma prioridade” do seu Governo (vários jornalistas britânicos diziam que a futura primeira-ministra poderá desvendar a composição da sua equipa ainda na quarta-feira à noite).
No fim da reunião, David Cameron e Theresa May tiveram uma conversa privada, de meia hora, cujo teor não foi revelado. A futura primeira-ministra, que prometeu desvendar a sua agenda política rapidamente, ainda não respondeu aos apelos da oposição de se sujeitar ao voto dos britânicos. E também ainda não revelou quais são os seus planos em relação ao “Brexit” e à negociação europeia: nas suas parcas declarações sobre o assunto, indicou não ter qualquer pressa para accionar o artigo 50 do Tratado de Lisboa que põe em marcha o processo de separação de Bruxelas.
Enquanto os tories preparam a mudança de Governo, os trabalhistas continuam a sua guerra interna, que parece cada vez mais perigosa e violenta. Esta terça-feira, o gabinete da deputada Angela Eagle, que pretende substituir o actual líder, Jeremy Corbyn, foi alvo de um ataque, e a polícia mudou o local de eventos públicos de outros deputados do Labour, por questões de segurança.
Corbyn, que se tem mantido imperturbável perante a rebelião dos parlamentares do partido, revelou que ele próprio tem recebido ameaças de morte. “Condeno veementemente qualquer tipo de ameaça e violência, que não têm lugar na política. Enquanto alvo de ameaças de morte, peço a todos os membros e simpatizantes do partido que mantenham a calma e que tratem todos com respeito e dignidade, mesmo aqueles com quem não concordam”, apelou.
O comité executivo dos trabalhistas vai decidir ainda esta terça-feira se Corbyn teria de se sujeitar às mesmas regras dos seus adversários internos, que precisam do apoio de pelo menos 50 deputados para terem o seu nome no boletim na votação para a nova liderança.
Muito mais discretamente, também o partido nacionalista UKIP deu início ao processo de selecção de um novo líder, que substituirá o histórico Nigel Farage. O homem que reclamou a maior vitória pessoal no referendo britânico, depois de uma campanha de mais de 25 anos contra a União Europeia, demitiu-se surpreendentemente depois de confirmado o “Brexit”. O antigo secretário-geral do partido e deputado no Parlamento Europeu, Jonathan Arnott, de 35 anos, foi o primeiro a avançar uma candidatura. Segundo a BBC, outros candidatos mais conhecidos viram as suas ambições goradas depois de o partido ter imposto como condição que todos os aspirantes a líder tivessem o mínimo de cinco anos de filiação no UKIP.