“Negociata” dos “homens da mala” divide autarcas da Área Metropolitana do Porto

Representantes de Porto, Vila Nova de Gaia, Matosinhos e Gondomar não estiveram presentes na parte pública da reunião do Conselho Metropolitano do Porto

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Emídio Gomes recusou cumprir as ordens do Governo Bárbara Raquel Moreira

A exoneração do presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN), Emídio Gomes, e, sobretudo, o processo que levou a esta decisão, anunciada quinta-feira pelo Governo, abriram brechas entre os autarcas da Área Metropolitana do Porto (AMP). Na reunião desta sexta-feira do Conselho Metropolitano do Porto (CmP), que na sua parte aberta ao público não contou com a presença dos representantes de Porto, Matosinhos e Vila Nova de Gaia, vários autarcas insurgiram-se contra o que designaram de “negociata” em torno das verbas dos Planos Estratégicos de Desenvolvimento Urbano (PEDU). Os autarcas querem o ministro do Planeamento e Infra-estruturas, Pedro Marques, a dar explicações ao CmP.

A presidente da Câmara de Vila do Conde, Elisa Ferraz, foi a primeira a pedir a palavra, manifestando-se “absolutamente insatisfeita” com os procedimentos que levaram a que sete municípios venham a ficar com uma verba de 20,4 milhões de euros para a inclusão social que, julgava a autarca, seria distribuída pelos 29 municípios que negociaram as verbas do PEDU com a CCDRN. Elisa Ferraz explicou que numa reunião recente dos autarcas com Emídio Gomes – que resultou de um pedido feito no último CmP – o líder da CCDRN tinha desmentido que a verba anunciada pelo Governo como um reforço seria apenas para alguns. “Infelizmente confirmou-se, na assinatura dos PEDU que, afinal, não houve o acesso [de todos] a essa verba. Isto significa que foram eleitos alguns, provavelmente os que fizeram mais barulho, em detrimento de todos”, afirmou a autarca, classificando todo o processo como “muito grave”.

Por isso, Elisa Ferraz vê como “de extrema gravidade” a exoneração de Emídio Gomes, apesar de ela própria se dizer insatisfeita com as verbas que lhe couberam e de ter, na altura, reclamado pelo facto. “Não estou a analisar o seu desempenho, mas, neste caso, ele não abriu as candidaturas que lhe foram impostas [pelo Governo] porque se tinha comprometido com os 29 municípios”, disse, deixando claro o seu “veemente protesto”.

O presidente da Câmara da Trofa, Sérgio Humberto (PSD),  classificou a majoração de verbas para os municípios do Porto, Matosinhos, Gaia, Gondomar, Santa Maria da Feira, Valongo e Paredes como “uma negociata” acordada entre “os homens da mala”, considerando mesmo que o papel do CmP está “ferido de morte”, pelo que considera ser uma “falta de coesão, com alguns a olharem só para o seu umbigo”. O social-democrata Aires Pereira, presidente da Câmara da Póvoa de Varzim, avisou os colegas que “esta distribuição à revelia dos critérios comunitários pode ter consequências que venham a pôr em risco” o próprio programa de financiamento comunitário e lamentou não ter feito “uma perrice”, para também ter direito a mais dinheiro. “Se calhar ia ter um bónus suplementar, por fazer uma perrice e me recusar a assinar o contrato”, ironizou.

Já Ricardo Figueiredo (PSD), de S. João de Madeira, lamentou que “alguns dos visados” não estivessem presentes na reunião e classificou a intervenção do ministério de Pedro Marques no processo dos PEDU como “uma tentativa de ingerência de um membro do Governo em assuntos que dizem respeito aos municípios”.

O primeiro a tentar pôr água na fervura foi o autarca de Valongo, o socialista José Manuel Ribeiro, que disse ter sabido pelos jornais que poderia vir a receber uma majoração das verbas oriunda dos 20,4 milhões adicionais anunciados pelo Governo. Defendendo que os autarcas estavam a dar “uma imagem péssima”, por estarem “à pedrada uns aos outros”, pediu que o ministro Pedro Marques fosse chamado ao CmP, para prestar todos os esclarecimentos necessários.

A proposta seria aprovada por unanimidade e levou a que Hermínio Loureiro, o líder do CmP e também presidente da Câmara de Oliveira de Azeméis se furtasse a avaliar a forma como o Governo interveio no caso dos PEDU.

No Facebook, Hermínio Loureiro publicara uma opinião dura sobre a exoneração de Emídio Gomes e também do líder da CCDR do Algarve, David Santos – “Não é um final feliz. Pensava eu que os saneamentos políticos já não existiam. O mundo está a ficar perigoso”, escreveu -, mas no CmP, esta sexta-feira, preferiu assumir uma posição mais comedida. Primeiro, ainda durante a reunião, lembrara os autarcas que todo o processo do PEDU assentara numa negociação “individual” de cada município com a CCDRN, sem qualquer intervenção do CmP, pelo que eram legítimos todos os protestos e tentativas que cada autarca fizera para melhorar a verba que lhe coubera. “Outra questão tem a ver com a redistribuição do pacote adicional de 20,4 milhões anunciados pelo ministro Pedro Marques”, disse. Mas, sobre isto, o líder dos municípios da AMP não quis, agora, pronunciar-se.

O Ministério do Planeamento anunciou, na quinta-feira, a exoneração dos presidentes das CCDR do Norte e do Algarve. No caso de Emídio Gomes a justificação apresentada foi o “incumprimento reiterado das orientações da tutela sobre matérias inerentes ao exercício das suas funções”. Um desfecho que já se aguardava depois de o líder da CCDRN se ter recusado a cumprir a ordem do Governo para que publicasse o aviso que iria permitir o acréscimo de verbas do PEDU a sete municípios da AMP. Esse incumprimento levou a que esses municípios não tenham ainda assinado os respectivos contratos que dão acesso a esses fundos destinados aos núcleos urbanos.

Tanto Emídio Gomes como David Santos recusaram, para já, fazer quaisquer declarações sobre o assunto. A questão tem sido, contudo, alvo de diversas reacções, como a do presidente da Câmara da Maia, Bragança Fernandes, que não esteve no CmP (foi substituído pelo vice-presidente, Tiago), mas citado pela Lusa manifestou: “Eu acho que isto é uma perseguição política, porque eu não sei quem é que devia ser exonerado. (…) O que presidente da CCDRN fez foi cumprir as leis”.
“Saneamento político” foi a expressão usada também pelo presidente da Câmara de Bragança, Hernâni Dias, que acusou os autarcas do Grande Porto de “egoísmo atroz”. E o líder do PSD/Porto, em declarações à Lusa, também não fugiu ao tom. “Eu pensava que os tempos das exonerações políticas já tinham passado no nosso país, mas parece que este Governo faz questão de regressarmos ao passado também nesse aspecto. Portanto, estamos na presença de uma exoneração baseada exclusivamente critérios políticos”, disse Virgílio Macedo.

 

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