Leicester: contra todas as probabilidades

Um clube simpático, um líder visionário, uma cidade encantada, um treinador genuíno capaz de chorar e um goleador renascido do nada. O marketing pode ajudar agora a dar a sustentação que o Leicester precisa para se manter no topo.

8 de Agosto de 2015. Primeira jornada da Premier League. Enorme entusiasmo pela liga mais competitiva do mundo. Dividem-se as apostas sobre o favorito desta época: o Chelsea de Mourinho, o Manchester United de Van Gaal, o Manchester City de Pellegrini, o Arsenal de Wenger ou o Liverpool de Klopp?

Analisando os orçamentos de cada clube para esta época e, se o dinheiro influenciasse directamente os resultados desportivos, então a Premier League seria ganha pelo Chelsea (273 milhões de euros), seguido por Manchester United (257 milhões de euros), Manchester City (245 milhões de euros), Arsenal (243 milhões de euros) e Liverpool (192 milhões de euros). Ao Leicester ficaria reservado o 17º lugar dado o seu orçamento de pouco mais de 60 milhões de euros.

2 de Maio de 2016. Um empate do Tottenham no terreno do Chelsea a duas jornadas do fim origina uma louca festa em Leicester. Ranieri e Vardy comandam a mais espectacular vitória de sempre da história da Premier League originando automaticamente 23 novos milionários com apostas impensáveis.

O desporto tem sido alvo de profundas alterações, principalmente durante a segunda metade do século XX. Antigamente era habitual associarmos o desporto a determinadas características como o amor à camisola, a nobreza, o prazer da competição, os insuficientes conhecimentos médicos e as deficiências dos métodos de treino. O amadorismo em estado puro com as respectivas vantagens e desvantagens. Na última metade do século XX, a realidade foi profundamente alterada, sendo mais habitual, hoje em dia, associar ao desporto palavras até então desconhecidas como merchandising, direitos de imagem, ligas profissionais, bilhetes de temporada, audiências televisivas ou patrocínios.

A empresarialização do desporto vem de encontro à evolução da sociedade dos nossos dias, das nossas empresas, dos nossos clubes, dos nossos atletas, mas deixa alguns adeptos profundamente entristecidos ou até mesmo irritados. Se concentrarmos a nossa atenção na análise do desporto, ao colocarmos uma óptica comercial e de negócio levantam-se sempre barreiras por parte de académicos, adeptos, historiadores, reguladores e claro, espectadores. Será surpreendente classificarmos o desporto como um negócio? Talvez não o seja se atentarmos nas elevadas somas de dinheiro que auferem os melhores desportistas, sejam eles jogadores de golfe, pilotos de fórmula1, futebolistas ou tenistas.

Qualquer organização desportiva de hoje está na corrida para identificar novas fontes de receita que criem estabilidade económica a longo prazo. Quando antigamente o desporto era visto como a forma ideal para o exercício saudável do corpo, hoje em dia estamos perante uma verdadeira indústria que alicia adeptos de todo o mundo, de qualquer classe etária ou grupo social. As cadeias de televisão disputam os melhores momentos, os estádios transformaram-se em centros de entretenimento, os adeptos participam activamente nos espectáculos e as empresas utilizam o desporto como veículo de divulgação dos seus produtos.

Este estado emocional da relação entre os consumidores e as marcas de desporto transforma-nos em verdadeiros fans, capazes de lutar e defender as nossas cores e paixões. Ora, este fenómeno altera radicalmente todas as regras do marketing aplicadas ao resto do mundo empresarial. É precisamente aqui que reside a essência do marketing para desporto e é isto que deve mover as organizações desportivas.

São estes os desafios que agora se vão colocar ao Leicester. Dificilmente se repetirá uma época desportiva como esta. O factor surpresa desparece de vez. A história do Leicester tem todos os ingredientes de sucesso que uma boa história de marketing pode ter: um clube simpático, um líder visionário, uma cidade encantada, um treinador genuíno capaz de chorar e um goleador renascido do nada. O marketing pode ajudar agora a dar a sustentação que o clube precisa para se manter no topo.

Parabéns Leicester.

Director do IPAM – The Marketing School e especialista em marketing desportivo

 

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