Divertimento em trio maior

A aventura europeia de Paula Morelenbaum comprovou em palco a sua vitalidade. O Bossarenova Trio deu um óptimo espectáculo no CCB, na noite de 29 de Março.

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Paula Morelenbaum, Joo Kraus e Ralf Schmid DR

A promessa de cruzar bossa nova com temas da música clássica, misturando o calor brasileiro ao classicismo europeu, talvez tenha atraído ao Pequeno Auditório do CCB, na noite de terça-feira 29 de Março, algum público menos dado a este tipo de concertos. Mas não foi bem isso que o Bossarenova Trio apresentou, foi antes um cruzamento desses dois géneros explorado numa linguagem musical híbrida viva e empolgante, com raízes jazzísticas e tropicais e uma paleta impressionante de tons. Contribuíram, para isso, as qualidades natas dos músicos: a brasileira Paula Morelenbaum (voz, percussões) e os alemães Ralf Schmid (piano, teclado eléctrico) e Joo Kraus (trompete, percussão e manipulações electrónicas). O arranque fez-se com Schumann (Im wunderschönen monat mai, que o gaúcho Artur Nestrovski transformou, com letra em português, em Clara – à flor da idade), passando de imediato a Dorival Caymmi (Samba da minha terra) e a Vinicius (Tempo de amor). Blackbird, dos Beatles, antecedeu Samba em prelúdio (Baden e Vinicius) e Primavera Verão (composição colectiva do trio, com letra de Paula Morelenbaum e Eucanaã Ferraz). O momento “clássico” que se seguiu foi uma festa: Trenzinho do Caipira, de Villa-Lobos, viu-se mergulhado numa fantasia rítmica tempestuosa, com vários instrumentos (houve alturas em que o trio quase soou como um ensemble de maior porte) a reinventarem os sons de um comboio em marcha; e Ich Grolle Nicht, de Schubert, teve em Pra que chorar um delicado nocturno.

Depois, Ralf e Joo ficaram sozinhos em palco, voando “a little bit” (a deixa foi dela) ao seu gosto. E a audiência percebeu o que (tão bem) os une e torna distintos. Águas De Março, clássico dos clássicos de Jobim, pulsou a contento, assinalando o regresso de Paula ao palco. Sim, sei bem (Pessoa/Ricardo Reis, musicado por José Miguel Wisnik) foi tocado e cantado pelo trio pela primeira vez, em homenagem a Lisboa. De regresso ao Brasil, passámos pela Bahia (a Tarde em Itapoã, de Vinicius) e pelo Rio (Samba de Verão/So nice, de Marcos Valle e Um a Zero, de Pixinguinha), para voltar a Vinicius, em parcerias com Tom (O morro não tem vez) e Baden Powell (Berimbau). O fecho, num só encore, fez-se com o festivo Mas que nada, de Jorge Benjor, um dos sete temas do disco Bossarenova (2010) apresentados na noite. Do disco mais recente, em trio (Samba Prelúdio, 2013) ouviu-se apenas metade, seis em doze. O resto foram extras, numa noite onde Paula Morelenbaum provou a justeza e o bom gosto da sua aventura europeia, com o Brasil (e as melodias e ritmos) em muito boa companhia.

O trio tem ainda na agenda Coimbra (31, Conservatório de Música, 21h30), Famalicão (1 de Abril, Casa das Artes, 21h30) e Ponta Delgada (dia 2, Teatro Micaelense, 21h30).

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