Sírios aproveitam trégua frágil para recuperar fôlego

Cessação de hostilidades está a ser respeitada em várias partes do país, embora no Norte a guerra prossiga a um passo mais lento. Chegou mais ajuda humanitária aos arredores de Damasco.

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Mulher descansa entre os escombros de Aleppo, onde se organizaram manifestações esta semana. Ammar Abdullah/Reuters

Enquanto o relativo cessar-fogo na Síria não fracassa por completo, como foi universalmente antecipado mesmo antes de a trégua ter começado, a população ganha fôlego com o envio de ajuda humanitária a localidades cercadas e aquilo que ambas as partes do conflito admitem ser uma redução substancial da violência no país desde que a guerra começou.

“Pela primeira vez em cinco anos, assistimos a uma notável redução da violência na Síria e temos um mecanismo que o vigia”, afirmou esta quarta-feira o porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, John Kirby, à entrada para o quinto dia de "cessação de hostilidades" na Sìria.

Rebeldes e regime acusam-se diariamente de violações à trégua, particularmente no Norte do país, onde a guerra se intensificou nos últimos meses e são poucas as zonas de cessar-fogo que Governo de Bashar al-Assad e aliados se comprometem a respeitar. O Kremlin anunciou esta quarta-feira ter contado para já 31 violações de cessar-fogo pelos rebeldes, embora estes se queixem de estarem ainda sob bombardeamentos russos.

Aviões sírios e russos atacaram nos últimos cinco dias territórios rebeldes em Aleppo, Homs e Latakia, alegando que a oposição nessas zonas é feita sobretudo por combatentes da Frente al-Nusra, grupo aliado da Al-Qaeda que, como o autoproclamado Estado Islâmico, não faz parte da trégua que se iniciou no sábado — a mesma tese é defendida pelo veterano jornalista britânico Robert Fisk, actualmente nas linhas da frente em Aleppo com tropas do regime.

Mas mesmo bombardeamentos e combates que não cessaram prosseguem a um ritmo muito mais reduzido do que o habitual, como argumenta o Instituto para o Estado da Guerra, think-tank norte-americano que monitoriza o conflito e que esta quarta-feira publicou uma análise aos ataques aéreos russos nos primeiros dias da trégua. Em Aleppo, aliás, assistiu-se no início da semana a um protesto de dezenas de pessoas que exigiam a queda do regime, o fim da aliança entre al-Nusra e Al-Qaeda e pela união de todas as facções de rebeldes, um acontecimento raro desde o início da guerra. 

O cessar-fogo tem sido geralmente respeitado a Norte e Sul de Homs, Deraa, na fronteira com a Jordânia, e subúrbios de Damasco, uma das zonas mais sangrentas do conflito e onde se assiste a algumas das mais graves situações humanitárias no país. Foi para lá que as Nações Unidas enviaram segunda-feira 51 camiões com ajuda humanitária, em específico para a cidade de Moadamiyeh, a apenas dez quilómetros do centro da capital e uma das 18 cidades e vilas cercadas na Síria — neste caso por forças do regime. É a terceira vez que a população de Moadamiyeh recebe ajuda depois de anunciado o cessar-fogo. 

“A cessação de hostilidades deu esperança ao povo sírio”, afirmou o representante da ACNUR na Síria, Sajjad Malik, prometendo que nos próximos dias chegará mais ajuda a outras zonas cercadas. À chegada dos camiões a Moadamiyeh, de madrugada, uma criança síria pedia ajuda: "Preciso de comida, preciso de algo que comer.”

A trégua está ainda em risco de ruir a qualquer momento. A oposição no exílio ameaçou regressar à guerra aberta no início da semana como resposta às “repetidas violações” do Governo. Do lado do regime, Bashar al-Assad declarou, numa entrevista ao canal alemão ARD, divulgada esta quarta-feira, que as suas forças se têm “refreado” diante as violações de rebeldes, mas declarou também que “tudo tem um limite”.

A grande dúvida é saber se a “cessação de hostilidades” aguentará até à próxima quarta-feira, dia em que se devem retomar as negociações entre regime e oposição em Genebra — o enviado especial da ONU para a Síria, Staffan de Mistura, decidiu adiar o encontro por três dias para que o “cessar-fogo assente melhor”.

Mas a oposição no exílio insiste que se cumpram as resoluções da ONU, que exigem, por exemplo, a libertação de presos políticos, fim dos ataques aéreos e dos cercos governamentais, antes de aceitar negociar com o regime — o último encontro interrompeu-se em Fevereiro com o intensificar da campanha aérea sobre Aleppo. “Se a trégua não ajudar a instaurar os termos [da resolução da ONU], todas as datas para o retomar das negociações mantêm-se hipotéticas”, afirmou esta quarta-feira à Reuters um responsável do Conselho Nacional Sírio, George Sabra. 

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