Oposição denuncia violações de Assad e ameaça romper trégua na Síria

Secretário-geral da ONU reconhece existência de combates mas diz que incidentes não comprometem o cessar-fogo estabelecido em nome do apoio humanitário e do avanço do processo político.

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A trégua nas montanha de Tamorah, a Norte de Alepo Abdalrhman Ismail/REUTERS

O acordo de cessar-fogo na Síria – que permitiu o avanço de várias colunas de ajuda alimentar e assistência humanitária para as comunidades cercadas durante meses pelas forças do regime, dos rebeldes anti-Assad e combatentes jihadistas –, está em risco de colapsar, com a coligação de oposição a prometer rever o seu compromisso com a suspensão dos combates perante as “repetidas violações” do Governo de Damasco e dos seus aliados.

O acordo para a cessação das hostilidades foi “completamente anulado” pelo Presidente da Síria, Bashar al-Assad, que não se coibiu de lançar novos ataques – mais precisamente 15 – antes de se terem cumprido as primeiras 24 horas sobre a suposta paragem dos combates, alertou o principal responsável do Alto Comité de Negociações, Asaad al-Zoubi. “Penso que a comunidade internacional tem de admitir que a experiência falhou e que chegou o momento de adoptar outras medidas contra o regime”, acrescentou, em declarações à cadeia Al Arabiya TV.

O “aviso” levou os países envolvidos nas negociações de paz na Síria a marcar uma reunião de emergência, no fim do dia, para fazer um novo ponto de situação: além do apoio urgente às populações necessitadas, a pausa dos combates foi estabelecida como forma de reanimar o processo político interrompido em Genebra no início de Fevereiro, e que volta a estar em risco. “Para já não vimos nenhuns sinais preparatórios destas conversas”, observou al-Zoubi.

Em cartas remetidas ao Conselho de Segurança da ONU e ao Grupo de Apoio Internacional à Síria, o comité de oposição lembra que concordou com “uma trégua temporária em resposta aos sinceros esforços internacionais para minorar o sofrimento do povo sírio, cumprindo as provisões humanitárias das resoluções adoptadas pelas Nações Unidas. Mas o falhanço em alcançar progressos significativos a esse respeito não nos deixa outra opção que não seja avaliar medidas alternativas para pôr cobro aos crimes que estão a ser cometidos”, ameaçou o comité.

Referindo-se à situação no terreno, esta segunda-feira, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, admitiu ter conhecimento de “combates esporádicos” entre facções opostas, mas considerou que esses incidentes não põem em causa o cumprimento do acordo de cessar-fogo negociado pelos Estados Unidos e a Rússia, que entrou em vigor há três dias. Aliás, Ban disse esperar que a trégua possa ser prolongada depois das duas semanas previstas.

Pelo seu lado, o ministro dos Negócios Estrangeiros da França, Jean-Marc Ayrault, considerou que os ataques reportados põem em causa o compromisso, e pediu explicações aos supostos envolvidos: o Exército sírio, a Força Aérea russa e o Hezbollah. “Temos indicações de que os ataques, inclusive aéreos, têm prosseguido contra áreas controladas pela oposição. Isto precisa de ser devidamente esclarecido”, exigiu o governante. Mas Moscovo declinou prestar qualquer informação relativa aos alegados 26 ataques de domingo, nomeadamente em áreas residenciais. Uma fonte do Kremlin citada pela Reuters disse que “desde o princípio se sabia que o processo não ia ser fácil”.

Uma reportagem da CNN em Alepo encontrou edifícios bombardeados pela aviação russa 30 horas depois da entrada em vigor da trégua. Nas ruas da cidade, que é dominada pela oposição anti-Assad, manifestantes davam conta da sua insatisfação com a suspensão dos combates, exibindo cartazes que diziam que o cessar-fogo era uma “desavergonhada traição dos nossos mártires”. A maior parte da população, notava a repórter da CNN, desconfia que o acordo é um truque do regime para quebrar a resistência das forças rebeldes e recuperar território.

O director do Observatório Sírio para os Direitos Humanos, Rami Abdulrahman disse que a sua rede de monitores reportara a morte de 20 pessoas, civis e combatentes, na sequência dos ataques de domingo em Alepo. “Mas antes [da trégua] tínhamos uma média de 180 vítimas por dia, por isso há uma diferença significativa em termos de perda de vidas”, comparou.

Entretanto, a Turquia também confirmou ter aberto fogo contra território sírio, para atingir alvos do Estado Islâmico: segundo a estação pública NTV, foram disparadas 50 rondas de artilharia a Norte de Alepo. Na Costa de Marfim, onde se encontra em visita oficial, o Presidente turco Recep Tayyip Erdogan disse que os ataques se multiplicavam em várias zonas da Síria. “O cessar-fogo para já só abrange um terço do território, mas a nossa esperança é que venha a ser alargado para compreender todo o país”, declarou.

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