"Vivemos num tempo em que parece que a PIDE voltou, não se pode dizer nada e toda a gente se ofende com qualquer coisinha." Foi mais ou menos isto que me disse um amigo humorista há meia dúzia de dias, na mesma altura em que, por mera coincidência, eu me cruzara com um artigo que dava a conhecer o objectivo de alguns universitários norte-americanos de proibir uns quantos livros, com o argumento de que são perigosos para a mente humana e para as suas possíveis futuras intenções.
Não querendo soar pretensioso ou alarmista, a verdade é que não há volta a dar: os ignorantes estão a dominar a nossa liberdade. Estamos a ser subjugados a uma doutrina estupidificante com base em ideais ocos e desprovidos de qualquer espécie de sentido. E o politicamente correcto é a sua mordaça mais eficaz. Querem um exemplo? Então cá vai: provavelmente, a minha teoria pessoal que mais desconforto causa entre aqueles com quem a partilho é a de que andamos a tratar mal os pedófilos. Um pedófilo não abusa de uma criança porque quer fazer-lhe mal. É antes um desvio psíquico, uma motivação visceral. Ou, se preferirem, e como disse Louis C.K. há uns tempos, "deve ser um gozo do caraças" (a partir dos 6:47). Portanto, um pedófilo, do meu ponto de vista, não deve ser punido - nada de prisões ou castrações químicas -, mas antes tratado e acompanhado por uma equipa de psiquiatras. (Porque é que falo disto? Apenas para ilustrar a violência dos comentários que se adivinham dos supostos puritanos e dos ignorantes que não pensarão um minuto sequer sobre esta proposta. Atenção: não estou a dizer que estou cem por cento certo, longe disso!, mas por favor dêem-me mais argumentos e menos ódio. Obrigadinho.)
Hoje, qualquer tonto tem o poder de decidir o que deve ou não ser dito, qualquer idiota bane alguém que expresse uma opinião mais acérrima numa rede social, qualquer estúpido cria uma petição online e, com recurso puro às emoções e aos emburrecimentos constantes a que estão sujeitos (e ao facto de não pensarem um único minuto sobre as reais implicações do que fazem), estamos nas mãos da pressão desta gente. Hoje, somos atirados a uma cruz se nos atrevemos a escrever as palavras "preto", "gaja" ou "maricas", mesmo que nelas estejam interiorizadas brincadeiras inocentes ou um simples trejeito retórico para melhor explicar um ponto de vista. Mas não: aí virão as hordas de adiantados mentais com as suas tochas e os index prontos a acender labaredas pseudo-intelectuais sobre o que pode ou não ser dito. Não fosse eu um tipo educado e mandava-vos àquela parte, queridos.
Não falar deste ou daquele assunto com medo de ferir susceptibilidades é o mesmo que espetar garfos em olhos alheios, com medo que o que é feio nos humanos seja visto. Por falar nisto, o "The Guardian" publicou um vídeo bem interessante sobre o assunto. Pois bem, aqui está um método para a cura: precisamos de encontrar e esgravatar nos nossos lugares mais horrendos, para que os saibamos combater, civilizar. Banir comportamentos ou ideias não as vai apagar da face da Terra. Muito pelo contrário. Precisamos, antes, de falar sobre tudo. Mesmo que o tudo signifique ir contra aquilo que sentimos, acreditamos, mesmo que o tudo esbarre nos preconceitos. Mas, no final, a razão deverá vencer.
E outra coisa, amigos das redes sociais e afins: os tempos que correm não vos exigem que tenham uma opinião sobre tudo. Na verdade, a inteligência suprema com que podem brindar todos aqueles que estão à vossa volta é assumindo que, sobre determinados assuntos, não têm uma opinião. Falem, falem, falem. Sempre (que se justificar), mais e mais. Mas não se ofendam. Não censurem. E pensem mais com a cabeça e menos com o calor que se vos dá no peito quando algo vai contra aquilo que a avózinha ensinou.