Portugal tem apenas 252 camas de cuidados paliativos
A Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) foi criada em 2006. No entanto, em quase dez anos, a resposta do Estado para quem chega a situações limite continua a ser escassa. Em todo o país, existem apenas 252 camas destinadas a cuidados paliativos, de acordo com os dados actualizados até ao primeiro semestre de 2015 e que constam do Relatório de Monitorização da RNCCI. Lisboa e Vale do Tejo é a região de Portugal com mais camas (113), o que não invalida, dada a concentração de população, que seja das zonas com mais dificuldade de acesso a este tipo de cuidados de saúde. Em termos de número de camas, segue-se o Centro, com 69, o Norte, com 41, o Alentejo, com 19, e o Algarve, com dez.
Este baixo número de camas acaba por ter impacto nos utentes que aguardam por vaga numa unidade de cuidados paliativos. Os valores variam, com o Algarve e o Centro a não terem utentes em espera e com Lisboa e Vale do Tejo a atingir os 75% de doentes em espera. Apesar do fraco crescimento no número de camas, as equipas da RNCCI, nomeadamente de apoio domiciliário, acabam por conseguir dar resposta a muitos casos: cerca de 65% dos utentes são atendidos por estas equipas.
Em 2014, entre camas na rede e equipas nos hospitais ou domiciliárias foram apoiados 4358 doentes terminais, apenas mais 99 do que em 2013. Os dados da RNCCI indicam que no final de 2014 estavam 844 pessoas à espera de uma vaga. No entanto, a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos estima que mais de 60 mil pessoas precisem deste apoio – o que faz com que Portugal esteja entre os países em que as pessoas mais vão morrer aos hospitais, apensar de alguns inquéritos indicarem que a esmagadora maioria, podendo optar, morreria em casa.
As deficiências da RNCCI foram também recentemente salientadas pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS) que, num relatório publicado há um mês, destaca que no total da rede, “tendo em conta as metas de 2015 e a população com 65 ou mais anos estimada pelo INE referente a 2014 (ano mais recente), o número total de camas nas unidades de internamento deveria ser de 14.640, enquanto o número total em Agosto era de 7311” – o que significa que o país precisaria de duplicar o valor actual. As mais de 7000 camas distribuem-se pelos cuidados paliativos, unidades de convalescença, unidades de média duração e reabilitação e unidades de longa duração e manutenção.
Ainda segundo o mesmo estudo, intitulado Acesso, qualidade e concorrência nos Cuidados Continuados e Paliativos, Portugal é, entre os Estados-membros, também o país com uma maior taxa de cuidados continuados e paliativos prestados por pessoas sem preparação e com uma das mais baixas taxas de cobertura de cuidados prestados por profissionais. “Portugal tem a maior taxa de cuidados domiciliários informais da Europa, a menor taxa de prestação de cuidados não domiciliários e uma das menores taxas de cobertura de cuidados formais, principalmente em função da escassez de trabalhadores formais, escassez que, segundo o International Labour Office, configura uma limitação ao acesso a cuidados continuados de qualidade”, concretiza o regulador, que frisa também que a despesa pública em percentagem do produto interno bruto nesta área está muito abaixo da média europeia.
Concretamente sobre os cuidados paliativos, a ERS sublinha que as unidades destinadas a este tipo de serviços têm um baixo acesso para 81% dos portugueses – o que significa que a esmagadora maioria dos doentes acaba por morrer sem acesso a estes cuidados. Esta carência acaba por ter consequências em toda a RNCCI, com a ERS a relatar casos em que não foram cumpridos os critérios de referenciação e em que doentes paliativos foram encaminhados para unidades destinadas a outros cuidados.
A realidade é mais preocupante, defende a ERS, quando as projecções realizadas para a evolução da população idosa indicam que Portugal terá um crescimento acima da média dos 28 países da União Europeia. A proporção de idosos deverá chegar a 25% em 2025. A isso juntam-se os casos oncológicos, com uma tendência também crescente nos novos cancros.