A “pequena cereja” no bolo do empreendedorismo português
Fundador da conferência Web Summit diz que as bases do ecossistema de startups em Portugal "estão construídas há muito tempo".
Os dados estão lançados: há capital de risco, há um ecossistema de empreendedores, incubadoras e programas de aceleração, há startups que já angariaram financiamento internacional, e ainda conferências e encontros em abundância. Os frutos – startups que se transformem em grandes empresas internacionais e que permitam que haja investimento noutros projectos – começarão a surgir a médio prazo. Estas foram ideias transversais ao discurso de investidores, empreendedores e responsáveis públicos que se reuniram nesta quinta-feira, em Lisboa, numa conferência motivada pela Web Summit, um enorme evento dedicado a empreendedorismo tecnológico, que terá este ano a sua primeira edição em Portugal.
Foi o próprio fundador da Web Summit, Paddy Cosgrave, a relativizar o peso do evento, cujo número de participantes tem vindo a crescer e que em Novembro levou cerca de 42 mil pessoas a Dublin, segundo números da organização. “A Web Summit são três dias e quatro noites. O que é importante e fundamental é que as bases [em Portugal] estão construídas há muito tempo”, afirmou. “A Web Summit é uma pequena cereja no topo do bolo. Mas o bolo já foi feito pelas pessoas nesta sala.”
Pela sala, numa conferência promovida pela AICEP (uma agência estatal de captação de investimento) e pela câmara de Lisboa, passaram muitos outros elogios ao percurso do empreendedorismo tecnológico português nos anos recentes. O secretário de Estado da Indústria, João Vasconcelos (que antes de assumir o cargo dirigia a incubadora Startup Lisboa), falou numa “nova geração de empresários que apostam com visão e criatividade”, classificou a capital como estando na linha da frente das cidades abertas a projectos tecnológicos e argumentou que esta "é a primeira revolução industrial" em que a localização geográfica não será relevante.
As intervenções ao longo da conferência, apesar de optimistas, mostraram alguma contenção. Parece afastada a ideia – que em tempos se ouvia com frequência – de transformar Portugal num “Silicon Valley” ou numa “costa oeste” da Europa. Marco Fernandes, o presidente da Portugal Ventures (a sociedade de capital de risco do Estado), afirmou que “ninguém pode acreditar que se transforma Portugal num Silicon Valley”. Mas lembrou que algumas startups “já fizeram rondas grandes de financiamento” e disse esperar “casos concretos” de sucesso no período de cinco a dez anos.
Na mesma linha, o investidor Alexandre Barbosa, que gere a empresa de capital de risco Faber Ventures, disse serem precisos tipicamente sete a dez anos para uma startup de base tecnológica “gerar um evento de liquidez” – ou seja, ser vendida ou entrar em bolsa. “Se há três ou quatro anos não havia nada, estamos a um terço ou a meio desse processo”. Já Stephen Morais, administrador da Caixa Capital (o braço de investimento de risco da Caixa Geral de Depósitos), lembrou que “a transformação de startups em grandes empresas vai acontecer em muito poucos casos”. Mas fez questão de classificar este desfecho como algo normal”. E afirmou que os empreendedores portugueses estão ganhar reconhecimento, e a atrair a atenção de capital, no estrangeiro.
A dimensão da Web Summit ajudará a pôr Portugal sob os holofotes do sector: nasceu em Dublin em 2010, com apenas algumas centenas de pessoas, e evoluiu em poucos anos para um evento com milhares de participantes e fama global. No ano passado, decidiu mudar-se se para Lisboa, pelo menos até 2018, num acordo anunciado pelo anterior Governo e que implica um apoio público de 1,3 milhões de euros. Cosgrave justificou na altura a escolha da capital portuguesa com o crescimento do ecossistema de startups e, sobretudo, com questões logísticas, desde a qualidade dos espaços à disponibilidade hoteleira. O evento decorrerá em Novembro, na Feira Internacional de Lisboa e no Meo Arena.